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Três visões inovadoras do mercado

2013 . Ano 10 . Edição 78 - 16/01/2014

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Marcelo de Sales Pessoa*

O Prêmio Nobel de Economia de 2013 foi dado a Eugene Fama, a Lars Hansen e a Robert Shiller, três norte-americanos que contribuíram com pesquisas nas áreas de precificação de ativos financeiros e de previsão dos movimentos desses preços no longo prazo. Essas pesquisas mudaram a forma como milhões de pessoas realizam seus investimentos e como os governos lidam com o mercado

O mercado financeiro é um conjunto de instituições que permitem a negociação de ativos financeiros. As pessoas usam esses ativos como mecanismos para transportar recursos no tempo e entre diferentes cenários econômicos. Por exemplo, quando você toma um empréstimo para comprar uma casa, move sua renda do futuro para o presente. Se você poupa para a aposentadoria, leva seus ganhos de hoje para 30 anos à frente. Ao contratar o seguro de um carro, carrega dinheiro para o cenário em que seu veículo foi roubado. Em todas essas situações, está usando ativos financeiros.

A utilidade dos ativos financeiros, portanto, está ligada à necessidade de reorganização de recursos no tempo, para melhor satisfação dos diversos planos de consumo e de investimento. Nada disso, porém, seria possível se esses ativos não fossem bem precificados, se seus preços não refletissem adequadamente seus riscos. Quem aplicou na empresa OGX, do empresário Eike Batista, quando o preço dessa ação era R$ 15 conseguiria realizar seu objetivo de consumo, hoje, ao valor de R$ 0,15 por ação?

O prêmio Nobel de Economia de 2013 foi dado a Eugene Fama, a Lars Hansen e a Robert Shiller. Esses três norte-americanos obtiveram resultados relevantes nas áreas de precificação de ativos financeiros e de previsão dos movimentos desses preços no longo prazo. A grande surpresa em relação à seleção deste ano foi a aparente contradição entre as teorias dos premiados. Alguns consideram esse Nobel de Economia para Fama e Shiller como premiar Friedman e Keynes, ou conceder o Nobel de Física a Copérnico e a Ptolomeu ao mesmo tempo.

Para Shiller, as pessoas cometem erros sistematicamente devido a vieses psicológicos e isso explica certos movimentos nos preços das ações. Segundo Fama, no agregado, os mercados comportam-se de forma eficiente, com agentes tomando atitudes perfeitamente racionais. A teoria de Hansen também mostra como estimar modelos baseados na hipótese de racionalidade.

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Eugene Fama, 74, é professor de finanças na Universidade de Chicago. Quando ainda era aluno de graduação, Fama conseguiu estágio na firma de um dos seus professores. Seu trabalho era fazer previsões para o mercado financeiro. Especificamente, a tarefa era criar regras de negociação que gerassem retorno para o investidor. Naquela época, notou que as estratégias funcionavam bem quando eram testadas nas séries históricas dos preços das ações, mas, fora dessa amostra, com dados novos, elas falhavam.

Shiller ficou famoso por prever bolhas e crises. Fama diz nem ao menos saber o que significam bolhas no mercado financeiro. Essas visões distintas têm consequências para políticas públicas. Por um lado, justificam uma observação mais atenta dos mercados pelos bancos centrais. Por outro, sugerem desregulamentação. Ao final desse debate, porém, sempre haverá um vencedor: a ciência econômica.

EUGENE FAMA A explicação para esse fenômeno era a eficiência do mercado financeiro: os preços refletem rapidamente toda a informação disponível. Esse reflexo dos dados nos preços se dá por meio da competição entre os investidores por maiores ganhos. A busca por retorno leva cada investidor a investigar todas as informações possíveis e a usá-las em suas transações. Assim, num mercado eficiente, nenhuma estratégia baseada em informações passadas poderia ser capaz de gerar ganho elevado, pelo simples fato de que elas já estariam contidas nos preços.

