Jessé Souza analisou classes sociais do país em palestra

Jessé Souza analisou classes sociais do país em palestra

Encontro foi na Casa do Saber O Globo, no Rio, e teve como tema 'É verdade que o Brasil não conhece o Brasil?'

O presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Jessé Souza, foi o palestrante da última sexta-feira, 25, na Casa do Saber O Globo, em Ipanema, no Rio de Janeiro. O encontro, às 19h30, teve como tema É verdade que o Brasil não conhece o Brasil?. A fala de Jessé dividiu-se em duas partes: uma que analisou o processo de construção do mito nacional, a partir de Gilberto Freyre, e outra que abordou as classes sociais brasileiras.

O público inscrito pôde assistir à explicação de Jessé sobre por que é errado pensar em divisão de classes no Brasil tendo como foco de análise a renda de cada indivíduo. “O que as pseudoteorias dizem é que o comportamento diferencial depende da quantidade de dinheiro que uma pessoa tem”, disse o presidente do Ipea. “O mais importante na formação das pessoas, porém, é a socialização familiar. Somos criaturas construídas a partir de relações emocionais e afetivas, imitamos quem amamos.”

Segundo Jessé, há quatro grandes classes no Brasil. A dos endinheirados, a classe média, a nova classe trabalhadora e a nova classe trabalhadora precarizada. O presidente do Ipea reiterou que a classe média é privilegiada porque, no capitalismo, o conhecimento é tão importante quanto o dinheiro. “A classe média tem acesso privilegiado ao conhecimento, ao capital cultural. Ela pode comprar o tempo livre dos filhos. Não há mérito individual que não seja construído socialmente. As pessoas são formadas afetiva e emocionalmente por reprodução de um tipo de família que é típico de cada classe”, declarou.

Com base em pesquisas acadêmicas, Jessé afirmou que a classe trabalhadora atual é composta por pessoas que trabalham até 15h por dia, têm dois empregos – geralmente em comércio e serviços – e estudam à noite. Apesar do crescimento da formalização dos empregos nos últimos anos, as atividades da classe trabalhadora são caracterizadas pelo pouco capital cultural.

O presidente do Ipea lembrou que Gilberto Freyre criou uma narrativa que convenceu as pessoas sobre a brasilidade, sobre algo comum entre os brasileiros. O sociólogo fez isso a partir da relação de continuidade entre Portugal e Brasil, em seu esforço para inverter o processo da narrativa racista. Dessa forma, ressalta o aspecto positivo da emotividade, sensibilidade e afetividade do brasileiro como algo favorável ao convívio de diferentes raças e culturas, o que não se deu em países como os Estados Unidos.

Jessé sustenta que a narrativa é transformada em “pseudociência” a partir de Sérgio Buarque de Holanda, que se torna o pai das ciências sociais brasileiras “sobre bases de barro”: ao contrário do que Buarque de Holanda defende, a herança da sociedade brasileira não é portuguesa, pois a instituição central aqui era a escravidão. A obra do famoso sociólogo também incute a ideia de estado patrimonialista. “A partir daí, busca-se legitimar a noção de que o mercado é virtude e que o Estado concentra a corrupção. Mas o mercado, em nenhum momento, soube cuidar dos efeitos deletérios da desigualdade”, concluiu.