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Ipea debate desafios do envelhecimento para a seguridade social e amplia indicadores do 'Beneficiômetro'

Painel de indicadores criado pelo Ipea auxilia no acompanhamento de políticas públicas de assistência, previdência e saúde

Foto: Helio Montferre/Ipea

Pesquisadores e gestores se reuniram nesta quinta-feira (25) para debater os impactos do envelhecimento populacional sobre a seguridade social. O foco foi o https://www.ipea.gov.br/portal/beneficiometro – plataforma desenvolvida pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) –, que atingiu uma nova etapa, avançando na amplitude e desagregação dos indicadores. Agora, a plataforma traz informações por ciclo de vida, contemplando infância, adolescência, vida adulta e a velhice.

A novidade trazida pelo recorte de ciclo de vida permite diferenciar e classificar os indicadores, dando mais visibilidade a como a seguridade social está apoiando a população ao longo da vida. A ferramenta também dá apoio para gestores e pesquisadores.

“Quando nós lançamos, foram mais de 120 indicadores tentando quantificar o que é entregue para a sociedade em termos de benefícios monetários e não monetários”, explicou Cláudia Baddini, especialista em políticas públicas e gestão governamental na Diretoria de Políticas e Estudos Sociais (Disoc) do Ipea.

Cláudia destacou ainda que a iniciativa adota uma abordagem macrosetorial, olhando para as interdependências entre as três áreas da seguridade social. “Existem lógicas distintas de intervenção, mas alguns princípios estão por trás de todas: solidariedade, universalidade e redistribuição”, disse. Para ela, compreender as aproximações, fronteiras, sobreposições e vazios protetivos é essencial para criar oportunidades e respostas mais integradas.

O acompanhamento realizado pelo Beneficiômetro permite monitorar entregas na seguridade social, identificar lacunas e informar o Estado e a sociedade. “Pouco se fala sobre as entregas que o Estado faz com esses recursos e como elas são profundamente importantes para a população”, disse Letícia Bartholo, diretora da Disoc. “Nossa ideia é contrapor o impostômetro, que só mostra ‘quanto o Estado é caro’”.

“A ideia começa com a proposta de que o Estado que queremos é diferente do Estado do painel da Paulista”, afirmou Luciana Servo, presidente do Ipea. Para ela, é preciso reforçar um conceito de Estado justo e redistributivo, em contraste com visões que reduzem sua atuação a custos. “Só conseguimos fazer esse Estado se as pessoas entenderem o que está por trás das propostas. É necessária uma tradução do conhecimento de forma clara e simples, que capacite a sociedade para o diálogo”.

Servo ressaltou o papel do Ipea nesse debate e destacou a importância de fortalecer a seguridade social prevista na Constituição, mas também de avançar em pontos que ainda não estavam consolidados, como a política nacional de cuidado e a centralidade das questões de gênero, etnia e raça. “Queremos um Estado para todos, e não dominado por pessoas que se sentem donas dele”, concluiu.

Envelhecimento e cuidado

O envelhecimento traz desafios complexos, marcados pela heterogeneidade da população idosa (em idade, gênero e etnia) e por desigualdades acumuladas ao longo da vida. A população 60+ também está mais exposta a doenças e à perda da capacidade laborativa.

“O sistema de transferências intergeracionais está ameaçado, com menos gente contribuindo por várias razões, e o desafio se amplia diante das desigualdades sociais”, afirmou Ana Amélia Camarano, técnica de planejamento e pesquisa da Disoc/Ipea.

Nesse cenário, a seguridade social cumpre papel central ao reduzir a pobreza na velhice e dar estabilidade a famílias multigeracionais. Cerca de 21% dos domicílios com idosos têm residentes com menos de 21 anos, por exemplo. “A previdência dos trabalhadores urbanos e rurais, o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e a pensão por morte são fundamentais para garantir segurança de renda”, explicou.

Camarano destacou ainda a necessidade de reconhecer o trabalho de cuidados prestado por mulheres ao longo da vida, garantindo proteção previdenciária para trajetórias laborais descontínuas. A saída passa por incluir trabalhadores informais e de plataformas digitais no sistema, ampliar serviços de cuidados domiciliares, comunitários e institucionais e apoiar idosos sem família. “É necessário um novo contrato social, que coloque o cuidado no centro e conte com uma maior participação do Estado”, concluiu.