Por exemplo, suponha que alguém, usando uma série pública de dados históricos, previsse a alta do preço de uma ação. Imediatamente, esse investidor tentaria comprar a ação. Como a informação é pública, o vendedor também saberia da alta e ajustaria o preço de venda até o ponto em que este refletisse essa previsão. Por isso, o comprador da ação não teria retorno excessivo com sua estratégia: o preço da ação daria um salto imediato e não ao longo do tempo. O preço dos ativos se ajustaria sempre muito rapidamente a cada informação nova, variando da mesma forma aleatória que a chegada de informações.

Hoje, essas noções sobre mercados eficientes estão bastante consolidadas na academia, mas não existiam na época em que Fama era aluno de graduação e tentava encontrar uma forma de ganhar dinheiro no mercado financeiro. Não existiam porque o seu criador foi exatamente Eugene Fama. Apenas no segundo ano de seu doutorado na Universidade de Chicago, ele começou a entender a falha de suas estratégias de negociação. Nessa época, conversava muito com Merton Miller, que receberia o prêmio Nobel de Economia em 1990. Miller e outros pesquisadores estavam estudando o que aconteceria com os preços se os mercados funcionassem perfeitamente e sugeriu esse tema para a tese de doutorado de Fama. Como já havia trabalhado com modelagem de séries financeiras na época do estágio da graduação, ele aceitou rapidamente a proposta.

Mercado Eficiente


O termo Mercado Eficiente e a definição que temos hoje a respeito de eficiência de mercado foram criados por Fama em 1970. Sua intenção original era publicar um artigo no qual revisaria a literatura sobre testes de eficiência no mercado financeiro. Ele organizou esses testes em três categorias, separando a eficiência em: fraca, semiforte e forte. No primeiro caso, informações históricas já estariam refletidas nos preços; no segundo, informações públicas em geral; e, no terceiro, informações privadas. Essa organização ajudou a academia a entender e a trabalhar com a hipótese de mercados eficientes.
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A ideia de Fama era mostrar que a distribuição dos retornos das ações tinha mais valores extremos do que uma distribuição normal. Além desse resultado, realizou testes que evidenciaram a imprevisibilidade dos preços das ações no curto prazo. Nesse momento, Fama entendeu perfeitamente por que suas estratégias não funcionavam: os preços seguiam um passeio aleatório. Essa tese foi publicada como artigo em 1965. Em 1969, ainda estudando o comportamento dos preços, com outros pesquisadores, Fama revelou o que acontece com o valor de uma ação quando ocorrem eventos relacionados à firma, tais como divulgação de lucro, anúncio de fusão, etc.

Nesse artigo, estudou especificamente o caso do anúncio de desdobramento do número de ações. Como resultado, mostrou que o preço dava um salto no dia desse anúncio, refletindo a informação rapidamente. Para conseguir isso, Fama criou uma metodologia que é usada ainda hoje em centenas de trabalhos científicos e práticos, até mesmo em decisões judiciais sobre casos de fraude financeira e de insider trading.

A inovação conseguida por Fama foi associar o estudo de eventos ao modelo de precifi cação de ativos de capital (CAPM) criado apenas cinco anos antes. Esse modelo deveria ser usado para isolar o efeito do evento de outras influências sistêmicas sobre o preço do ativo. Dessa forma, o pesquisador poderia ter mais segurança em sua previsão sobre o comportamento do ativo nos diversos cenários relacionados à firma.

Até o trabalho de Fama, acreditava-se que eficiência de mercado significava preços seguindo um passeio aleatório. A documentação desse fenômeno começou com a tese de doutorado do matemático francês Louis Bachelier em 1900 e continuou com os trabalhos de Burton Malkiel, autor do best-seller Um Passeio Aleatório por Wall Street.

Na verdade, hoje, devido à contribuição de Fama, sabe-se que os retornos esperados de equilíbrio podem variar no tempo de forma previsível: os preços podem não ser aleatórios. A inovação no conceito de efi ciência criado por ele foi mudar o foco para a diferença entre o retorno esperado observado e o retorno esperado segundo um modelo de precificação. Essa diferença, sim, não poderia ser prevista com base nas informações disponíveis. Isso quer dizer que um investidor pode até prever preços, mas não vai conseguir tirar proveito disso para obter ganho econômico.

