Entre 2012 e 2023, o número de pessoas ocupadas na agricultura no Brasil caiu de pouco mais de 10 milhões para menos de 8 milhões. E o que puxou essa retração foram as ocupações ligadas à agricultura familiar, considerando os trabalhadores por conta própria e os trabalhadores familiares auxiliares.
A constatação é do estudo Dinâmica do trabalho agrícola no Brasil entre 2012 e 2023 : uma análise a partir dos dados da PNAD contínua, publicado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), de autoria de Fábio Alves, especialista em políticas públicas e gestão governamental na Diretoria de Estudos e Políticas Sociais do Ipea (Disoc/Ipea); Eduardo Zen, técnico de planejamento e pesquisa também na Disoc/Ipea, Tomás de Faria Balbino e Juliane da Silva Ciríaco, bolsistas do Subprograma de Pesquisa para o Desenvolvimento Nacional (PNPD).
A análise, baseada nos microdados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), mostra que a queda não foi uniforme entre as regiões e categorias ocupacionais. Enquanto empregos formais e informais no setor agrícola se mantiveram relativamente estáveis ao longo da década, as ocupações por conta própria passaram de 4,7 milhões, no primeiro trimestre de 2012, para 3,3 milhões no fim de 2023. Já o número de trabalhadores familiares auxiliares caiu para menos da metade no mesmo período — de 1,5 milhão para 672 mil pessoas.
Segundo os autores, essas duas categorias (por conta própria e trabalhadores familiares auxiliares, que são próprias da agricultura familiar) respondem por praticamente toda a retração observada no trabalho agrícola nos últimos anos. São ocupações típicas da agricultura familiar, cuja redução sinaliza mudanças profundas no modo como essas famílias organizam sua reprodução social e econômica — e não, necessariamente, um abandono do campo.
Ainda de acordo com o estudo, essa transição não deve ser confundida com um êxodo rural. Na maioria dos casos, as famílias continuam residindo no meio rural, mas passaram a se engajar em outras atividades — agrícolas e não agrícolas — dentro ou fora de seus estabelecimentos. A busca por renda complementar ou alternativa, especialmente em contextos de crise, é interpretada como uma estratégia de sobrevivência.
Do ponto de vista regional, o Nordeste concentrou 71% da redução das ocupações agrícolas no Brasil entre o primeiro trimestre de 2012 e o quarto trimestre de 2023. A região, que abriga o maior contingente de trabalhadores agrícolas do país, também foi a mais afetada por eventos climáticos severos no período, como os seis anos consecutivos de seca entre 2012 e 2017. A combinação entre estiagem prolongada, baixa renda no setor e fragilidade estrutural dos estabelecimentos familiares agravou o processo de reconfiguração do mercado de trabalho agrícola nordestino.
“O Nordeste vivenciou uma queda acentuada e contínua nas ocupações agrícolas ligadas à agricultura familiar, e isso coincide com o período de uma das piores secas da história recente da região”, destacam os autores. Segundo os pesquisadores, é possível que o impacto climático tenha acelerado um processo já em curso, forçando as famílias a diversificarem suas fontes de renda para enfrentar as dificuldades.
O estudo também observa que, embora a agricultura continue sendo fundamental na economia rural, ela deixou de ser a única base ocupacional no campo. A estabilidade do emprego formal e a ampliação de atividades não agrícolas em áreas rurais indicam uma crescente pluriatividade das famílias, tendência observada desde o final do século XX. Esse fenômeno desafia os critérios tradicionais de análise do emprego agrícola e reforça a importância de políticas públicas voltadas à valorização da agricultura familiar e ao desenvolvimento rural integrado.
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