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Brasil se destaca na proteção social na América Latina, mas desafios de financiamento persistem

Eventos realizados pelo Ipea abordaram financiamento da proteção social e desafios para a universalização

Nos dias 25 e 26 de setembro, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) recebeu Helmut Schwarzer, representante da Organização Internacional do Trabalho (OIT), com sede em Genebra, para apresentar o Relatório Mundial sobre Proteção Social 2024-2026. O documento revela que, pela primeira vez, mais da metade da população global (52,4%) está coberta por proteção social, uma proporção superior aos 42,8% registrados em 2015, ano em que foram adotados os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Além disso, Schwarzer participou do Seminário das Quintas, onde, ao lado de outros pesquisadores do Ipea, discutiu o hiato de financiamento necessário para a universalização da proteção social, com foco nas estimativas e estratégias para gerar espaço fiscal em níveis global, regional e nacional.

Em sua fala, Schwarzer destacou a importância do relatório para orientar políticas públicas, especialmente em um contexto de crise global. "Nosso objetivo é mostrar o estado atual dos sistemas de proteção social no mundo e como eles podem ser parte das políticas de enfrentamento às mudanças climáticas", afirmou. O documento, uma das principais publicações da OIT, aborda questões cruciais para os sistemas de proteção social em todo o mundo, e como esses sistemas podem enfrentar desafios como a pandemia de Covid-19 e as mudanças climáticas.

Schwarzer explicou que, no Brasil, a cobertura dos sistemas de proteção social se destacou em relação à média latino-americana, com dados coletados até 2022. O país apresentou avanços em benefícios como aposentadorias e pensões, e o número de contribuintes ativos também aumentou, refletindo maior proteção contra acidentes de trabalho. No entanto, ele apontou que ainda existem lacunas importantes, como a insuficiente cobertura de benefícios para desempregados. Schwarzer ressaltou que Brasil e México são os grandes responsáveis pelo aumento da cobertura na América Latina, devido a políticas recentes que expandiram a proteção social. No México, a universalização das aposentadorias para idosos e a reformulação do sistema de saúde foram ações que contribuíram significativamente para esse avanço.

Carlos Henrique Leite Corseuil, diretor de Estudos e Políticas Sociais do Ipea, mediou o evento e comentou os dados apresentados sobre o seguro-desemprego em diferentes países, destacando dois pontos principais: primeiro, que ao analisar a cobertura do seguro-desemprego entre diferentes grupos de países, categorizados por nível de riqueza, percebe-se que a cobertura tende a ser significativamente menor nos países menos ricos. O segundo ponto é que, ao comparar países mais e menos ricos, a duração máxima do benefício não varia tanto. "Me chamou a atenção o fato de que a cobertura do seguro-desemprego é fortemente dependente do grau de desenvolvimento econômico do país", destacou.

Para encerrar, Schwarzer reafirmou o compromisso da OIT em continuar monitorando e promovendo a expansão da proteção social globalmente, especialmente em países de baixa renda, que ainda enfrentam grandes desafios para alcançar uma cobertura mínima adequada.

Durante o Seminário das Quintas, realizado na última quinta-feira (26/9), Schwarzer ressaltou a importância de abordar as lacunas no financiamento da proteção social. "A criação de um sistema de proteção social universal é um desafio que requer o comprometimento conjunto de países, instituições e da sociedade civil", afirmou. Ele ressaltou que, para alcançar essa meta, é essencial que os países adotem medidas que promovam um aumento substancial nos investimentos em proteção social.

O estudo apresentado no seminário revelou que, dos 177 bilhões de dólares necessários, 66 bilhões são destinados à saúde e 110 bilhões a benefícios monetários. "Curiosamente, na América Latina, essa realidade se inverte, evidenciando que muitos países enfrentam lacunas maiores em benefícios monetários do que em saúde", destacou Schwarzer. A discussão também abordou dados sobre a situação das mulheres na América Latina, indicando que 75% das mulheres em idade de aposentadoria não têm renda própria. "As mulheres têm níveis de cobertura comparativamente mais baixos que os homens", salientou. O gap total de investimento em proteção social na região é de 1,4 trilhão de dólares, sendo 177 bilhões apenas na América Latina.

A presidenta do Ipea, Luciana Santos Mendes Servo, presente no evento, destacou a importância de discutir a centralidade da proteção social nas políticas públicas do Estado brasileiro. "Esse trabalho tem um padrão muito interessante, pois nos permite discutir o que queremos financiar e quais são os marcos estabelecidos. Ele também nos ajuda a enxergar além das fronteiras, reconhecendo que o debate global influencia diretamente os modelos de financiamento que adotamos. O seminário nos oferece uma oportunidade valiosa de refletir sobre essa interação e fortalecer a construção de políticas públicas alinhadas aos padrões internacionais", afirmou Luciana.

Schwarzer ressaltou a importância de desenvolver fontes de receita domésticas para financiar a proteção social. "A ajuda internacional não é suficiente para sustentar os grandes volumes de despesa necessários", alertou, ressaltando que os países devem mobilizar recursos domésticos por meio de impostos e contribuições sociais.

O seminário também enfatizou a luta contra os fluxos financeiros ilícitos e a necessidade de uma reforma na arquitetura financeira internacional. Por fim, Schwarzer concluiu que o fortalecimento da proteção social é fundamental para a construção de sociedades mais justas e equitativas. "Investir em proteção social não é apenas uma questão de justiça, mas uma necessidade para o desenvolvimento sustentável", disse.

OIT

Fundada em 1919, a OIT tem como missão promover a justiça social e o trabalho decente. Schwarzer explicou que, além de apoiar governos, a organização trabalha em parceria com sindicatos e entidades empresariais para desenvolver sistemas de proteção social mais inclusivos e eficientes.

Por meio de sua governança tripartite, que envolve governos, empregadores e trabalhadores, a OIT estabelece normas internacionais que definem padrões mínimos de seguridade social. O compromisso da organização com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), especialmente aqueles voltados para a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades, orienta suas ações para os próximos anos.

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