Transportes

Política do passe livre não aumentou comparecimento de eleitores às urnas em 2022

Pesquisa do Ipea conclui que redução dos custos monetários de transporte pode melhorar o acesso aos locais de votação, mas, sozinha, não eleva a participação dos eleitores

Helio Montferre/Ipea

No Brasil, as pessoas de baixa renda gastam entre 20% a 30% de sua renda familiar com transporte urbano. Cientes de que os custos com deslocamento podem ter impacto negativo na participação política, 82 municípios brasileiros, abrangendo 28,8 milhões (18,5%) dos eleitores, utilizaram a política do passe livre no primeiro turno das eleições em 2022. Já no segundo turno, mais 297 municípios adotaram a prática. Ao todo, 75,8 milhões (48,7%) dos eleitores tiveram acesso ao transporte público gratuito no segundo turno das eleições. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) fez uma primeira avaliação para saber se uma redução substancial nos custos monetários de transporte público aumenta a participação eleitoral. Os pesquisadores concluíram que a política de passe livre não teve efeito significativo sobre o comparecimento dos eleitores, nem sobre os resultados das eleições presidenciais de 2022.

A análise mostrou que a adoção da política de passe livre também não teve efeito representativo sobre a parcela de votos recebida pelo candidato de esquerda no segundo turno das eleições presidenciais, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), mesmo após uma competição eleitoral bastante acirrada (com diferença de votos de 1,8 ponto percentual entre os concorrentes). O estudo, intitulado Transporte Público Gratuito e Participação Eleitoral, é assinado pelos pesquisadores Rafael Pereira, do Ipea, Renato Vieira, Fernando Bizzarro, Rogério Barbosa, Ricardo Dahis e Daniel Ferreira.

Os autores avaliaram, ainda, potenciais efeitos heterogêneos da política de isenção de tarifas sobre o comparecimento em seções eleitorais que possuem diferentes proporções de eleitores com baixa escolaridade, ou que ficam localizadas em áreas mais remotas ou densamente povoadas. Novamente, concluiu-se que a participação no pleito não foi influenciada de modo significativo pela política do passe livre, independentemente do nível socioeconômico dos eleitores em cada seção eleitoral e da densidade populacional no seu entorno.

No entanto, a pesquisa apontou que a política do passe livre nas eleições teve importante impacto sobre os níveis de mobilidade no dia da votação, que cresceram entre 7,2% e 17,5%. Os municípios que forneceram transporte público gratuito no dia do primeiro turno registraram um aumento de 13,7% nos níveis de mobilidade nas paradas de transporte público. Também houve aumento de mobilidade em áreas de parques (17,7%), em supermercados e farmácias (7,2%) e em áreas de comércio (varejo) e recreação (5,0%) no dia 2 de outubro do ano passado.

A pesquisa indica que a política de isenção de tarifas pode ter contribuído para mudanças no modo de transporte que as pessoas usaram para ir votar – como trocar o automóvel particular pelo transporte público –, resultando em benefícios ambientais. É provável, também, que tenha melhorado o acesso às seções eleitorais, seja pela redução de custos monetários, ou do tempo de viagem. Porém, esse benefício foi utilizado por eleitores que já tinham decidido votar de qualquer maneira.

Uma das conclusões da pesquisa é que, embora a redução dos custos monetários de transporte possa melhorar o acesso das pessoas aos locais de votação, ela não é suficiente, por si só, para aumentar o comparecimento dos eleitores. Os resultados sugerem que as reformas destinadas a reduzir a abstenção eleitoral podem encontrar um terreno fértil em políticas que aumentem a proximidade geográfica entre os eleitores e os locais de votação.

A principal fonte de informação para essa pesquisa são os microdados dos resultados eleitorais por urna, disponibilizados publicamente pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). As informações sobre a adoção da política de passe livre no transporte público nos dias de eleição foram coletadas pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) e por movimentos sociais associados ao Movimento Passe Livre (MPL). Para medir a mobilidade, os autores utilizaram os dados de telefones celulares disponíveis publicamente pelo Community Mobility Reports, da Google. No entanto, neste quesito, o período de cobertura dos dados se encerra em 15 de outubro do ano passado, ou seja, não inclui o segundo turno da eleição.

Acesse a íntegra do estudo

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