NOVO MODELO Antes de testar a eficiência de mercado, seria preciso, então, selecionar um modelo que explicasse como o risco e o retorno dos ativos estão relacionados. Depois, os pesquisadores deveriam calcular a diferença entre o retorno médio observado do ativo e o retorno médio segundo esse modelo de precificação, i.e., o retorno médio controlado para o risco do ativo. Essa diferença recebeu o nome de alfa. De acordo com a teoria de Fama, se os mercados fossem eficientes, os investidores não conseguiriam, em média, encontrar alfa diferente de zero, ou seja, não conseguiriam retorno sem risco.

Ao definir eficiência dessa forma, Fama causou enorme impacto na indústria de fundos de investimento. O alfa passou a ser a pedra filosofal dos gestores dos fundos ativos. Porém, se o mercado fosse eficiente, em média, esses fundos não conseguiriam gerar ganho para seus cotistas. Esses investidores, então, procurariam fundos passivos, que replicam índices de mercado, como o Ibovespa. Isso porque esses últimos realizam análises mais simples, cobrando taxas mais baixas para desempenhos semelhantes aos dos primeiros.

De fato, segundo Fama, se observarmos a distribuição dos alfas de todos os fundos que fazem estratégia ativa, veremos que essa distribuição está centrada no zero e que há uma cauda direita e uma cauda esquerda de mesmo tamanho. Isso significa que, em média, esses gestores não geram ganhos, mas há bons e maus gestores. No entanto, após considerarmos os custos, apenas 3% dos fundos ativos entregariam retorno a seus cotistas.

A indústria de fundos índices se desenvolveu bastante por causa desses resultados. Por exemplo, em 1976, influenciado por essa literatura e por sua própria pesquisa quando fazia doutorado em Princeton, John Bogle criou o Vanguard 500, o primeiro fundo índice da história disponível para investidores em geral. No momento da criação, esse fundo tinha um patrimônio líquido de US$ 11 milhões. Hoje, a Vanguard é a maior gestora de ativos do mundo, com um patrimônio de US$ 2 trilhões.

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Inicialmente, o modelo de precificação escolhido para o cálculo do alfa e para os testes de eficiência de mercado era o CAPM. Havia, então, a necessidade de testá-lo antes de poder usá-lo amplamente. O primeiro teste bem-sucedido do CAPM foi realizado por Fama junto com MacBeth em 1973. A metodologia criada por eles ainda é usada por economistas e estatísticos em análises de dados em painel.

O CAPM se saiu bem no teste inicial de Fama e MacBeth. Suas previsões foram observadas nos resultados usando séries históricas do mercado financeiro. A partir da década de 80, porém, diversos estudos documentaram anomalias: regularidades nos dados não explicadas pelo modelo CAPM.

Em 1992, Fama, num artigo com French, uniu todas essas anomalias numa demonstração coerente das dificuldades do CAPM de explicar os dados. O objetivo era tentar entender como os fatores descobertos na década anterior (valor de mercado; e razões entre valor contábil e valor patrimonial, entre lucro por ação e preço e entre dívida e valor de mercado) atuariam em conjunto numa análise sobre as diferenças entre os retornos médios dos ativos. Esse artigo tornou-se o trabalho científico de finanças mais citado nos últimos 30 anos.

Generalização do Método
dos Momentos foi
desenvolvida para testar
modelos que avaliam
preços de ativos financeiros

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De acordo com Fama, ele dera um “tiro certeiro no coração do CAPM”: demonstrou que o risco sistemático, tal como medido pelo modelo na variável beta, não explicava a diferença entre os retornos médios dos ativos. O risco era, na verdade, multidimensional: variáveis como valor de mercado e razão entre valor contábil e valor patrimonial afetam a decisão dos investidores sobre quanto prêmio de risco devem demandar de uma ação.

