País deve internalizar boas práticas ao cultivo transgênico
No segundo dia do seminário no Mapa, pesquisadores também discutiram a transição de paradigmas de desenvolvimento rural
A segunda parte do evento seminário A agricultura brasileira: desempenho recente, desafios e perspectivas, promovido pelo Ipea e pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) na última terça-feira, dia 30, contou com a exposição do doutor e sociólogo Arilson Favareto sobre a transição dos paradigmas de desenvolvimento rural. "Há a evasão das bases do paradigma agrário e produtivista e a emergência de uma nova ruralidade, com novas formas de uso dos recursos naturais", disse.
O professor da Unicamp e doutor em Economia José Maria da Silveira ressaltou que o Brasil é hoje o segundo país em cultivo de transgênicos no mundo, já à frente da Argentina. Segundo ele, o maior desafio é transformar a regulação em uma prática do dia a dia dos agricultores, das associações e cooperativas. "É internalizar algumas boas práticas ao uso dos cultivados transgênicos", afirmou. Em sua apresentação, Zander Navarro, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), defendeu que a agricultura familiar não é um conceito e não se enquadra na categoria de nenhuma problemática teórica ou escola de pensamento.
Já no último bloco de discussão, o pesquisador da Embrapa Eliseu Alves verificou, com base nos dados do IBGE, que há uma concentração muito grande da produção no Brasil. "Cerca de 430 mil estabelecimentos dos 5,2 milhões produzem 85% de toda a produção brasileira. Isso leva o governo a ter um conjunto de políticas para ajudar a agricultura familiar, aqueles que estão à margem desse processo, que somam quase 4 milhões."
O ex-ministro da Segurança Alimentar e Combate à Fome José Graziano explicou que há distintos atores sociais no campo que brigam para ter uma representação maior frente ao Estado, a fim de fazer jus a recursos públicos, desde os créditos até os subsídios. Em seu estudo, ele aponta que há uma desigualdade muito grande nessa luta em função de existir uma bancada ruralista - embora os grandes agricultores não cheguem a 200 mil, eles têm um peso no Congresso de 23%, quase um quarto.
"Os maus pagadores prejudicam os bons na medida em que, hoje, o montante das dívidas renegociadas vai consumindo cada vez mais o volume de créditos e de recursos públicos, e isso pode inviabilizar o desenvolvimento das agriculturas brasileiras", alertou. Expuseram ainda seus trabalhos Geraldo Barros, da USP, Antônio Campos e Marcelo Braga, da UFV, e Guilherme Dias, da USP.
Ipea e Mapa debatem os desafios da agricultura
Pesquisadores e estudiosos apresentaram seus trabalhos em seminário que contou com a presença de Reinhold Stephanes
Foto: Nilton Matos![]() |
Os técnicos do Ipea José Eustáquio e Junia Conceição participaram do seminário no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento |
O representante regional da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) para América Latina e o Caribe, José Graziano da Silva, junto a pesquisadores do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), da Embrapa e acadêmicos apresentaram seus trabalhos no seminário A agricultura brasileira: desempenho recente, desafios e perspectivas, promovido pelo Ipea e pelo Mapa na terça-feira, dia 30, no auditório do ministério, em Brasília.
O debate, que contou com a abertura do ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, resultará na publicação de um livro em julho sobre a agricultura brasileira. A plateia foi composta por representantes da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) e da Confederação Nacional da Agricultura, empresários rurais, pesquisadores do IBGE responsáveis pelo Censo Agropecuário, servidores do Ministério do Desenvolvimento e da Câmara dos Deputados.
O evento foi dividido em três blocos de apresentação. Na primeira parte da discussão, o coordenador de planejamento estratégico do Mapa, José Garcia Gasques, mostrou que a produtividade da agricultura brasileira teve uma taxa de crescimento de 2,13% no período de 1996 e 2006, com um aumento de 3,14% no índice de produto. O crescimento foi maior do que nos Estados Unidos, que tiveram uma taxa de 1,89%.
