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Comércio Exterior - Jogo de interesses

2004. Ano 1 . Edição 4 - 1/11/2004

O acordo entre a União Européia e o Mercosul depende da Rodada de Doha.
 

por Maria Helena Tachinardi, de São Paulo

noticias-28-ImagemNoticiaO ministro das Relações Exteriores Celso Amorim (à dir.) e o grupo que participou da reunião entre Mercosul e União Européia, em Lisboa

O setor da economia brasileira que mais lamentou o desacordo entre a União Européia (UE) e o Mercosul para concluir as negociações comerciais, cujo prazo fatal era o final de outubro, foi o agronegócio. É fácil entender por quê. A UE é o principal mercado importador dos produtos agrícolas brasileiros. Alguns itens que o Brasil exporta para aquele bloco e nos quais é altamente competitivo, como as carnes (bovina e de frangos), o açúcar e a banana, estão sujeitos a quotas estabelecidas em níveis muito baixos. Se o Brasil, terceiro maior exportador agrícola mundial, dissesse sim às pequenas quotas tarifárias oferecidas pela União Européia, estaria aceitando condições que impediriam o crescimento das exportações brasileiras, hoje bem acima dos volumes contingenciados. Além disso, o Mercosul quer que a administração das quotas fique com os exportadores e não com os importadores europeus, conforme sugere a UE.

Nas carnes, os volumes contingenciados são tão pequenos e a demanda é tão grande, que o Brasil exporta volumes acima dos limites da quota pagando as tarifas mais elevadas impostas pela União Européia (a tarifa ad valorem extraquota é de quase 100% para a carne refrigerada desossada e de 176,7% para carne congelada desossada). O Brasil tem direito a uma quota de cinco mil toneladas anuais de carne bovina de alta qualidade na UE e exportou 70 mil toneladas além desse volume. A oferta formal feita pelos europeus para todo o Mercosul, em setembro, momento do impasse nas negociações, foi de 100 mil toneladas, sendo 60 mil na primeira etapa. Uma segunda etapa estaria sujeita aos resultados da Rodada de Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC). Leve-se em consideração que o Brasil produz 7,3 milhões de toneladas de carne bovina e exporta 1,1 milhão de toneladas.

Negociação Em cortes de frango, a quota brasileira atual é de apenas 7,1 mil toneladas anuais, sendo que o Brasil destinou à Europa, em 2003, cerca de 250 mil toneladas. Juntando-se as carnes de peru, os volumes atingiram 300 mil toneladas. Portanto, as vendas do país para os europeus estiveram bem acima do limite estabelecido. O Brasil produz 7,5 milhões de toneladas de carne de frango e exporta para o mundo todo 1,9 milhão de toneladas. Os europeus ofertaram aos quatro sócios do Mercosul uma quota de apenas 75 mil toneladas de carne de aves (frango, peru e outras aves), sendo 45 mil toneladas na primeira etapa.

Qual a relevância, hoje, de um acordo entre o Mercosul e a União Européia, que formaria a maior zona de livre comércio do mundo com 29 países e cerca de 700 milhões de habitantes? Depois de cinco anos de negociação, que teve seus momentos de otimismo, esperança, perda de ambição e impasse, aumentou a importância da conclusão de um acordo birregional de comércio porque se acelerou no mundo a formação de grandes blocos econômicos e se acirrou a disputa por preferências comerciais naqueles mercados. Atualmente, segundo levantamento do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Ícone), são 298 os acordos preferenciais de comércio no mundo, sendo que 241 são intra-regionais (82 na Europa, 59 nas Américas, 51 na Ásia-Pacífico e 22 na África). Os demais são 61 acordos recíprocos inter-regionais e 23 não-recíprocos. Portanto, é inevitável a marcha em direção ao regionalismo e ao bilateralismo.

Negociar, porém, não é fácil. O Brasil tem uma pauta de comércio com produtos agrícolas sensíveis nos grandes mercados, e competitividade em vários setores industriais, como têxteis, aço, calçados, papel e celulose. Não é simples negociar com as potências comerciais, que são protecionistas. O país termina 2004 com duas negociações regionais fracassadas (a da Área de Livre Comércio das Américas - Alca - e a do acordo UE-Mercosul), cujas conseqüências deverão ser sentidas no futuro. Sem as negociações, o ritmo de crescimento das exportações brasileiras poderá não se sustentar no futuro. É por meio das negociações que se consegue redução dos subsídios domésticos, eliminação dos subsídios à exportação, queda de tarifas e redução dos obstáculos de ordem sanitária e fitossanitária. Deve-se levar em conta que o tempo das negociações é normalmente mais longo que o do comércio (exportações e importações). Uma rodada multilateral ou uma rodada regional pode demorar de cinco a dez anos - e outros dez anos poderão ser necessários para a implementação dos acordos.

