Figueiredo, Ana; Parreiras, Angelina; Santos, Maria Paula dos; Alves, Paula Pereira Gonçalves;
Desenvolvimento Social: Artigos.
Publicado em: Abr-2025
As macrorregiões brasileiras possuem dinâmicas sociais próprias, que determinam os padrões de violência e criminalidade em cada localidade, conformados, ao longo dos anos, por processos históricos de ocupação territorial, desenvolvimento econômico e transformações sociais. Reconhecendo estas particularidades, o projeto Dinâmicas de Violência e Políticas de Segurança nas Regiões Brasileiras, conduzido pela Coordenação de Justiça e Segurança Pública (Cojus) da Diest/Ipea, tem se dedicado a investigar os fatores que impulsionam as dinâmicas violentas nas regiões brasileiras, compreendendo as causas de aumento ou diminuição das taxas de homicídio, bem como as políticas de segurança pública promovidas pelos estados para enfrentá-las. Utilizando uma abordagem quantitativa-qualitativa, o projeto parte de alguns dados estatísticos sobre violência e criminalidade nos diferentes territórios e busca compreender as dinâmicas sociais que contribuem para sua oscilação. Para tanto, a pesquisa lança mão de interlocução com acadêmicos, gestores públicos, movimentos e lideranças sociais, além da coleta e sistematização de matérias publicadas nos noticiários – impressos e eletrônicos – e revisão bibliográfica de escopo regional. A primeira etapa foi dedicada à macrorregião Norte, em que se evidenciou um aumento expressivo da violência letal, com uma variação de 260,3% entre os anos de 1980 e 2019 (Santos, 2024). Esta letalidade foi impulsionada por conflitos envolvendo a conexão entre diferentes atores e processos criminais, como a grilagem de terras, a exploração ilegal de recursos naturais, a atuação de facções criminosas, entre outros (Santos, Parreiras e Cunha, 2024). A segunda macrorregião pesquisada, foco desta edição especial do Bapi, é a Centro-Oeste. Estudos recentes relacionados às dinâmicas criminais nesta região revelaram que a violência letal tem apresentado um quadro contrastante (Cerqueira e Bueno, 2023; 2024). Algumas Unidades Federativas (UFs) têm experimentado reduções expressivas das taxas de homicídios por 100 mil habitantes desde 2016: Goiás registrou sua menor taxa em 2022 (23,1) e o Distrito Federal alcançou uma taxa de apenas 11,4 no mesmo ano. Não obstante, essa diminuição não reflete, necessariamente, um cenário de baixa da violência letal consolidado. Em Mato Grosso do Sul, os índices de homicídios apresentaram queda considerável desde 2014, atingindo sua menor proporção em 2020 (17,5), mas tiveram aumento de 2021 a 2022, com variação de 1,9%. Mato Grosso, por sua vez, viu suas taxas de homicídios alcançarem 30,3 em 2022 – um aumento de 21,8% em relação ao ano anterior. Ademais, embora com números declinantes, a região ocupou a terceira posição, entre as cinco macrorregiões brasileiras, no que se refere às maiores taxas de homicídios nos anos de 2015 a 2022, segundo o portal Atlas da Violência. O Centro-Oeste, região mais dinâmica do país, tem sua economia baseada principalmente na agropecuária exportadora. Ele abriga o território que mais cresce no país, em termos econômicos e populacionais, representado pelo eixo que liga as cidades de Goiânia, Anápolis e Brasília. Estas características se contrapõem a um histórico marcado por dinâmicas violentas nos processos de apropriação e ocupação de terras, produzindo desigualdades, vulnerabilidades sociais e conflitos que ainda hoje estão presentes na região. As políticas de colonização, como a Marcha para o Oeste, no governo de Getúlio Vargas (1937-1945), e a Operação Brasília, nos anos de Juscelino Kubitschek (1956-1961), conformaram uma estrutura social e política marcada pela concentração de terra e poder nas mãos de grandes proprietários rurais, e por conflitos contra povos indígenas, quilombolas, pequenos proprietários de terras, posseiros e trabalhadores sem-terra. As intervenções estatais, incluindo projetos de desenvolvimento, e o avanço da fronteira agropecuária se desdobraram em conflitos fundiários, exploração desregulada de recursos naturais, migrações em massa e crescimento de atividades ilegais, como a grilagem de terras. Além disso, sua posição geográfica, marcada por uma vasta fronteira internacional e localização central no país, historicamente favoreceu atividades de comércio transnacional irregular, seja o contrabando, praticado desde a Guerra do Paraguai (1864-1970), seja o tráfico de drogas e armas, no período mais recente (Abreu, 2017; 2021). Segundo Cerqueira e Bueno (2024, p. 33), “cerca de 80% da cocaína e da maconha que entram no país passam por esse território”. Nesta logística, atuam diferentes coletivos criminais que podem afetar as taxas de homicídio em localidades específicas, assim como as taxas de roubo, furto e latrocínio. Outras dinâmicas observadas, como a violência de gênero e a violência institucional, também são importantes na região. Essas e outras questões serão abordadas nos artigos desta edição, os quais estão distribuídos em cinco grandes eixos temáticos, listados a seguir. 1) Violência letal no Centro-Oeste. 2) Territorialidade, conflitos no campo e povos tradicionais. 3) Sistema prisional. 4) Facções prisionais-criminais no Centro-Oeste. 5) Violência urbana e respostas institucionais. É importante ressaltar que esses elementos, fundamentais para compreender as dinâmicas de violência e criminalidade na região Centro-Oeste, não esgotam todas as dinâmicas regionais. Não foi possível incluir nesta publicação reflexões específicas sobre violência contra mulheres e população LGBTQIAP+, ou sobre as dinâmicas específicas do estado de Goiás, embora tenham sido contatados pesquisadores e outros profissionais locais que realizam estudos sobre o tema.
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