Condições de transporte limitam acesso ao ensino público nas 20 maiores cidades brasileiras

Análise do Ipea abrange jovens e crianças de baixa renda que usam transporte público ou vão a pé para as escolas

Mateus Pereira/GOVBA

Um diagnóstico das condições de acesso a pé e via transporte público de crianças e jovens de baixa renda às escolas dos níveis infantil e médio nas 20 maiores cidades brasileiras foi realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O estudo abrange as capitais Belém, Belo Horizonte, Brasília, Campo Grande, Curitiba, Fortaleza; Goiânia, Maceió, Manaus, Natal, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador, São Luís, São Paulo, além de Duque de Caxias, Campinas, Guarulhos e São Gonçalo. O acesso da população mais pobre à educação é fundamental para reduzir as desigualdades e promover a inclusão social, mas as más condições de transporte e acesso às escolas públicas podem funcionar como uma barreira ao exercício desse direito por crianças e jovens no Brasil.

Os pesquisadores analisaram a oferta de vagas na rede de ensino público em 2019 e obtiveram os dados de escolas e número de matrículas em cada uma delas por meio do Censo Escolar, feito pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Foram consideradas somente escolas públicas municipais, estaduais e federais, ativas e com ensino regular e/ou profissionalizante. A metodologia combinou informações de registros administrativos, pesquisas amostrais e dados de imagens de satélite e mapeamento colaborativo, para se calcular em alta resolução espacial os níveis de acessibilidade à educação pela população de mais baixa renda em idade escolar.

A análise estimou quantas são e onde moram as crianças de baixa renda de zero a cinco anos e adolescentes de 15 a 18 anos que estão em situação de risco de exclusão social por apresentarem níveis insuficientes de acesso a escolas. O estudo considerou de baixa renda a população 50% mais pobre de cada cidade, levando-se em conta sua renda domiciliar per capita e o foco nesse público se deu por conta das prioridades do Plano Nacional de Educação (PNE) do Ministério da Educação (MEC) ser a população de baixa renda, a mais dependente da rede pública de educação e de transporte, em função do risco de exclusão social.

Os indicadores de insuficiência de acessibilidade às escolas de educação infantil e ensino fundamental foram calculados para as 20 maiores cidades brasileiras, considerando-se deslocamentos de até 15 ou 30 minutos de caminhada. Por sua vez, os indicadores para o ensino médio foram calculados atentando-se à possibilidade de uso do transporte público, em até 30 minutos de viagem.

Os resultados mostraram que a oferta de educação infantil ainda é bastante deficitária no país, e as barreiras geográficas de acesso às creches agravam esse problema na maioria das grandes cidades do país. Ao se considerar o limite de insuficiência de acessibilidade mais rígido, de 15 minutos de caminhada até a creche mais próxima, mais de 30% das crianças de 14 das 20 cidades estudadas possuem acesso insuficiente. Somente quando adotamos um limite mais flexível, de 30 minutos de caminhada, é que a insuficiência de acessibilidade cai para níveis abaixo de 10% na maioria das cidades.

No caso do ensino médio, os pesquisadores consideraram que muitos adolescentes podem se locomover sozinhos até a escola, inclusive utilizando o transporte público. No entanto, até mesmo se for considerado o uso do transporte público, um número significativo de jovens tem acesso insuficiente a escolas: em sete das nove cidades analisadas em que dados de transporte público estão disponíveis, menos de 40% dos jovens têm acesso a três ou mais escolas de ensino médio em 30 minutos de viagem – as exceções são Fortaleza e São Paulo.

Para o pesquisador do Ipea Rafael Pereira, um dos autores do estudo intitulado “Transporte Urbano e Insuficiência de Acesso a Escolas no Brasil”, produzido em coautoria com Marcus Saraiva, Luiz Pedro Silva e Carlos Kauê Braga, todos pesquisadores associados do instituto, os resultados mostram a necessidade de avanços significativos em direção à universalização do acesso à educação no Brasil. Eles observaram que o acesso geográfico às escolas ainda é uma importante barreira a ser superada. “As análises focaram o ensino infantil e médio, onde foram encontrados os menores níveis de cobertura da rede pública no quantitativo de estudantes matriculados em relação ao tamanho da população em idade escolar”, disse Pereira.

O estudo sinaliza alguns desafios para a implantação de políticas públicas destinadas a facilitar o acesso da população à educação. Os fatores mais relevantes, para melhorar esse acesso nas 20 maiores cidades são os mesmos no ensino infantil e médio: a cobertura espacial da rede de ensino e a concentração da população em áreas mais compactas. Em geral, altos índices de insuficiência de acessibilidade foram encontrados principalmente em áreas mais periféricas da cidade e em áreas urbanas fragmentadas e de baixa densidade populacional. Essas características desafiam a ação do poder público em implantar uma rede de ensino abrangente e linhas de transporte público mais eficientes.

O estudo aponta também a necessidade da implementação conjunta de ações de planejamento urbano e de transportes de forma integrada, com vistas a promover maior adensamento populacional em áreas urbanas consolidadas que já possuem infraestrutura de transportes e escolas instaladas, mas subaproveitadas. A pesquisa faz parte de uma parceria entre o Ipea e a Secretaria Nacional de Mobilidade Urbana (Semob), do Ministério das Cidades.

Acesse a íntegra do estudo

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