De posse dessa informação, muitos fundos passaram a montar carteiras com base nos fatores de Fama e French. Estudos mostram que, se um investidor americano aplicasse dessa forma em 1993, logo após a publicação do artigo, e mantivesse essa estratégia por 10 anos, teria 30% a mais que o retorno do índice de mercado ao final do período. O trabalho de Fama abriu diversas veredas nas pesquisas em finanças e nas práticas do mercado.

LARS HANSEN O modelo CCAPM faz parte de um conjunto de modelos econômicos nos quais um agente representativo racional toma decisões sobre o quanto consumir ao longo do tempo. Inicialmente, macroeconomistas usaram esses modelos para explicar o crescimento econômico. A partir da década de 70, foram propostas adaptações para avaliar também o comportamento dos preços dos ativos.

A teoria contida no CCAPM encontrou grande aceitação na academia, mas ainda restava colocá-lo à prova, confrontando-o com os dados. Dada a complexidade do modelo, seus testes estatísticos formais foram possíveis apenas após o uso da metodologia criada por Hansen: Generalização do Método dos Momentos (GMM, na sigla em inglês). Antes da GMM, qualquer teste do CCAPM envolveria, necessariamente, o teste conjunto de uma série de hipóteses a respeito dos dados e do próprio modelo. Então, se esse teste falhasse, qual das hipóteses deveria ser rejeitada? Hansen conseguiu contornar esse problema com um método que permitia a estimação de equações não lineares com base em hipóteses mais fracas a respeito dos dados.

Além disso, seu método era tão geral que diversas outras metodologias clássicas de estimação passaram a ser vistas como casos especiais da GMM. Isso atraiu a academia porque, uma vez que você tenha a solução geral, as respostas de problemas específicos são obtidas facilmente.

Numa entrevista recente para a revista Times, Hansen resume seu trabalho como “uma forma de estudar sistemas complicados usando informação limitada”. Esse entendimento dos problemas a partir de poucas hipóteses também é apreciado na ciência econômica, pois diminui o trabalho de confrontação daquilo que foi assumido em relação aos dados, e também reduz a possibilidade de contradições.

Ao aplicar a GMM ao CCAPM, Hansen mostrou que este deveria ser rejeitado, pois não explicava a realidade. Posteriormente, esse resultado foi confirmado no paradoxo do prêmio de risco americano: a teoria de precificação com agente representativo racional não consegue explicar a diferença histórica observada entre o retorno das ações e o retorno dos títulos nos EUA. Dado o risco das ações, essa diferença só teria esse nível se os agentes fossem muito mais avessos ao risco que o razoável, segundo a teoria. Então, o CCAPM, tal como fora proposto, deveria ser abandonado.

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Lars Hansen, 61, é professor do departamento de economia da Universidade de Chicago. Uma de suas pesquisas mais relevantes envolveu o desenvolvimento de um método estatístico para testar teorias clássicas de precificação de ativos. Esse trabalho foi publicado em 1982 e possibilitou o teste do modelo de precificação de ativos usando dados de consumo (CCAPM) desenvolvido ao final da década anterior.

Essa discussão motivou uma longa série de estudos empíricos e teóricos sobre precificação de ativos. Parte desses novos modelos tenta refinar o CCAPM, afastando- se da hipótese tradicional do agente racional e usando investidores dotados de vieses comportamentais, tais como aqueles propostos por Shiller.

Hoje, a GMM de Hansen é usada nas mais diversas áreas em economia e em estatística. Em especial, modelos de equilíbrio gerais estocásticos dinâmicos (DSGE), adotados por bancos centrais em todo o mundo para a condução da política monetária, empregam a metodologia econométrica desenvolvida por Hansen na estimação de suas equações.

Hansen trabalha atualmente num grupo de modelagem macrofinanceira (MFM) cujo objetivo é desenvolver modelos macroeconômicos ligados às finanças. Esse grupo cria ferramentas úteis para monitorar riscos de crises de grandes proporções, como a observada em 2008 com o estouro da bolha imobiliária americana.