Na reunião ministerial de Lisboa, em 20 de outubro, ficou definido que as negociações UE-Mercosul continuarão no primeiro trimestre de 2005, já com os novos Comissários europeus - o britânico Peter Mandelson, do Comércio, que substituirá Pascal Lamy, e a dinamarquesa Mariann Fischer Boel, da Agricultura, que ocupará o lugar de Franz Fischler.

Interesse Na opinião da especialista em política agrícola européia e pesquisadora do Grupo de Economia Mundial do Instituto de Estudos Políticos de Paris (Sciences-Po), Géraldine Kutas, o interesse da UE pelo Mercosul não vai diminuir porque mudou a Comissão Européia. "Estou convencida de que a Comissão está buscando apoio de outros blocos nas negociações da OMC e que o Brasil é um ator-chave por seu papel no G-20 (grupo formado por países em desenvolvimento). Um acordo com o Mercosul ajudaria muito nesse sentido. Mas não creio que Mandelson aceitará um acordo light", analisa. Mandelson classificou o Mercosul como prioridade número quatro de sua gestão. Ele estará preocupado com o conteúdo do acordo, mais do que com os prazos, lembra o empresário Ingo Plöger, presidente pelo Mercosul do Mercosur-European Business Fórum (MEBF), órgão empresarial criado em 1999 para facilitar os negócios entre os dois blocos. O presidente do lado europeu é Guy Dolé, presidente da Arcelor. O MEBF tentou até a última hora que os dois blocos se comprometessem com um acordo com as melhores ofertas já feitas até agora, e depois concluíssem as negociações dentro de três a quatro meses.

Propostas Ao mesmo tempo em que o calendário pressionava por uma definição sobre o acordo, o setor privado não queria a assinatura de qualquer documento com propostas irrisórias porque há interesses enormes em jogo. Vários cálculos surgiram nos últimos meses sobre os custos de oportunidades. Um deles, a pedido do Itamaraty, é do pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Honório Kume. Seu estudo revela que ao final de dez anos, se o acordo birregional se concretizasse com as últimas ofertas formais colocadas sobre a mesa (e com a administração das quotas tarifárias nas mãos dos importadores), as exportações brasileiras teriam um incremento de 649 milhões de dólares, somente levando-se em consideração a primeira etapa. O ganho seria de 393 milhões de dólares excluindo-se o etanol, produto cuja exportação para a Europa pode se materializar independente do acordo. "Seria um ganho pequeno", avalia Kume. Entretanto, segundo estimativas do Ministério da Agricultura, estão em jogo na negociação pelo menos 2,5 bilhões de dólares de ganhos adicionais de receita de exportação somente para o agronegócio brasileiro. E o MEBF chegou à conclusão de que com a melhora do acesso a mercados para os cem produtos mais exportados, haveria o ganho anual de 2,5 bilhões de dólares para o Mercosul e igual quantia para a Europa, ao final do período de implementação total do acordo. "Isso representaria um adicional de 1,5% ao PIB do Mercosul", diz Plöger.

Prioridade O interesse do lado europeu prende-se à abertura de mercados no Mercosul para seus produtos industriais, serviços, investimentos e participação nas compras governamentais. Em 2002 a agricultura representou apenas 3% do total exportado pela União Européia para o Mercosul. Os principais produtos embarcados foram vinhos e demais bebidas alcoólicas, malte e azeite de oliva. Em contrapartida, a UE absorve 35% de todas as exportações agrícolas do Mercosul, que representam 48% de tudo o que o bloco vende para os europeus.

A UE tem interesse em liberalizar todas as áreas, enquanto o Mercosul é ofensivo em produtos agrícolas, mas procura defender setores da indústria e de serviços. "Queremos um acordo ambicioso, uma área de livre-comércio segundo a definição da OMC (que envolva 'substancialmente todo o comércio')", destaca Jorge Peydro Aznar, conselheiro para assuntos comerciais da Comissão Européia no Brasil. Os europeus acharam a oferta feita pelo Mercosul inaceitável, segundo Géraldine Kutas. "A última oferta propõe que o volume de comércio de bens industriais para liberalização completa seja de 77%, quando na oferta passada o bloco propunha liberalizar 88%", lembra.

