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Empresas submetem à agência sanitária dos Estados Unidos pedido de licença para uso da Crispr no tratamento de duas doenças genéticas

Pedidos das farmacêuticas Vertex Pharmaceuticals e CRISPR Therapeutics baseiam-se em resultados bem-sucedidos em ensaios clínicos; decisão deve sair em até um ano

Rodrigo Andrade

Duas empresas farmacêuticas, a estadunidense Vertex Pharmaceuticals e a suíça CRISPR Therapeutics, submeteram em abril à agência reguladora de medicamentos e alimentos dos Estados Unidos (FDA) um pedido de licença para uso da técnica de edição de genes conhecida pela sigla Crispr-Cas9 no tratamento de pessoas com talassemia-beta e anemia falciforme, doenças genéticas que levam à produção de uma forma alterada de hemoglobina, a proteína que transporta oxigênio no sangue.

Os pedidos baseiam-se em ensaios clínicos bem-sucedidos realizados nos últimos anos, nos quais pacientes com idade entre 12 e 35 anos receberam células de sua própria medula editadas para tratar as doenças. Meses depois, 42 dos 44 indivíduos com talassemia-beta tratados não precisavam mais de transfusões sanguíneas, ao passo que todos os 31 pacientes com anemia falciforme deixaram de ter crises vaso-oclusivas, provocadas pelo bloqueio dos vasos sanguíneos, consequência da agregação das hemácias deformadas — nos 2 anos anteriores ao tratamento, esses pacientes tinham em média 4 crises por ano.

O sistema Crispr-Cas9 é formado por uma molécula de RNA acoplada a uma proteína chamada Cas9, que funciona como uma tesoura molecular. Em laboratório, os pesquisadores desenham uma molécula de RNA capaz de reconhecer apenas o trecho do DNA a ser modificado. O RNA e a proteína Cas9 são então introduzidos na célula e migram até o núcleo, onde está o material genético. Quando o RNA-guia identifica o trecho-alvo do material genético a ser editado, a Cas9 desenrola a molécula de DNA e faz um corte em um ponto específico de cada fita, de modo a invalidar ou corrigir o gene.

No caso dos indivíduos com talassemia-beta e anemia falciforme, os médicos extraíram amostras de seu sangue e delas retiraram células-tronco. Por meio da Crispr-Cas9, introduziram um defeito no gene BLC11A, de modo a desligá-lo. Com isso, reativaram a produção de hemoglobina fetal, sintetizada na vida intrauterina. Os pacientes em seguida receberam um tratamento para “matar” as células da medula óssea que carregavam o gene defeituoso, e receberam injeções das células-tronco modificadas. Estas migraram para a medula óssea e começaram a produzir hemoglobina fetal.

“Esta é uma validação incrível para uma tecnologia que há cerca de 10 anos era apenas um estudo científico”, disse Bastiano Sanna, chefe de terapias celular e genética da Vertex, à revista Nature. A expectativa é a de que a decisão regulatória sobre a liberação da técnica de edição de genes saia entre 8 meses e um ano. As empresas também solicitaram liberação da Crispr-Cas9 na Europa e no Reino Unido.