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Alternativas à prisão

2014 . Ano 11 . Edição 82 - 31/12/2014


Victor Martins Pimenta e Fabio de Sá e Silva

O crescimento do número de presos no Brasil é estarrecedor, sem precedentes no mundo. Entre 2000 e 2013, o país saltou de 232 mil para 581 mil presos, um acréscimo de 150% da população prisional em apenas 14 anos. Essa expansão descontrolada favoreceu a eclosão de profunda crise, caracterizada por cárceres superlotados e dificuldade na implementação de políticas de reintegração social mediante ações de educação, trabalho e assistência à saúde. A superlotação das unidades prisionais, que lhes confere condições degradantes, contribui para a alta taxa de reincidência, além de apresentar um cenário propício para a expansão do crime organizado, com farta oferta de mão de obra para o aliciamento, muitas vezes compulsório, por parte das facções criminosas. As cadeias se apresentam, assim, como espaços de reprodução da violência, operando como "escolas do crime" e contribuindo para o aumento da criminalidade.

Comparando-se, ao longo do tempo, as taxas de criminalidade e de população prisional em âmbito nacional e nos diferentes estados, é possível constatar que o crescimento do número de presos não traz como consequência a redução no cometimento de crimes. Essa dissociação revela o gritante equívoco da orientação das expectativas da sociedade e do sistema de justiça associadas à pena de prisão, que legitimam uma política de segurança pública fadada, desde logo, ao fracasso.

Enfrentar esse quadro requer deslocar a posição central que a prisão ocupa nas práticas dos sistemas de justiça e segurança pública, com a diversificação do nosso repertório punitivo. Obviamente, isto não significa promover a impunidade, mas sim estimular a construção de estratégias mais baratas e efetivas. Exemplo está nas quase 80 mil pessoas presas pela prática de furto, crime que, por definição, é praticado sem violência ou grave ameaça. Muitas delas poderiam estar cumprindo penas e medidas alternativas informadas por um enfoque restaurativo, o que desoneraria os cofres públicos e garantiria menor reincidência criminal.

Não obstante, conforme aponta a pesquisa A aplicação de penas e medidas alternativas, realizada em parceria entre Ministério da Justiça e Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e publicada em novembro, a prisão continua reconhecida como principal medida a ser aplicada frente a qualquer evento de violação da lei penal. Tal realidade tem incidência mais aguda sobre parcelas específicas da população, como jovens negros.

O cenário mais alarmante aparece no encarceramento provisório, ou seja, sem condenação transitada em julgado. É gravíssima a informação de que em 37,2% dos casos pesquisados nos quais os réus estiveram presos provisoriamente não houve condenação à prisão ao final do processo. Projetando esse dado para o gritante número de presos provisórios no país, que ultrapassou a marca de 240 mil pessoas em dezembro de 2013, é provável que tenhamos aproximadamente 90 mil homens e mulheres encarcerados no país que não serão condenados à prisão, na maior parte dos casos com sentenças de absolvição ou condenação a penas alternativas. Em relação a este dado, a pesquisa confirma "o sistemático, abusivo e desproporcional uso da prisão provisória pelo sistema de justiça no país".

Ao mesmo tempo, a pesquisa permite rejeitar a tese de que a concessão de liberdade provisória seria sinônimo de impunidade. Nos processos pesquisados em varas criminais nos quais os réus responderam em liberdade, em apenas 13,7% dos casos ocorreu a prescrição.

A pesquisa publicada se soma, ainda, a diversas outras referências recentes, que revelam a incidência desigual do sistema penal brasileiro sobre a população. Levantamento realizado tanto em varas como em juizados permite análises importantes a esse respeito, na medida em que revela a existência de maior número de réus negros nas varas criminais, onde a prisão é a regra, e a maior quantidade de acusados brancos nos juizados, nos quais prevalece a aplicação de alternativas penais. Esses dados chamam a atenção, novamente, para processos de construção de desigualdades e de reprodução de opressões nas instituições brasileiras.

Fica nítida, portanto, a necessidade de profunda mudança no sistema de justiça criminal do país, que deve assumir a falência do modelo de encarceramento em massa, passando a reconhecer o cárcere como última opção e privilegiando a aplicação de alternativas.

 

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Victor Martins Pimenta Victor Martins Pimenta é especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental e coordenador-geral do Programa de Fomento às Penas e Medidas Alternativas do Ministério da Justiça.

Fabio de Sá e Silva é técnico de Planejamento e Pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada


 
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