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Sementes crioulas valem ouro

2014 . Ano 11 . Edição 81 - 05/10/2014

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Prática inovadora desenvolvida por cooperativa de São Miguel do Oeste, em Santa Catarina, massifica a tradição do uso de sementes crioulas, aumenta a renda das famílias camponesas e contribui para a preservação das sementes nativas. E tudo em sintonia com o meio ambiente

Renata de Paula

A prática de cultivar sementes crioulas, sementes primitivas que sofrem cruzamentos seletivos em decorrência da natureza, é milenar e garantiu a produção de alimentos por anos. A técnica simples e passada de pai para filho na troca de sementes nativas permitiu a soberania alimentar dos povos e a biodiversidade dentro dos sistemas de produção. Readequar a técnica milenar em uma escala comercial, no entanto, foi a inovação que a cooperativa Oestebio, em São Miguel do Oeste (SC), se propôs a fazer. A saga começou em 1996, com pequenos camponeses na região Oeste de Santa Catarina ligados ao Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA). Eles desenvolviam trabalhos de resgate e produção de sementes crioulas e geravam um volume considerável de produção. O maior problema, porém, estava em organizar a produção e comercializar as sementes. A solução veio com a criação da Oestebio, em 2007, para sistematizar a produção e vender as sementes produzidas.

A agrônoma da cooperativa, Daniele Nerling, explica que o diferencial da prática está em multiplicar sementes crioulas e varietais em escala comercial sem perder a diversidade, adotando estratégias produtivas voltadas à transição agroecológica com a valorização do conhecimento tradicional, dos aspectos culturais, econômicos e sociais das comunidades, vinculado a um plano de erradicação da extrema pobreza. Com um sistema de produção único, a cooperativa conseguiu pensar em um processo que contemplasse todas as etapas de produção. O trabalho é dividido entre os mantenedores ou guardiões das sementes e os multiplicadores que aumentam o volume das sementes. Feita a multiplicação, as sementes são tratadas na cooperativa e distribuídas para famílias carentes, em articulação com o governo federal.

O processo em etapas começa com a atuação da Oestebio, que realiza um diagnóstico, identifica as variedades crioulas mais ameaçadas e organiza uma rede de famílias mantenedoras, as quais assumem um compromisso com a organização de conservar e manter a variedade genética das sementes. Cada variedade, na medida do possível, é mantida por três famílias distribuídas em diferentes regiões do estado, para garantir a maior variabilidade genética e minimizar riscos de perdas por questões climáticas. Como as sementes crioulas são mais rústicas, elas são mais resistentes e se adaptam melhor em ambientes extremos.

Ana Paula Moreira/Ipea
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Sementes passam por uma máquina chamada mesa densimétrica,
que as classifica por densidade

O segundo passo fica por conta dos técnicos da cooperativa, que levam essas sementes para os multiplicadores, responsáveis pelo plantio, manejo e colheita dessas sementes que são compradas pela cooperativa. Na Oestebio, as sementes passam por um processo de secagem e limpeza e depois são classificadas e armazenadas em silos para a venda. As sementes são compradas pelo Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) do governo federal e distribuídas para famílias em condição de extrema pobreza e insegurança alimentar. Daniele Nerling destaca que a parceria com o programa do governo permite que a cooperativa compre as sementes dos agricultores por um preço mais alto do que no comércio local, já que parte do valor é financiada pelo próprio governo. Uma saca de milho, por exemplo, que seria vendida no comércio local por R$ 22, é comercializada por R$ 36 para a cooperativa, e parte deste dinheiro é dado pelo PAA para incentivar a prática entre as famílias.

Daniele explica que, neste ciclo, todos saem ganhando. Os mantenedores e os multiplicadores, ao vender as sementes, incrementam a renda familiar e retomam a autonomia produtiva. As famílias carentes que recebem essas sementes também. Além disso, os agricultores da cooperativa recebem assistência técnica em todo o processo de produção de sementes, da escolha da área até a colheita, realizada por técnicos da cooperativa; a escolha da área com fertilidade e o isolamento necessário para garantir qualidade nutricional e pureza genética das sementes; o uso preferencial de adubação orgânica para fertilização dos solos e adoção de práticas agroecológicas para diminuir o uso de agrotóxicos nos campos; a colheita manual e uso de batedor para debulha da produção, sendo permitida a colheita mecanizada somente com acompanhamento técnico.

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Com tantos atributos, a prática foi um dos 30 projetos vencedores do 5°prêmio Objetivos do Milênio (ODM) Brasil em 2013, o qual incentiva ações, programas e projetos que contribuem efetivamente para o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. A ação conta com o apoio do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e de um conjunto de empresas e associações do setor privado. A coordenação técnica do Prêmio é de responsabilidade do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e da Escola Nacional de Administração Pública (ENAP). A escolha dos premiados foi feita por um júri composto por 16 especialistas de todo o país. A prática ajuda a reduzir a pobreza e garantir a sustentabilidade ambiental.

