Por Claudio Roberto Amitrano, Mônica Mora Y Araujo e Claudio Hamilton Matos dos Santos
O resultado registrado pelo produto interno bruto (PIB) no segundo trimestre de 2024, com avanço de 1,4% em relação ao primeiro trimestre de 2024 (isto é, na margem) e de 3,3% em relação ao segundo trimestre de 2023 (isto é, na comparação interanual), se mostrou significativamente maior do que havíamos previsto na última Visão Geral da Conjuntura (Nota de Conjuntura no 27 da Carta de Conjuntura no 63). Os dados surpreenderam também as expectativas do mercado, cuja mediana mostrava um avanço esperado de 0,9% na margem.
Se é verdade que as previsões do Grupo de Conjuntura para o PIB do segundo trimestre – 0,50% de crescimento na margem (contra 1,45% verificado na prática) e 1,30% de crescimento interanual (contra 3,30% verificado na prática) – se mostraram inferiores aos valores efetivamente realizados, também é justo notar que os erros foram relativos ao ritmo de crescimento na margem, não ao padrão de crescimento da economia propriamente dito.
Com efeito, há um conjunto de vetores atuando na economia de forma bastante clara no momento. O primeiro deles é a redução das exportações líquidas, com as importações crescendo mais rapidamente do que as exportações após um 2023 atípico por conta de recordes na produção agropecuária e extrativa mineral. O segundo deles é o crescimento da massa salarial ampliada – puxada por um mercado de trabalho aquecido e por aumentos nos gastos com benefícios de previdência e assistência social pagos pelo governo – com rebatimentos sobre o desempenho do consumo das famílias. O terceiro é o baixo dinamismo na margem da produção agropecuária, após um 2023 de produção recorde e problemas climáticos. O quarto é o dinamismo do consumo das administrações públicas, puxado pelos gastos de estados e, principalmente, municípios respondendo ao aumento da tributação, seja por meio de repasses da União ou pelo crescimento do ICMS e do ISS. Menos pronunciada, ainda, mas igualmente importante – notadamente na margem – é a tendência de recuperação da FBCF em 2024 após desempenho decepcionante no biênio 2022-2023. Embora nenhum dos referidos vetores esteja imune a choques negativos em um trimestre ou outro, tomados em conjunto, eles deixavam claro já em junho, tanto para o Grupo de Conjuntura do Ipea quanto para a maior parte dos analistas, que a economia deveria crescer significativamente em 2024, puxada pela demanda interna, e a despeito das notícias negativas vindas do Sul.
Os dados do segundo trimestre reforçaram essa percepção, mostrando que o ritmo de crescimento da economia era ainda mais rápido do que o que se notava à época. À luz dos referidos dados não faz mais sentido, portanto, supor que a economia crescerá 2,20% em 2024, de modo que o Grupo de Conjuntura do Ipea optou por rever a previsão do crescimento do PIB em 2024 para 3,30%, mesmo com o anúncio pelo Copom do Banco Central do Brasil (BCB) do aumento da taxa Selic para 10,75% no dia 18 de setembro deste ano. Há vários motivos para tanto, mas talvez o principal seja o fato de o que já sabemos sobre o que ocorreu no terceiro trimestre nos levar a crer que a economia continuou crescendo na margem no período, mesmo após dois trimestres bastante vibrantes. Ademais, com as decisões recentes tomadas pelo Federal Reserve e pelo BCB, as incertezas que ainda pairam sobre 2024 foram consideravelmente reduzidas. Embora o novo ciclo de alta da taxa de juros recém-iniciado no Brasil tenha efeitos contracionistas claros, há bons motivos para achar que possa ser curto, servindo principalmente para alinhar as expectativas. Neste cenário, a perspectiva de crescente diferencial de juros praticados no Brasil e nos Estados Unidos acalmaria o mercado de câmbio, aliviando com isso pressões inflacionárias, e a economia desaqueceria para o patamar de 2,40% de crescimento anual ao longo de 2025. Ademais, a piora das condições climáticas e as expectativas de reversão da queda da inflação de serviços verificada ao longo de 2023 e do primeiro semestre deste ano levaram o grupo a aumentar a expectativa de inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) para 2024 para 4,40%, número esse que, no cenário de referência supracitado, cairia para 3,90% em 2025.