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Terra rica, povo pobre - Em uma das regiões mais pobres do país, projeto é feito com o cidadão, e não para o cidadão

2008 . Ano 5 . Edição 46 - 08/08/2008

Por Maria José Quadros, de Salvador

Nos mapas turísticos da Bahia, o Baixo Sul é chamado de Costa do Dendê, uma alusão à longa faixa da palmeira que acompanha o belo litoral. Seguindo para o interior, a região mostra muito mais: uma exuberante área de Mata Atlântica, muitos rios e cachoeiras. Uma terra rica, que, apesar disso, abriga uma população, na sua maioria, muito pobre, com pouca qualificação para o trabalho e, por isso mesmo, sem condições de sobreviver com dignidade.

Uma parceria entre o Instituto de Desenvolvimento Sustentável do Baixo Sul da Bahia (Ides), a Associação dos Municípios do Baixo Sul, a Fundação Odebrecht e o próprio governo do estado atraiu entidades locais do terceiro setor, especialmente cooperativas e Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscips), envolvendo, desse modo, a comunidade. Hoje, nove dessas entidades, todas independentes e autônomas, se responsabilizam pela execução dos projetos.

Daí surgiu, há dez anos, o Programa de Desenvolvimento Integrado e Sustentável do Baixo Sul da Bahia (DIS). A idéia que une os envolvidos é a de criar oportunidades para o desenvolvimento auto-sustentável da região e assim preservar o seu imenso patrimônio ambiental. O DIS Baixo Sul tem por princípio o repúdio ao assistencialismo: todo o trabalho é feito com o cidadão, e não para o cidadão.

Prioritariamente, o projeto envolve jovens de 14 a 24 anos, estimulandoos a atuar na família e na sociedade com iniciativa e compromisso. É um desafio e tanto, que está sendo enfrentado mediante a promoção do desenvolvimento simultâneo dos capitais produtivo, através da geração de trabalho e renda; humano, pela educação rural de qualidade; social, pela prática da cidadania; e ambiental, via preservação do meio ambiente.

A atuação do programa se estende aos 11 municípios que compõem a região, onde vivem cerca de 260 mil pessoas. Devido à variedade dos seus ecossistemas, o Baixo Sul abriga cinco Áreas de Proteção Ambiental (APAs) criadas pelo governo baiano com o propósito de evitar a exploração turística desordenada, o desmatamento e o extrativismo, que se constituem grandes ameaças ao equilíbrio ambiental.

ÁREA DO PRATIGI O DIS Baixo Sul dedica atenção especial à APA do Pratigi, uma área de 161,9 mil hectares distribuídos pelos municípios de Igrapiúna, Nilo Peçanha, Ituberá e Piraí do Norte. Nesses municípios se concentra uma das maiores biodiversidades do mundo, em três pólos ecológicos - a Serra de Papuã, berço dos mais importantes rios que cortam a região; o Vale do Rio Juliana, que preserva intactos 63 mil hectares de Mata Atlântica; e o ecopolo Litorâneo, que abriga os estuários dos rios, compondo extensas restingas e manguezais.

Para preservar tamanha riqueza natural em meio à pobreza, era fundamental identificar alternativas econômicas que garantissem o sustento dos mais carentes, levando-os a trocar o desmatamento "formiga" - pelo qual a destruição da mata ocorre de forma lenta, mas constante -, a exploração irracional da mata e a pesca extrativista por práticas mais rentáveis e ambientalmente corretas. Tratava-se de desenvolver o capital produtivo e, para isso, era preciso estimular as vocações econômicas da região.

Surgiram assim as cadeias produtivas - da aqüicultura, da mandioca, do palmito e da piaçava. Sob a orientação de técnicos do programa, os produtores são estimulados a organizar-se em cooperativas, a fim de que tenham acesso à tecnologia e possam aumentar a qualidade e a quantidade da produção, alcançando produtividade cada vez maior.

O segundo passo é agregar valor ao que for produzido, através do beneficiamento e da industrialização, oferecendo ao produtor o acesso a unidades de transformação comprometidas com o programa. Por último, a cooperativa se articula com um parceiro comercial capaz de colocar o seu produto diretamente nas prateleiras dos supermercados, evitando a ação de atravessadores e conseguindo remuneração adequada

BONS EXEMPLOS Antonio Rosário Cruz, de 47 anos, é todo satisfação e esperança desde que aderiu ao projeto da Cooperativa de Marisqueiros, Pescadores e Aqüicultores do Baixo Sul (Coopemar), que lidera a Cadeia Produtiva da Aqüicultura. Natural de Torrinhas, um povoado do município de Cairu, migrou para Salvador, onde começou lavando carros, tornou-se cozinheiro, mas não conseguiu se firmar.