A UE teve um déficit comercial de 6 bilhões de euros com o Brasil em 2003, e um saldo negativo de 10,5 bilhões de euros no intercâmbio com o Mercosul (veja quadro na pág. 52). O comércio entre os dois blocos somou 37,5 bilhões de euros no ano passado. No setor de serviços, a relação é equilibrada: o Brasil exportou 3,1 bilhões de euros para a UE e importou de lá 3,3 bilhões.

Indefinição A prioridade são os serviços financeiros, de telecomunicações e de transporte marítimo. Nesses segmentos, a UE deseja ampliar a sua participação no Mercosul e consolidar as condições de acesso existentes, isto é, evitar que a indefinição do quadro regulatório prejudique as empresas européias no futuro. Elas pedem regras estáveis em relação a operações de prestação de serviços públicos. "Serviços pressupõem economias mais articuladas, e é aí que se evidenciam as disparidades intra-Mercosul. Há países que não têm ainda o marco regulatório e há empresas que enfrentam problemas de seqüência das privatizações por meio da gestão de contratos de concessão dos serviços. No Brasil, o marco avançou em alguns setores e está sendo revisto em outros. Em telecomunicações, o marco de operação de prestação de serviços e de concessão é bem definido porque o processo de privatização foi completo. Já em energia, ainda existe a presença forte do Estado", afirma uma fonte empresarial européia.

O transporte de cabotagem no Mercosul está permitido apenas para as empresas nacionais, lembra Aznar, explicando que um navio europeu não pode deixar mercadorias em Santos, rumar para Buenos Aires, carregar e seguir para a Europa. Em compras governamentais, diz o conselheiro comercial, "não pedimos ao Mercosul que abra áreas que por políticas nacionais não podem ser abertas, mas muitas das compras que ocorrem não têm produção local e é preciso buscar fornecimento no exterior". A Europa pode apresentar ofertas mais baratas e beneficiar o orçamento público. Nos serviços financeiros, comenta a fonte empresarial, não há regras claras de entrada e de crescimento no mercado. "Fica cada vez mais evidente a necessidade de mais Mercosul ou de maior harmonização de políticas entre os quatro sócios", pondera, aludindo a um dos fatores que teria pesado no fracasso da negociação birregional: a fragilidade do bloco do Cone Sul, onde estão expostas as assimetrias entre os quatro sócios.

Precedente O embaixador brasileiro junto à União Européia, José Alfredo Graça Lima, está convencido de que o interesse dos europeus é concluir o acordo com o Mercosul antes de a Rodada de Doha terminar. Isso criaria o precedente das quotas tarifárias na negociação birregional, o que legitimaria a reforma da Política Agrícola Comum (PAC) e ajudaria Bruxelas a negociar proteção para seus produtos sensíveis na OMC. A PAC prevê a eliminação dos subsídios à exportação, o que está sujeito a gesto semelhante por parte dos EUA, e maior disciplina no apoio interno (subsídios aos produtores domésticos). Diante dessa pretendida liberalização, restaria à Europa como mecanismo de proteção adotar quotas para os seus produtos sensíveis. Os mesmos temas do apoio interno e dos subsídios à exportação estão sendo discutidos na Rodada, que também terá de adotar modalidades de acesso a mercados. Uma dessas modalidades, para produtos sensíveis, podem ser as quotas. Portanto, no raciocínio de Graça Lima, os europeus gostariam de fixar quotas mais baixas para produtos agrícolas no acordo com o Mercosul, um conjunto de países dos mais competitivos do planeta nesse setor. Mas se na Rodada ficarem definidos critérios e regras para quotas, interessaria ao Mercosul esperar que isso aconteça porque o bloco teria mais vantagens em matéria de preferências por ser competitivo. Graça Lima vê nos produtos sensíveis agroindustriais do Mercosul uma espécie de trunfo, que deve ser usado da melhor maneira possível na Rodada e no acordo com os europeus.

A importância da Rodada de Doha para o acordo UE-Mercosul cresceu. "A nova Comissão Européia terá de avaliar como complementar os dois processos", diz Aznar. Para Graça Lima, se os dois blocos não forem ambiciosos na negociação birregional, é melhor para o Mercosul negociar acesso a mercados no multilateral, que serviria de patamar para o acerto com os europeus.

 
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