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Ipea lança livro sobre as transformações no setor público brasileiro de 1985 a 2020

Em 20 capítulos, pesquisadores avaliam as mudanças na força de trabalho desde a retomada da democracia

Helio Montferre/Ipea

Com dados originais e artigos inéditos, o livro “Trajetórias da Burocracia na Nova República: heterogeneidades e desigualdades (1985-2020)”, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), faz um balanço abrangente do funcionalismo público brasileiro, especialmente das mudanças na força de trabalho do setor público desde que o país voltou à democracia, a partir de 1985. O lançamento será em Brasília, nesta sexta-feira (10/03), às 10h, durante o evento Burocracia Pública – Planejamento e Transformação do Estado no Brasil, no Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos (Esplanada dos Ministérios, Bloco K, auditório).

A obra tem 20 capítulos e destaca as múltiplas dimensões das desigualdades e heterogeneidades do setor público. Os estudos abordam os principais segmentos do funcionalismo e suas transformações nas últimas décadas, com recortes por nível federativo – União, estados e municípios – e por poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário. Os autores dos artigos, pesquisadores do Ipea e convidados, analisaram a força de trabalho, os quantitativos de pessoal, a despesa e a política remuneratória, o perfil ocupacional e a estrutura de ocupações, os cargos e as carreiras, bem como as mudanças viáveis e desejáveis, visando à modernização do funcionalismo brasileiro.

Os pesquisadores exploraram a massa original de dados da plataforma Atlas do Estado Brasileiro, do Ipea, que ainda não havia sido analisada em detalhe. Esse trabalho só foi viável por meio do livro organizado pelo coordenador da plataforma, Felix Lopez, e pelo economista José Celso Cardoso Junior, ambos pesquisadores do Instituto. “Os dados mostraram que nos movemos tal como preconizava a Constituição de 1988, ou seja, para a municipalização”, disse Lopez. O setor público cresceu de forma significativa nos municípios. O espaço relativo do funcionalismo estadual e federal diminuiu. Hoje, os municípios têm seis em cada dez pessoas no setor público.

Isso é relevante porque ainda se mantém uma tradição de análise concentrada no nível federal, que detém menos de 10% da força de trabalho. “Por isso, o grande sobrevoo do livro, mostrando o movimento de municipalização, foi muito significativo”, destacou Lopez. Como desdobramento das análises desse movimento, outro aspecto de destaque no livro refere-se ao caráter heterogêneo e diverso da burocracia pública brasileira. Ele cita o exemplo da reforma administrativa do governo federal, ao partilhar um conjunto de imagens e premissas que vale para o serviço público federal, mas não se aplica aos níveis estadual e municipal, onde está a maior parte dos servidores. Desfazer essa imagem de homogeneidade, ou de uma parte representar o todo, também foi um propósito do livro.

A publicação constata que desigualdades estruturantes do mercado de trabalho – salariais, raciais e de gênero, por exemplo – estão presentes no setor público. Boa parte dos estereótipos associados ao funcionalismo decorre da generalização indevida de características de setores específicos, como as carreiras de elite do funcionalismo federal ou as “carreiras imperiais” da magistratura, discutidas no livro.

Diferenças salariais

Com dados novos e em nova perspectiva, o livro também compara a diferença e a heterogeneidade nas remunerações do setor público com o setor privado. Essa discussão está presente ao se comparar o hiato salarial, incorporando o Legislativo, Executivo e Judiciário em uma série de várias décadas da Relação Anual de Informações Sociais (Rais). Desagregando por ocupações, é possível ver em detalhe que a ideia da diferença positiva em favor do setor público se aplica ao nível federal, em parte ao nível estadual, mas não existe no nível municipal, ficando circunscrita a carreiras e ocupações específicas, segundo Lopez.

Ao examinar o Legislativo e o Judiciário, o livro traz duas novas contribuições. No Legislativo, onde a força de trabalho cresceu nos municípios, uma análise inédita sugere que esse aumento se deveu à profissionalização. Esse processo se alinha à maior autonomização do Legislativo frente ao Executivo, frequentemente em debate no Parlamento federal. O Judiciário, por sua vez, tornou-se um grupo atípico após meados de 1990, em parte, devido à autonomia orçamentária, caracterizando-se como um perfil incomparável aos demais poderes. A análise possibilitou entender as trajetórias das pessoas e quais são os sentidos desses processos nas carreiras da magistratura e jurídicas no nível federal.

A análise de 2002 a 2021 mostrou um aumento de 1% do produto interno bruto (PIB) na despesa com servidores ativos, que se explica pela expansão acentuada do funcionalismo municipal devido às exigências constitucionais, para ampliar ou universalizar políticas de saúde, educação e assistência social. Mesmo como percentual da receita disponível, o que se vê é, essencialmente, estabilidade no gasto. O crescimento do quantitativo de pessoal no setor público não significou um aumento desmesurado da despesa pública.

Integrando dados de diferentes fontes relativos ao período de 2013 a 2021, o estudo detalhou o aumento da ocupação de cargos da alta direção no Executivo federal civil por militares. E descreveu esse processo por órgão federal, bem como as mudanças legais que subsidiaram esse ingresso crescente de militares na burocracia civil. Outra análise inovadora refere-se à trajetória da burocracia dirigente subnacional, nos estados e municípios, em especial, sua rotatividade e politização, e como esses fenômenos afetam a estabilidade da burocracia dirigente, condição para planejar políticas públicas eficientes.

A parte final do livro reconstrói algumas dimensões da trajetória da capacidade do Estado nas últimas duas décadas, com foco na assistência social, na saúde em termos organizacionais e ocupacionais, e na educação, limitada à evolução do quadro de professores. E uma última discussão, mais teórica, aborda as mudanças possíveis no sistema de carreiras, além de uma análise ocupacional, que avalia como o Estado brasileiro em 20 anos mudou o perfil dos cargos e das competências requeridas na contratação de pessoas.

Serviço 

Burocracia Pública, Planejamento e Transformação do Estado no Brasil

Data: 10 de março de 2023
Horário: 10h às 12h
Local: Auditório do Bloco K, Esplanada dos Ministérios, Brasília-DF

Abertura:
Simone Tebet - ministra do Planejamento e Orçamento
Esther Dweck - ministra da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos

Mesa 1: Ipea e Enap nos Estudos e na Capacitação do Funcionalismo Público Brasileiro
Luciana Mendes - presidenta do Ipea
Betânia Lemos - presidenta da Enap

Mesa 2: Lançamento do livro do Ipea “Trajetórias da Burocracia na Nova República: heterogeneidades e desigualdades (1985-2020)”
Organizadores: Félix Lopez e José Celso Cardoso Jr.

Capítulo 11: Ingressantes no Executivo Civil Federal: uma análise no contexto da lei de cotas no serviço público
Tatiana Dias Silva – técnica de planejamento e pesquisa do Ipea

Capítulo 12: Quando o Teto de Vidro se Torna de Concreto: a sub-representação de mulheres negras nos postos diretivos do Executivo federal entre 1999 e 2020
Luana Pinheiro – técnica de planejamento e pesquisa do Ipea

Transmissão ao vivo no YouTube

Acesse a íntegra do livro

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