Créditos: CNJ
O Brasil registrou, entre 1996 e 2021, pelo menos 294.752 mortes violentas cuja causa não foi definida, representando 8,7% do total de homicídios dessa natureza no país (3.396.010, no total). Os dados estão no estudo Mapa dos Homicídios Ocultos no Brasil entre 1996 e 2021, divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) nesta sexta-feira (21). Os 128.567 homicídios ocultos ocorridos no período equivalem a 43,6% do total de mortes violentas por causa indeterminada (MVCI). Em média, houve 4.492 homicídios ocultos por ano.
“Este número equivale à média anual de homicídios ocorridos no estado de São Paulo, ou à queda, sem sobreviventes, de 33 Boeings 737 lotados por ano, em tragédias totalmente invisibilizadas cuja causa não foi determinada pelo Estado”, destaca o autor do texto para discussão, o técnico de planejamento e pesquisa do Ipea Daniel Cerqueira.
Ao considerar o número de homicídios projetados como a soma dos homicídios registrados e dos homicídios ocultos, em média, a taxa de homicídio projetada por 100 mil habitantes supera a taxa registrada em 8,3%. Entre 1996 e 2021, enquanto o país registrou oficialmente 1.325.977 homicídios, os pesquisadores chegaram a 1.454.544 casos.
A evidência de um número considerado de homicídios ocultos relativiza a redução de homicídios em algumas Unidades da Federação (UFs), troca de posições entre UFs mais violentas e inversão no sentido da taxa de variação anual dos homicídios brasileiros, alterando o entendimento da dinâmica criminal. As MVCI não representam um problema generalizado no país, mas estão concentradas especialmente em quatro UFs: São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia e Minas Gerais. Esses quatro estados são, também, responsáveis por 72,5% de todos os homicídios ocultos no Brasil.
O estudo abrange 25 anos de dados e tem como base o Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde. A metodologia adotada para o trabalho se baseou em um modelo de aprendizado supervisionado (machine learning), em que o padrão probabilístico de características pessoais e situacionais para cada tipo de evento foi aprendido, sendo essas mortes caracterizadas entre homicídios, suicídios e acidentes.
Os pesquisadores ressaltam que o método proposto, no entanto, não esgota todas as possibilidades de identificação de homicídios ocultos e não deve ser entendido como substituto da necessidade de se aprimorar a qualidade das informações do SIM. Uma questão abordada e ainda sem resposta diz respeito ao número de homicídios não registrados no país quando não se tem sequer uma declaração de óbito – como em inúmeros casos revelados no Rio de Janeiro, onde milicianos somem com os corpos de suas vítimas.
O SIM representa a única fonte de informações confiável sobre mortalidade, com cobertura nacional, homogeneidade metodológica e atualização periódica, que possibilita a aferição da dinâmica temporal de diferentes mortalidades por Unidade Federativa desde 1980. No entanto, existem lacunas no preenchimento das características dos óbitos e incapacidade de identificação das intencionalidades dos óbitos.
Em outro estudo realizado pelo Ipea, é posta em análise a qualidade desses dados sobre mortes violentas do SIM entre 2010 e 2021 para cada UF, levando em consideração o não preenchimento das características das vítimas, das condições em que o incidente ocorreu e o número de mortes violentas por causa indeterminada (MVCI).
Enquanto idade, raça ou cor e sexo apresentam não preenchimento próximo a zero, estado civil apresenta não preenchimento próximo a 10%. Escolaridade, instrumento e local do incidente, por sua vez, registram altas taxas de não preenchimento. O desconhecimento dessas características distorce as proporções nas variáveis e, portanto, dificulta a elaboração de perfis dos óbitos, ao não refletir as distribuições ocorridas na realidade.
Já em relação à capacidade de identificar a intencionalidade dos óbitos, as evidências apresentadas sugerem estabilidade, em patamar elevado da taxa de MVCI até 2017 e expressiva deterioração nos anos seguintes.
O desempenho relativo das UFs, em geral, sofreu pouca alteração. Ou seja, UFs inicialmente com menores taxas de MVCI permaneceram as mesmas no final das séries históricas.
Ao observar as consequências das altas taxas de MVCI nas UFs sobre potenciais efeitos no sentido de ocultar estatisticamente os homicídios, os autores apontam que é preciso ter especial atenção e cuidado nas análises envolvendo os estados com os maiores índices.
Acesse o estudo Mapa dos Homicídios Ocultos no Brasil entre 1996 e 2021
Confira o estudo Analisando a Qualidade dos Dados sobre Mortes Violentas no SIM entre 2010 e 2021
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