Por Mônica Mora
As finanças públicas estaduais caracterizaram-se no biênio 2020-2021 pelos resultados primários surpreendentemente positivos. A superestimação da queda de arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), principal fonte de arrecadação das administrações estaduais, levou as transferências compensatórias da União – instituídas com a finalidade de atenuar os efeitos da pandemia sobre as receitas estaduais – a turbinar a receita em 2020. Já o crescimento acentuado da arrecadação do ICMS contribuiu para um expressivo aumento da receita corrente líquida (RCL) em 2021. No âmbito da despesa, os principais fatores de melhora das contas públicas foram: a suspensão de reajustes ao funcionalismo em 2020-2021; a interrupção do pagamento do serviço de dívidas junto ao governo federal e, eventualmente, junto aos bancos federais em 2020; e a queda dos gastos de custeio (inclusive em educação) em decorrência das recomendações sanitárias de evitar aglomerações em 2020 e 2021. A inflação reforçou a tendência de retração da despesa (ao reduzir os gastos com pessoal em termos reais), enquanto a receita manteve-se estável mesmo quando deflacionada. Essa conjunção de fatores explica o aumento do superávit primário e mesmo a ocorrência de superávit nominal. Há muitos anos os governos estaduais não obtinham resultados tão robustos, portanto o superávit primário consiste em uma situação extraordinária.
O resultado fiscal teve como contrapartida o aumento das disponibilidades de caixa e a queda dos restos a pagar. Paradoxalmente, o aumento do superávit primário ocorreu a despeito de outros indicadores macroeconômicos, como emprego e atividade econômica. Portanto, há uma questão básica. Esse processo é sustentável no tempo, consolidando em 2022 a tendência observada em 2020-2021, ou ele propende a retroceder? Nesta nota, pretende-se identificar idiossincrasias que contribuem ou não para a sustentação desse processo, classificando-as como estruturais e conjunturais. E também riscos que podem levar ao retrocesso. Uma segunda questão consiste nas implicações potenciais do uso desses recursos sobre a dinâmica macroeconômica em 2022 e sobre o crescimento econômico de longo prazo, que em última instância podem ser traduzidos como oportunidades e desafios introduzidos pela atual conjuntura.