ROBERT SHILER Shiller ajudou a trazer os conhecimentos de psicologia para a ciência econômica, mostrando como o comportamento humano cria riscos ignorados pela teoria clássica. Desde 1991, ele tem organizado seminários sobre Finanças Comportamentais com Richard Thaler, outro fundador da disciplina. Talvez seja apenas uma coincidência, mas sua esposa, Virginia Shiller, é psicóloga.

Numa entrevista com o economista John Campbell, disse: “Acreditar que cada movimento do mercado tem uma fundamentação racional é um dos maiores erros da história do pensamento econômico”. Nem sempre, porém, Shiller se dedicou à Economia Comportamental. Sua tese de doutorado no MIT, orientada por Modigliani, outro Prêmio Nobel, usa o ferramental econômico já estabelecido. Nela, examina o papel das expectativas racionais na determinação da estrutura a termo da taxa de juros.

O primeiro artigo contrário à hipótese de eficiência de mercado de Fama aparece apenas em 1981. Nele, Shiller sugere um modelo de mercados eficientes, no qual o preço das ações é calculado como o valor descontado dos seus dividendos futuros. Em seguida, mostra como nenhuma expectativa racional dos dividendos futuros e das taxas de desconto nesse modelo pode explicar a volatilidade histórica observada nos dados do mercado. Os investidores não estariam calculando o preço dos ativos da forma como os economistas previam.

Essa ligação entre dividendos e preço dos ativos continuou a ser objeto de pesquisa de Shiller. Três anos após esse estudo inicial, publicou um artigo mostrando que o comportamento do preço das ações é previsível no longo prazo. Segundo seus resultados, as pessoas poderiam obter retornos elevados se comprassem ações quando seus preços estão baixos em relação aos dividendos e vendendo-as caso contrário.

Após a crise de 1987, quando bolsas de valores ao redor do mundo experimentaram perdas maiores que 20% em apenas um mês, Shiller começou a coletar dados junto aos investidores. Ele queria conhecer os fatores que os levaram a negociar durante o crash. Essa pesquisa alimentou a crença de que aquelas decisões foram mais emocionais do que racionais. Uma parte desse questionário continua a ser aplicada continuamente nos EUA desde 1989, formando o Índice de Confiança de Mercado publicado por Yale. Atualmente, outros países, como China e Japão, também monitoram esse mesmo índice em suas economias.

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Robert James Shiller, 67, é professor de finanças e de macroeconomia em Yale e economista fundador da MacroMarkets, uma firma de produtos financeiros destinados à proteção contra diversas fontes de risco. Como uma jornalista constatou em 2009, “intelectualmente, ele não conhece medo, mas, no dia a dia, talvez seja o homem mais avesso ao risco do mundo”. De acordo com seu depoimento, jamais ficou bêbado ou excedeu um limite de velocidade. E tem medo de altura.

Aparentemente, essa pesquisa consolidou em Shiller a necessidade do estudo de bolhas de mercado: o distanciamento consistente dos preços dos ativos daqueles previstos segundo modelos financeiros baseados em fundamentos e em racionalidade. Por isso, em 1991, ele se uniu ao economista Karl Case, que estudava bolhas imobiliárias em Boston, para juntos criarem o primeiro índice nacional de preços de imóveis, hoje conhecido como Standard &Poor’s / Case- Shiller U.S. National Home Price Index. Esse índice ajudaria a prever a crise americana em 2008.

Em 2000, exatamente no mesmo mês em que o mercado atingiu seu ponto máximo antes do estouro da bolha das “pontocom”, Shiller publicou o best-seller Exuberância Irracional. Nesse livro, alertava para a crise iminente. O título foi inspirado num termo cunhado por Alan Greenspan em 1996, ao discursar sobre o crescimento acelerado no período: “Como sabemos quando a exuberância irracional aumentou exageradamente os preços dos ativos, que, depois, tornam-se sujeitos a contrações inesperadas e prolongadas?”

