Por Marco A.F.H. Cavalcanti, Sergio Fonseca Ferreira, Felipe dos Santos Martins e Wellington Charles L. Nobrega
O quadro fiscal de 2023 foi marcado, no âmbito federal, pela combinação de queda real de arrecadação, após forte crescimento observado em 2021 e 2022, e expressivo aumento real da despesa. Do lado da receita, observou-se, de acordo com nossa estimativa preliminar, queda real de 21,1% para as receitas não administradas pela Receita Federal do Brasil (RFB) e de 1,1% para as administradas, levando a uma queda de 2,9% para a receita total. Pelo lado da despesa, registrou-se crescimento real de 12,9%, ou R$ 247 bilhões, em reais de dezembro de 2023, com destaque para as despesas obrigatórias com controle de fluxo (alta de R$ 105,2 bilhões, ou 45,2%, muito impactadas pelo crescimento das despesas com o programa Bolsa Família, com aumento real de R$ 48,1 bilhões, ou 40,6%), créditos extraordinários (aumento de R$ 46 bilhões, ou 92,3%, sob o impacto da decisão do Supremo Tribunal Federal – STF para pagamento imediato dos passivos com precatórios no valor de R$ 92,4 bilhões), despesas com benefícios previdenciários (aumento de R$ 38,8 bilhões, ou 4,6%) e despesas discricionárias (aumento de R$ 24,4 bilhões, ou 15,2%). Nesse contexto, o resultado primário no ano registrou déficit de R$ 234,3 bilhões, a preços de dezembro de 2023, correspondente a cerca de 2,1% do produto interno bruto (PIB).
Para 2024, a meta de resultado primário para o governo central é igual a zero, podendo o referido resultado ter um intervalo de tolerância de R$ 28,8 bilhões para mais ou para menos (equivalente a 0,25% do PIB estimado para o ano). O atingimento dessa meta é um objetivo desafiador, uma vez que irá requerer uma expansão da arrecadação muito superior ao padrão histórico. O crescimento real da receita líquida implícito no Autógrafo da Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2024 é de 11,3%, muito acima da taxa média de crescimento real observada no período de 1997 a 2023 (4,3%) e, também, muito superior às expectativas de crescimento real do PIB em 2024. Nesse sentido, o governo federal tem buscado viabilizar um amplo pacote de medidas de expansão da arrecadação, com impacto fiscal potencial da ordem de R$ 168 bilhões. O efeito final das medidas propostas é, porém, incerto. As expectativas de mercado apontam a melhora do resultado primário do governo central em relação a 2023, mas ainda indicam déficits substanciais (da ordem de R$ 86 bilhões no Prisma Fiscal/Secretaria de Política Econômica – SPE e de 0,8% do PIB na Pesquisa Focus/Banco Central do Brasil – BCB).
No que se refere ao endividamento público, nota-se que, após aumentar fortemente em razão da pandemia, quando a dívida bruta do governo geral (DBGG) atingiu 86,9% do PIB em dezembro de 2020, a razão dívida-PIB caracterizou-se por tendência de queda, fechando 2022 no patamar de 72,9%. No período mais recente, contudo, a DBGG voltou a crescer, atingindo 73,8% do PIB em novembro de 2023. As expectativas de mercado para a DBGG apontam o aumento da razão dívida-PIB no triênio 2024-2026; de acordo com os relatórios mais recentes, a razão DBGG/PIB deverá passar para cerca de 78% ao final de 2024, entre 80% e 81% em 2025 e chegando em torno de 83% em 2026.