Desenvolvimento Social

Tributação e consumo oneram de maneira distinta homens e mulheres, negros e brancos no Brasil

Tema foi debatido pelo Ipea em seminário nesta quinta-feira (25), em Brasília

Helio Montferre/Ipea


O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) promoveu, nesta quinta-feira (25/05), em Brasília, o seminário “Desigualdades Raciais e de Gênero na Tributação e Consumo”. Os três estudos discutidos evidenciam como a tributação e o consumo oneram de maneira distinta os homens e as mulheres, os negros e os brancos no Brasil, tendo como base a Pesquisa de Orçamentos Familiares de 2017-2018, elaborada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O estudo “Impactos Distributivos da Tributação e das Transferências Monetárias Públicas: um olhar de gênero e raça” aponta que a incidência da tributação direta e indireta, considerando a cor/raça e o sexo da pessoa de referência da família, reflete a posição dessas populações na estrutura de renda, dado que os tributos diretos são progressivos e os indiretos regressivos, com importância superior aos diretos.

A tributação direta se mostra progressiva e mais onerosa para brancos e homens, não mitigando completamente o caráter concentrador da tributação indireta. Desse modo, o sistema tributário possui um desenho que implica maiores reduções da renda ou do poder de compra das famílias chefiadas por pessoas negras e, em menor intensidade, por mulheres.

Pelo lado da tributação indireta, as mulheres são muito oneradas, já que sua cesta de consumo conta com muitos bens tidos como supérfluos – que possuem tributação mais elevada que bens tidos como essenciais. Outra forma pela qual se expressa um viés de gênero na tributação indireta ficou conhecida na literatura como taxa rosa (pink tax)nome dado para a prática do mercado de cobrar mais caro para produtos específicos para mulheres.

O coordenador da pesquisa e diretor de Desenvolvimento Institucional do Ipea, Fernando Gaiger Silveira, explicou quais ações auxiliam na redução dessas desigualdades: “Reduzir o peso da tributação indireta, já que onera mais pobres, negros e mulheres. Melhorar a progressividade da tributação direta, em especial revendo a isenção de lucros e dividendos distribuídos e benefícios fiscais. Além disso, é importante ampliar o peso das transferências monetárias na renda que são pró pobres, mulheres e negros”.

Privilégio branco

Na sequência, pesquisadores do Centro de Pesquisas em Macroeconomia das Desigualdades (Made) da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária da Universidade de São Paulo (FEA-USP) apresentaram os resultados do estudo “Privilégio Branco na Estrutura Tributária Brasileira: uma análise interseccional de impostos diretos e transferências”.

Com foco no impacto dos impostos diretos (cobrados sobre a renda e o patrimônio) e das transferências e na diferenciação entre brancos e negros, foi identificada a existência de um diferencial da tributação por raça quando considerados os homens do 1% do topo da distribuição de renda. O estudo dá a entender que esse resultado se deve à origem dos rendimentos de cada um dos grupos, dado que é possível identificar maior presença de empregadores entre brancos desse estrato de renda e menor participação dos que declaram trabalhar com carteira assinada ou sob um regime estatutário no funcionalismo.

Em relação às transferências, o texto destaca que seu comportamento no topo parece beneficiar em especial as mulheres brancas, devido ao Regime Próprio da Previdência Social (RPPS). Mesmo assim, não é possível identificar uma diferença estatística da participação na renda devido à alta variabilidade dessas participações entre os negros do 1% do topo.

Para os pesquisadores, a medida sugerida no Projeto de Lei 2337/21 de retomada da tributação de lucros e dividendos pode ser debatida com um novo elemento de correção dos impactos diferenciais entre brancos e negros no atual modelo de tributação. “O fato de que isso se mantém e não é discutido representa um privilégio branco. Espero que, na próxima discussão do imposto de renda, dos impostos diretos, isso seja revertido”, enfatiza a diretora do Made/USP, Luiza Nassif-Pires.

Consumo das famílias brasileiras

Já a metodologia do estudo “O Consumo das Famílias Brasileiras: um olhar de gênero e raça”, estimou um sistema de demanda de forma simultânea para seis categorias agregadas de consumo (habitação, transporte, alimentação, saúde, educação e outras despesas). Os resultados mostram que as mulheres gastam mais em habitação do que os homens, enquanto estes investem seus recursos mais nas despesas de transporte. Os gastos com alimentação são maiores entre os negros do que brancos, independentemente do sexo da pessoa de referência. Nas despesas com saúde e educação, brancos gastam mais do que negros, sendo que, com relação à saúde, mulheres brancas tendem a gastar mais do que homens.

Quanto ao total de anos de estudos da pessoa de referência, nota-se que, para todos os gastos, o efeito é positivo. Homens brancos e depois mulheres brancas, e com mais escolaridade, gastam mais. Homens negros e mulheres negras, mesmo os mais escolarizados, apesar de gastarem, têm padrão de despesas inferior ao de homens e mulheres brancas. Já o efeito da renda sobre as despesas com alimentação é maior em magnitude para os grupos mais vulneráveis. Para as chefes de família mulheres, independentemente da cor, o efeito da renda sobre os gastos em saúde é maior do que para os homens.

“Vale ressaltar que o padrão de consumo muda com a idade, mas, de forma significativa apenas para as despesas com educação, saúde, transporte e habitação. Além disso, as despesas em consumo crescem à medida que as pessoas envelhecem, decrescendo após atingir um máximo”, ponderou a pesquisadora da Diretoria de Estudos e Políticas Sociais (Disoc/Ipea) Ana Luiza Neves Holanda Barbosa.

Participaram da abertura do evento o presidente substituto do Ipea, Claudio Amitrano, a secretária de Políticas e Ações Afirmativas, Combate e Superação do Racismo do Ministério da Igualdade Racial, Marcia Regina de Lima Silva, e a representante adjunta da ONU Mulheres Brasil, Ana Carolina Querino.

Confira a íntegra do seminário

Acesse o estudo “Impactos Distributivos da Tributação e das Transferências Monetárias Públicas: um olhar de gênero e raça”

Acesse o estudo “Privilégio Branco na Estrutura Tributária Brasileira: uma análise interseccional de impostos diretos e transferências”

botao galeria de fotos

Comunicação - Ipea
(61) 2026-5501
(21) 3515-8704 / (21) 3515-8578
Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.