Progressos
O técnico do Ipea José Eustáquio destacou a trajetória tecnológica e aprendizado no setor agropecuário em um contexto em que a inovação é fundamental quando se discute a matriz energética, a segurança alimentar e a sustentabilidade ambiental. Enumerou avanços como o aperfeiçoamento do quadro institucional ao longo desses 40 anos - com a criação da Embrapa, do Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária e dos fundos setoriais para a agricultura - e a cadeia produtiva regional da agricultura altamente inovadora quando comparada a outros setores industriais.
José Eustáquio também criticou a dependência tecnológica do Brasil às importações de insumos (como defensivos, fertilizantes e medicamentos veterinários) e a baixa capacidade de absorção dos conhecimentos tecnológicos, com apenas 3% dos proprietários agrícolas com ensino superior, quase 90% apenas com ensino fundamental, e cerca de 27% analfabetos.
A pesquisadora do Ipea Junia Conceição colocou em questão o desafio da produtividade do trabalho na medida em que cresce a mecanização e a produtividade e cai o número de empregos. A técnica afirmou que devem existir outras tecnologias por meio das quais seja possível chegar a técnicas de produção mais eficientes e modernas que aumentem a produtividade e, ao mesmo tempo, absorvam mais trabalhadores.
Marlon Gomes Ney, da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF), e Rodolfo Hoffman, da Universidade de São Paulo (USP), encerraram o primeiro bloco analisando a evolução recente da distribuição da posse da terra no Brasil, a estrutura fundiária e propriedade rural no Brasil.
Reforma agrária tem potencial de fortalecer a democracia
Concentração de patrimônio reflete desigualdade. Cerca de 30 milhões de brasileiros vivem em condições precárias no campo
Foto: Sidney Murrieta![]() |
Brancolina Ferreira, coordenadora de Desenvolvimento Rural da |
A persistência de uma estrutura fundiária fortemente concentradora continua sendo problema grave no Brasil, segundo o estudo PNAD 2008: setor rural, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), divulgado na quinta-feira (1º), em Brasília. Realizado por pesquisadores da Diretoria de Estudos e Políticas Sociais (Disoc), o Comunicado do Ipea nº 42 avaliou dados relativos à população rural de 2008 da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), e também do Censo Demográfico 2006.
"A questão da concentração do patrimônio rural no Brasil precisa ser resolvida. O fortalecimento da democracia implica distribuir melhor esse patrimônio", afirmou Brancolina Ferreira, coordenadora de Desenvolvimento Rural da Disoc e uma das autoras da publicação.
De acordo com a análise, cerca de 30 milhões de brasileiros vivem no meio rural em condições precárias de moradia, de acesso à saúde e à educação, com reduzidos níveis de renda e de remuneração. "Não é pouco", ressaltou Brancolina ao observar que, se essa população constituísse um país, seria o quadragésimo mais populoso do mundo, e o terceiro da América Latina, atrás do Brasil e da Argentina.
A agricultura familiar, além de responder por 70% dos alimentos produzidos no Brasil, é responsável ainda pela grande maioria das ocupações - também em torno de 70% - no meio rural. O agronegócio atinge 3% das ocupações. Os dados procuram oferecer um quadro das condições de vida nas áreas rurais a partir de alguns indicadores sociais e de desenvolvimento humano, analisados sempre em perspectiva comparativa com a população urbana.
Gênero e educação
Brancolina considera grave a situação, não só pela grande quantidade de trabalhadores agrícolas que estão fora de qualquer relação de assalariamento, mas também por causa das condições das mulheres e do acesso à educação. "As mulheres funcionam como um exército de reserva de trabalhadores do campo. Elas não possuem renda e muitas vezes trabalham em substituição aos homens, que se locomovem para outras frentes de trabalho em busca de melhores salários", disse a coordenadora.
A pesquisadora explicou ainda que a baixa escolaridade contribui para malefícios como a incorreção no uso de agrotóxicos. "Muitos não conseguem sequer entender as instruções de uso desses defensivos agrícolas", pontuou.
Para exemplificar a situação precária da zona rural brasileira, Brancolina apresentou uma tabela com a evolução do índice de Gini no Brasil, segundo as unidades da federação no período de 1995 a 2006, com base no Censo Agropecuário de 2006 do IBGE. Santa Catarina, com 0,682, é o estado menos desigual no Brasil. Os dados, no entanto, mostram que índice cresceu 0,10 em relação a 1995, quando o estado tinha um índice de 0,671. Quanto mais próximo de 1, mais desigual.
