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Aquecimento global à beira do limite crítico de 1,5 °C
Novo método sugere que o aquecimento provocado por atividades humanas atingiu 1,49 °C acima dos níveis pré-industriais em 2023, sendo quase certo que ultrapassará o limite crítico de 1,5 °C em 2024
Publicado em 20/11/2024 - Última modificação em 20/11/2024 às 13h53
O aquecimento global causado pelo ser humano pode estar próximo do limite climático crítico estabelecido pelo Acordo Climático de Paris. Um novo estudo, publicado em novembro na revista científica Nature Geoscience e desenvolvido com base em análises de amostras de núcleos de gelo da Antártica, indica que, em 2023, o aquecimento provocado por atividades humanas atingiu 1,49 graus Celsius (°C) acima dos níveis pré-industriais.
Em 2015, quase todos os países adotaram o Acordo de Paris, um tratado que tem como objetivo incentivar ações para limitar o aumento do aquecimento global — isto é, a elevação da temperatura média global em relação aos níveis da era pré-industrial — a menos de 2 ºC, mantendo-o preferencialmente abaixo de 1,5 ºC.
O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) sugere que o aquecimento induzido pelo ser humano está atualmente próximo de 1,31 °C. No entanto, o IPCC não monitora o aquecimento ano a ano, mas compara médias de temperatura calculadas ao longo de décadas, o que faz com que suas estimativas fiquem defasadas em relação às temperaturas atuais. Além disso, o IPCC utiliza a média de temperatura entre 1850 e 1900 como linha de base “pré-industrial”.
Ocorre que os níveis de dióxido de carbono (CO₂) e as temperaturas já estavam aumentando muito antes de 1850, de modo que a linha de base padrão de 1850-1900 não captura todo o panorama. Isso sugere que as abordagens atuais para estimar as mudanças globais de temperatura — que dependem de modelos climáticos e métodos estatísticos — podem estar subestimando o agravamento do aquecimento induzido pelo ser humano.
Para contornar esse problema, pesquisadores das universidades de Lancaster e Leeds, ambas no Reino Unido, recorreram a dados de núcleos de gelo da Antártica, os quais têm registrado os níveis atmosféricos de CO₂ nos últimos 2 mil anos. Eles usaram esses dados para estabelecer uma linha de base pré-industrial de 13 d.C. a 1700, período em que os níveis atmosféricos desse gás estavam em torno de 280 partes por milhão (ppm) e se mantinham relativamente estáveis.
Eles combinaram esses dados com informações globais de temperatura de 1850 a 2023 para calcular o aumento do aquecimento em relação à linha de base em anos específicos do século XXI. A análise indicou que, em 2023, os níveis de CO₂ haviam aumentado em 142 ppm em relação à linha de base anterior a 1700, indicando que o aquecimento causado pelo homem atingiu 1,49 °C, sendo quase certo que esse valor ultrapassará o limite crítico de 1,5 °C em 2024.
Quando os pesquisadores mudaram a linha de base para o período padrão de 1850–1900, calcularam um aumento de temperatura de 1,31 °C — mesmo valor obtido pelo modelo adotado pelo IPCC. Isso indica que essa linha de base mais recente não capta integralmente o aquecimento pré-industrial que já estava em curso antes de 1850. Outros métodos de cálculo da mudança de temperatura global, como o uso de esponjas marinhas de longa vida, também sugerem que o aquecimento já ultrapassou 1,50 °C.
Os dados são preocupantes. Segundo relatório do IPCC de 2022, um aquecimento de 1,5 ºC exporia cerca de 350 milhões de pessoas à escassez de água devido a secas severas. Se o aquecimento chegasse a 2 ºC, esse número subiria para 420 milhões. Outros dados indicam que, em um cenário de aquecimento de 1,5 ºC, a ocorrência de chuvas torrenciais e furacões poderia aumentar em cerca de 7%; com um acréscimo de 0,5 ºC, esse percentual chegaria a 15%.
Em um cenário mais extremo, de 3 ºC a 4 ºC, países como Itália, Espanha e Grécia passariam a ter clima desértico. Com aquecimento de 5 ºC a 6 ºC, a frequência e a intensidade de furacões aumentariam em 37%, e a cobertura de gelo se reduziria em 75%.