Desempregado, retornou à sua terra natal, onde alugou um barco, sem, contudo, conseguir ganhar o suficiente sequer para pagar o aluguel. Resolveu aderir ao projeto da Coopemar para criar tilápias em tanques-rede instalados no estuário, e agora se considera no caminho certo. Sua renda mensal aumentou de R$ 200 para cerca de R$ 600, com possibilidade de crescer mais.

A Coopemar tem como principal negócio a criação de tilápias adaptadas à água salobra do estuário. São 22 módulos de tilápias e 39 módulos de ostras, mantidos por 60 cooperados, cuja atividade funciona como alternativa à pesca predatória que vinha dizimando os peixes e mariscos dos estuários locais. As tilápias são beneficiadas por uma indústria prestadora de serviços, a P&C, que as transforma em filé.

Com o selo "produto solidário", o peixe é vendido pelas redes de supermercados parceiras da iniciativa - Wal-Mart/BomPreço, Ebal/Cesta do Povo e G. Barbosa. "Agora tenho crédito no comércio e mais condições de criar meus sete filhos. Um deles está matriculado na Casa Familiar do Mar", diz Antonio Cruz, referindo-se à instituição que tem como objetivo formar jovens empresários comprometidos com o desenvolvimento de suas comunidades e da região.

TECNOLOGIA LIMPA Os mesmos parceiros do setor varejista comercializam a farinha de mandioca, o palmito e os produtos de piaçava fabricados pelas outras cadeias produtivas e suas cooperativas. Dentre estas, a maior é a Cooperativa dos Produtores Rurais de Presidente Tancredo Neves (Cooptan), com mais de 500 membros, envolvendo 1,8 mil famílias de nove municípios

Para aprimorar o plantio tradicional, a entidade buscou o apoio da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), que passou a oferecer apoio técnico e a fornecer manivas (talos de mandioca utilizados como mudas) adequadas ao solo da região. O resultado foi a implantação de um Campo de Experimentação de Mandioca em Tancredo Neves que hoje é o maior do país, com mais de 100 variedades pesquisadas.

A produtividade média local, que antes era de 8 toneladas/hectare, alcança atualmente 25 toneladas/hectare. A Cooptan produz diariamente 20 toneladas de farinha, dentro de rigorosos padrões de higiene e com tecnologias limpas. Também começam a engrenar o fabrico de ingredientes de ração e uma fábrica de fécula.

A prática extrativista do palmito está sendo substituída pelo cultivo da pupunha, espécie introduzida no Baixo Sul em 1983, que experimentou grande expansão a partir de 1996 em função da oferta de crédito. Apesar disso, a produtividade mantinha-se baixa, uma das preocupações da Cooperativa dos Produtores de Palmito (Coopalm).

MAIOR RENDIMENTO A entidade vem introduzindo novos tratos culturais, com tecnologia do Equador, e já apresenta rendimento de 7,2 mil plantas/ hectare, frente à média de 5 mil do Baixo Sul. As hastes produzidas pelos 60 cooperados são beneficiadas pela empresa parceira Ambial e envasadas em 13 variedades com a marca Culti- Verde, seguindo depois para os postos de venda dos parceiros varejistas.

"Recebemos pela venda do pote e não pela haste. O retorno é maior", constata o cooperado Francisco dos Santos, de 43 anos, de Piraí do Norte, que reservou três hectares de sua propriedade para o cultivo da pupunha e não se arrepende. Segundo ele, metade de sua renda mensal de R$ 700 a R$ 800 vem do palmito.

Na cadeia de piaçava, além de melhorar as condições de vida dos produtores, a Cooperativa das Produtoras e Produtores Rurais da APA do Pratigi (Cooprapi), que reúne 67 famílias, tem trabalhado para resgatar a identidade quilombola, à qual pertence boa parte dos cooperados. Para isso, são estimuladas manifestações culturais como o canto, a dança, a religiosidade e a culinária, além da formação de jovens na Casa Familiar Agroflorestal.

Entre os que vivem da piaçava, a atividade antes se restringia a descascar e "pentear" a palha, um trabalho pesado e pouco rentável, geralmente realizado por mulheres. Agora, o produto é transformado em vassouras e escovas de qualidade e em cobertura de quiosques com tratamento anticombustível. Ao lado disso, está sendo reintroduzido o artesanato, com base no coco, na palha e na fibra da palmeira.

Há ainda planos para a implantação da produção de carvão ativado, de amido e da extração de óleo para as indústrias farmacêutica e de cosméticos. Outras atividades também são estimuladas, especialmente as hortas comunitárias, a meliponicultura (criação de abelhas sem ferrão) e a produção de defumados.