Para as biólogas do Ipea Regina Sambuichi e Ana Paula Moreira, que visitaram a cooperativa no fim do ano passado, o maior diferencial da Oestebio está na inovação em massificar a ideia de variedades crioulas e beneficiar toda a cadeia envolvida no processo, inclusive o meio ambiente. Regina explica que manter a variabilidade genética dessas espécies tradicionais significa, acima de tudo, uma independência dos camponeses em relação à indústria de sementes, que é extremamente monopolizada. “A indústria acaba por escravizar o agricultor ao comercializar uma semente que exige todo um pacote tecnológico, como insumos, agrotóxicos e fertilizantes, para as sementes resistirem”, afirma. Segundo ela, a prática de sementes crioulas é agroecológica e utiliza de outros princípios da agricultura que não necessitam tanto de produtos químicos e fertilizantes, promovendo a soberania dos agricultores sobre a semente, já que eles podem multiplicar sua própria semente e se alimentar dos alimentos produzidos por elas.

Os benefícios elencados pelas pesquisadoras sobre a técnica de sementes crioulas são vários, como a manutenção da biodiversidade das espécies cultivadas e a variedade em alimentos. Com maior variabilidade genética, as sementes conseguem sobreviver em condições adversas de clima e temperatura e assim se reduzem o uso de insumos e o endividamento das famílias. Ana Paula lembra que, no período de safra, as famílias aumentam a renda em até R$ 3 mil. Além disso, segundo a cooperativa, a técnica promove a diminuição do êxodo rural, possibilitando aos camponeses condições de permanecer no campo; aumenta a renda dos pequenos agricultores pela produção e comercialização de sementes crioulas; promove autonomia das famílias com a diminuição do uso de insumos externos e sementes transgênicas; melhora a alimentação das famílias em áreas de insegurança alimentar e nutricional, por meio do incentivo à produção de alimentos como uso de sementes crioulas e varietais; agrega valor aos produtos oriundos das pequenas propriedades; contribui com programas de garantia da segurança alimentar, além de incentivar e apoiar o modelo orgânico e agroecológico de produção.

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João Viana/Ipea
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A indústria acaba por
escravizar o agricultor
ao comercializar uma
semente que exige todo um
pacote tecnológico, como
insumos, agrotóxicos e
fertilizantes, para as
sementes resistirem.
Regina Sambuichi
,
pesquisadora e bióloga
do Ipea

Números A Oestebio foi criada por 35 associados. Hoje a cooperativa tem 465 agricultores em seu quadro social, 70 mantenedores, envolve 633 famílias na produção de sementes e 1.400 famílias em trabalhos de promoção da agroecologia. As sementes produzidas em maior escala são de feijão e milho e, em menor escala, trigo e aveia. Na multiplicação de sementes na safra 2012/2013, 68.638 famílias receberam essas sementes, um total de 1.638 toneladas de sementes de milho e feijão.

Há quatro anos na cooperativa, a agricultora Maria Palombit Triaca, 61 anos, conta que, desde que entrou para a Oestebio, a renda da família melhorou e eles já conseguem produzir quase todos os alimentos que consomem com a ajuda das sementes crioulas. “Nós só compramos no supermercado o mínimo, apenas café e açúcar, os outros alimentos tiramos da nossa terra”, explica. Segundo ela, a cooperativa fornece todo o apoio técnico para plantar com as sementes. “Em épocas de seca, muitas vezes não conseguimos produzir os grãos que gostaríamos e, então, procuramos a cooperativa para conseguir outras sementes, ou trocamos com os outros agricultores”, explica. Ela e o marido Norberto Triaca, também agricultor, retiram da terra todo o sustento da família e conseguiram criar três filhos. As sementes crioulas da família são vendidas para a cooperativa. “Ganhamos muito mais assim do que quando vendíamos no comércio”, conclui.

Ana Paula Moreira/Ipea
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Sementes de milho e suas
variedades  genéticas

Parcerias A prática desenvolvida pela Oestebio tem parcerias com programas e projetos do governo em todas as etapas. A rede de guardiões apresenta integração com pesquisas desenvolvidas com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e a Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri), que possuem redes de ensaio de avaliação de cultivares, bem como programas de melhoramento. Para ambas, os guardiões disponibilizam variedades para fazerem parte dos ensaios de avaliação e participam das pesquisas participativas. Em parceria com a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), por meio do programa de Pós-Graduação em Recursos Genéticos Vegetais, são realizadas pesquisas participativas para o desenvolvimento de variedades adaptadas aos sistemas camponeses de produção, bem como o desenvolvimento de estratégias de conservação dos recursos genéticos ameaçados de extinção.

Na multiplicação de sementes, a prática está integrada: a Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (PNATER) permite contratar serviços técnicos para a orientação às famílias e acompanhamento de todas as fases produtivas dos campos de produção de sementes.

João Viana/Ipea
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No período de safra, as
famílias aumentam a renda
em até R$ 3 mil.
Ana Paula Moreira
,
pesquisadora e bióloga
do Ipea

Já o Programa de Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais (Pronat) repassa recursos para investimento na infraestrutura de recepção, secagem, beneficiamento e armazenamento das sementes e o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) disponibiliza crédito para o custeio da safra ou atividade agroindustrial, como compra de máquinas, equipamentos e melhoria da infraestrutura de produção.

Outro programa importante é o de Desenvolvimento Regional Sustentável (DRS), que financia a ampliação e melhoria na estrutura de recepção, secagem, beneficiamento e armazenamento das sementes produzidas pelos camponeses.

Na distribuição das sementes, o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Plano Brasil Sem Miséria disponibilizam os recursos financeiros para que a Oestebio efetue a compra das sementes dos camponeses multiplicadores, o tratamento das sementes e a distribuição às famílias em condição de extrema pobreza e insegurança.

 
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