Para entender um dos maiores gargalos da proteção social voltada às pessoas idosas, Marina Pinheiro, consultora e pesquisadora em políticas sociais para organizações governamentais e não governamentais, propõe olhar para a oferta pública de cuidados de longa duração. Os serviços ofertados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e pelo Sistema Único de Assistência Social (SUAS) incluem cuidados intensivos, serviços comunitários e apoio familiar. Não há, porém, oferta pública de clínicas geriátricas, ajuda doméstica ou benefícios monetários para cuidadores. “Está longe de prover alternativas de cuidado para a população com dependência, sejam pessoas idosas, sejam pessoas com deficiência”, disse.

Para ela, há necessidade de mais integração entre SUS e SUAS. Há diálogo, embora superficial: troca de informações e encaminhamentos são comuns, mas atividades conjuntas, como reuniões periódicas e estudos de caso, são menos frequentes. Ela apontou ainda desafios socioculturais, políticos e financeiros. “A ausência de pisos constitucionais, a austeridade fiscal e as desigualdades regionais dificultam a consolidação de uma rede integrada de cuidados, que deveria estar mais conectada aos serviços de saúde”, concluiu.

Instituída em dezembro do ano passado, a Política Nacional de Cuidados reconhece o cuidado como um direito. Foi a oitava política de cuidados aprovada na América Latina, mas a única que incorpora antirracismo, anti-idadismo e anticapacitismo. “Cada vez será maior o número de pessoas que necessitam de cuidados e menor a capacidade das famílias de prover esse cuidado, o que configura a crise dos cuidados”, disse Laís Abramo, secretária nacional da Política de Cuidados e Família do MDS.

Atualmente, 5,1 milhões de idosos demandam apoio para atividades da vida diária, número que pode chegar a 8 milhões em 2030. Desse total, 1,7 milhão não recebe o cuidado necessário. O problema é agravado pela sobrecarga das cuidadoras familiares, em geral mulheres, que dedicam em média 21,5 horas semanais ao trabalho não remunerado de cuidados – chegando a 24 horas entre as de 60 a 69 anos.

“É fundamental superar a ideia de que a família deve assumir sozinha a provisão de cuidados”, defendeu Abramo. Para ela, o cuidado é um trabalho, uma necessidade e um direito, equivalente em importância a outras políticas setoriais

Entre as ações de destaque voltadas às pessoas idosas, a secretária mencionou o cuidado integrado no domicílio, realizado por equipes do SUAS e do SUS em articulação com a atenção primária à saúde. “Nosso objetivo é apoiar as atividades da vida diária, oferecer orientação e suporte aos cuidadores, liberar o tempo das cuidadoras familiares não remuneradas e prevenir violências e violações de direitos”, explicou.

Inspirada no programa Maior Cuidado, de Belo Horizonte, a proposta já funciona de forma restrita, mas a ambição é nacionalizar. “Estimamos que, em 100 municípios, o custo anual da parte do SUAS seria de R$ 160 milhões, beneficiando um terço das 3 milhões de pessoas idosas que necessitam de apoio para atividades básicas da vida diária”, disse. “É algo inovador, mas seu ritmo de expansão vai depender dos recursos disponíveis.”

Beneficiômetro 

O Beneficiômetro da Seguridade Social é um instrumento sobre os benefícios garantidos pelo Estado na área da seguridade social no Brasil, que se materializa como um painel de indicadores sobre as ofertas das políticas de Assistência Social, Previdência Social e Saúde.

A ferramenta busca ampliar e qualificar a visão sobre a seguridade social e seus benefícios, conjugando em um só painel tanto benefícios monetários quanto não monetários; listar e quantificar os benefícios existentes, aprimorando a identificação e mensuração dos públicos beneficiários e das modalidades de ofertas; e qualificar o acompanhamento e análise das políticas públicas da área por meio da produção e disponibilização periódica de indicadores que podem servir como um sistema de monitoramento e alerta de situações que afetem o sistema de proteção social e a situação social do país em sentido amplo.

O desenvolvimento do Beneficiômetro está a cargo das equipes de Assistência Social, de Previdência Social e de Saúde da Diretoria de Estudos e Políticas Sociais do Ipea, que selecionaram e calcularam os indicadores disponibilizados.

2025\9\25 Seminário: Beneficiômetro – Envelhecimento Populacional e os Desafios Para a Seguridade Social

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