RAINHA DO ALFACE O capital humano é formado pela educação rural de qualidade , inclusive com a capacitação de educadores. Para isso foram criadas as Casas Familiares Rural, do Mar e Agroflorestal, vinculadas, respectivamente, às cadeias produtivas da mandioca, palmito, aqüicultura e piaçava, e a Casa Jovem. Esta última se dedica à preparação de professores de estabelecimentos públicos de ensino e ao desenvolvimento de uma tecnologia educacional orientada para o trabalho rural.

O projeto Casa Jovem mantém duas escolas que cobrem da Educação Infantil ao ensino de 2º grau, atendendo a crianças, jovens e adultos. Atualmente, mais de 930 estudantes dos municípios de Igrapiúna, Piraí do Norte e Ituberá freqüentam as aulas. No Colégio Estadual Casa Jovem, que abriga os cursos do Ensino Fundamental e do 2º Grau, os alunos dispõem de laboratórios de informática, biblioteca, auditório, cozinha industrial e quadra poliesportiva.

A educação ali ministrada é adaptada à realidade do campo e à promoção da cidadania, para que no futuro os adultos ali formados venham a ser donos de seus próprios destinos. Já as Casas Familiares são voltadas especificamente para a formação de jovens empresários rurais, agroflorestais e aqüícolas. Foram concebidas como parte das cadeias produtivas, funcionando como a outra face de uma mesma moeda.

O ensino segue a chamada pedagogia da alternância, pela qual os alunos mesclam períodos de uma semana em regime integral, com aulas práticas e teóricas, com duas semanas de aplicação de conhecimentos na propriedade familiar, sob a orientação de um monitor. O entendimento é de que o jovem, pelo seu potencial para absorver o novo e transformar a realidade, é um poderoso agente de desenvolvimento, capaz de repassar conhecimentos para a sua família e a comunidade.

Incentivada pelo pai, Geiane Pereira de Macedo, 15 anos, matriculou-se na Casa Familiar Rural de Tancredo Neves. Acostumada a trabalhar com a família na agricultura e animada pelo apoio que recebeu, logo decidiu plantar uma horta com alface, coentro, beterraba e tomate. A ajuda dos orientadores fez com que a produtividade aumentasse rapidamente.

"Não imaginava que seria assim quando comecei. Vendemos toda semana, o ganho chega a R$ 90. Hoje me chamam a Rainha do Alface", diz a adolescente, compenetrada por conseguir produzir bem e ganhar o seu próprio dinheiro. "O mais importante é que continuo estudando. Agora acredito mais no futuro", completa.

MODELO BEM-SUCEDIDO Um dos problemas do Baixo Sul que mais chamaram a atenção desde a implantação do Programa foi a falta de acesso da população pobre à Justiça e à educação para a cidadania. Milhares de pessoas nem "existiam" oficialmente - seu nascimento sequer fora registrado.

O DIS Baixo Sul instalou Balcões de Direitos para viabilizar a emissão de documentação civil básica e para a titulação de terras, além de promover atendimento jurídico e a inclusão social de grupos vulneráveis. Mais de 100 mil atendimentos já foram realizados por esses balcões.

Outra conquista do DIS Baixo Sul foi a estruturação de Conselhos da Área Social , com a formação de 250 conselheiros para o exercício de suas funções. O programa também apóia a formação de associações de moradores, de fóruns municipais de cidadania e a realização de campanhas sociais.

Na área de proteção ambiental, o trabalho se concentra na APA do Pratigi, considerada um dos maiores remanescentes de mata nativa do mundo. Com a participação da comunidade, estão sendo criados corredores de biodiversidade entre os três diferentes pólos ecológicos da APA e realizado um inventário de seus recursos naturais.

MODELO DE GESTÃO O modelo de gestão do DIS Baixo Sul, baseado na integração e sinergia entre o primeiro, segundo e terceiro setores, despertou o interesse do Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais das Nações Unidas, que no ano passado assinou um convênio com a Fundação Odebrecht para promover o intercâmbio de experiências nas áreas de gestão do desenvolvimento e novas modalidades de governança participativa.

Como fruto dessa parceria, está sendo construído o Centro de Estudos e Pesquisas em Governança Participativa, no município de Ibirapitanga. Outro resultado do sucesso da experiência - que anualmente é auditada pela PricewaterhouseCoopers - foi a outorga do Prêmio ODM Brasil 2007. Mas, apesar de bem-sucedido, o DIS Baixo Sul ainda enfrenta dificuldades e grandes desafios.

Um dos maiores é tornar as cadeias produtivas auto-sustentáveis - o que ainda não aconteceu, em grande parte pela falta de infra-estrutura física adequada para escoar os produtos com custos mais baixos. O lado bom é que os técnicos que inicialmente lideravam os projetos já começam a ser substituídos por jovens da própria região, formados nos primeiros anos do programa, que agora assumem a responsabilidade de conscientizar e desenvolver suas comunidades.

 
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