"Grande parte da mídia demoniza os movimentos sociais que lutam pela reforma agrária. Eles contribuíram muito para a democratização no campo, que ainda tem um longo caminho a percorrer", ponderou a pesquisadora.
A apresentação do estudo teve transmissão on-line pelos sites www.ipea.gov.br e www.ipea.gov.br. Os jornalistas puderam participar da coletiva on-line, e as perguntas foram respondidas ao vivo.
Veja a íntegra da Comunicado do Ipea nº 42
Impacto do marco regulatório foi discutido em seminário
Visão da Petrobras e regimes fiscais em outros países foram abordados no evento, que teve Ana Luiza Flores como palestrante
O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) realizou na quarta-feira, dia 31, o seminário O impacto do marco regulatório sobre o desenvolvimento das reservas do pré-sal. O evento, no Rio de Janeiro, teve como palestrante a administradora Ana Luiza Silva de Alvarez Flores, lotada na gerência de Análise Estratégica da área de Estratégia Corporativa da Petrobras.
Ana Luiza Flores falou sobre os regimes fiscais atualmente em vigor em diferentes nações. Os países presentes no estudo da administradora são Canadá, Tanzânia, Trinidad e Tobago, Papua Nova Guiné, São Tomé e Príncipe/Nigéria - neste caso, as reservas estão sobrepostas no Golfo da Guiné, e um acordo assinado entre os dois países estabelece um desenvolvimento conjunto, por meio do qual Nigéria fica com 60% de toda a receita gerada.
O marco regulatório no Brasil é fundamentado no sistema de taxas/royalties, vigente desde 1997 com a Lei do Petróleo n° 9.478, que serviu para quebrar o monopólio e abrir o capital da Petrobras. Pela norma, a cobrança de royalties é feita sobre a produção de óleo e gás natural. A alteração da lei implicaria a divisão dos riscos e do petróleo produzido entre o governo e a empresa contratada para a exploração e produção. A Petrobras teria de participar obrigatoriamente de 30% da exploração de cada campo de petróleo.
“Nem toda a tecnologia está pronta para o desenvolvimento do pré-sal. Ficar com 30% de participação obrigatória em cada campo demandaria muitos custos para a Petrobras. O fator positivo é o risco geológico, que é reduzido”, afirmou Ana Flores. O pré-sal se estende do Espírito Santo a Santa Catarina, e uma cooperação entre as empresas para reduzir os custos tecnológicos foi uma das sugestões da administradora.
Na semana passada, o Ipea já havia realizado no Rio de Janeiro o seminário Comparação de regimes fiscais e efeito da tributação nas opções reais em E&P de petróleo (Tax effects on timing, scale, and learning options in petroleum upstream). No encontro, foram discutidos os sistemas de concessão e de partilha dos royalties, além da chamada Emenda Ibsen. O palestrante foi o professor Antônio Guimarães Dias, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ).
Boletim aborda questões regional, urbana e ambiental
Em seu terceiro número, a publicação que foi divulgada nesta terça-feira, em Brasília, traz 14 artigos
O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) lançou nesta terça-feira (6), às 15h, em Brasília (SBS, Quadra 1, Bloco J, Edifício BNDES, auditório do subsolo), a terceira edição de seu Boletim Regional, Urbano e Ambiental.
O entendimento de que as questões regionais, urbanas e ambientais não podem ser dissociadas da perspectiva do desenvolvimento de longo prazo levou à produção do boletim semestral, com pesquisas, debates e opiniões sobre os temas.
Produzido pela Diretoria de Estudos e Políticas Regionais, Urbanas e Ambientais (Dirur) do Instituto, o Boletim demonstra a preocupação com o tema das atividades no espaço, crucial em face dos elevados índices de desigualdade entre as regiões brasileiras.
Essa edição traz 14 artigos que analisam de políticas públicas a biocombustíveis, de transporte público a mercado de carbono, passando pelo fenômeno da fragmentação produtiva. A diretora da Dirur, Liana Carleial, esteve presente ao lançamento do periódico. A apresentação teve coletiva on-line pelos sites www.ipea.gov.br e www.ipea.gov.br.