Após a crise, Shiller voltou sua atenção para o mercado imobiliário, retomando o estudo do índice que ajudara a criar. Em 2003, publicou com Case o artigo Is there a bubble in the housing market?. Nesse artigo, eles examinam a existência de uma bolha, relacionando preços dos imóveis a fundamentos como renda das famílias. Também mostram o resultado de um questionário semelhante ao aplicado durante a crise de 1987. Desta vez, Shiller investiga os motivos que levaram o comprador de uma casa a tomar essa decisão.

Esse estudo foi revisto em 2005, na segunda edição do livro Exuberância Irracional. Agora, Shiller alerta para uma queda nos preços das ações e dos imóveis e chega a prever uma recessão global. Ao longo dos anos seguintes, continua a manter sua posição: numa entrevista ao The Wall Street Journal em agosto de 2006, no auge dos preços dos imóveis; e, finalmente, em setembro de 2007, numa coluna publicada exatamente um ano antes da queda do Lehman Brothers, considerada o marco inicial da crise.

Em 2010, após o estouro da bolha, a rede PBS levou ao ar um debate entre os proponentes da teoria dos mercados eficientes (HME) e os defensores da economia comportamental. De um lado, estava Fama; do outro, Shiller. Para este último, a teoria de Fama sobre a eficiência dos mercados, essencialmente, iguala-os a oráculos contemporâneos: “Quando o mercado sobe, temos que dizer: que sabedoria o mercado está revelando-nos hoje?” Dessa forma, ele critica a resistência dos proponentes da HEM a examinar possíveis desvios das previsões dos seus modelos.

Por outro lado, segundo Fama, Shiller, ou Bob, como prefere chamar o amigo, “tem sido consistentemente pessimista em relação aos preços dos ativos”. Esse comentário revela a descrença na real capacidade de Shiller de prever o estouro de bolhas especulativas. Se você sempre prevê queda, eventualmente acertará. Isso ocorre como no adágio: mesmo um relógio quebrado estará certo duas vezes ao dia.

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Shiller, de fato, sempre foi um cético. Quando criança, seu professor reclamou com seus pais porque ele não acreditava em nada que era dito em sala. De fato, esse pesquisador prefere distanciar-se do consenso da academia em seus estudos. De acordo com ele, haveria comportamento de manada também entre os cientistas: um grande grupo analisa os mesmos temas da moda, deixando espaço produtivo para aqueles que ousarem divergir.

No entanto, apesar de ter enorme sucesso nessa divergência, conseguindo prever corretamente as duas maiores crises nos últimos anos, Shiller é humilde diante dos colegas: “Eu apenas disse que elas eram possíveis”. Também admite usar muitas teorias e bases de dados compartilhadas por Fama: “É como ter um amigo com outra religião. Podemos aprender muito com ele mesmo não rezando em sua igreja”.

Shiller acredita na teoria de Fama como uma meia-verdade e, por isso, não se opõe completamente a ela: “Se mercado eficiente significa apenas ser improvável para um investidor amador ficar rico usando informação pública, então, a teoria está correta”. Por sua vez, Fama conclui que “mercados racionais podem existir lado a lado com comportamentos irracionais, desde que você tenha um número suficiente de investidores racionais capazes de levar os preços de volta ao seu lugar”. Ao que parece, a Academia Real de Ciências da Suécia também acredita na conciliação das teorias desses grandes economistas.


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* Marcelo de Sales Pessoa é técnico de planejamento e pesquisa do Ipea desde 2004 e professor de finanças nos mestrados profissionais da FGV, do Ibmec e da UCAM. Concluiu seu doutorado em economia na EPGE-FGV/RJ em 2006 com uma tese sobre precificação de ativos. Trabalhou com modelagem de finanças comportamentais na gestora de recursos Behavior Capital e foi gerente-geral da Superintendência de Estudos e Pesquisas da Anac.

 
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