2005. Ano 2 . Edição 12 - 1/7/2005
"O grande equívoco da política econômica do governo não é apenas a perspectiva de curto prazo, mas o fato de não contemplar o desenvolvimento econômico"
Mauro Borges Lemos
Representantes da área econômica do governo insistem que a atual política macroeconômica é a única via para o crescimento sustentado da economia brasileira, mas ela é suficiente apenas para garantir uma expansão do Produto Interno Bruto (PIB) da ordem de 3% para este ano e não superior a 4% em 2006 e 2007. E só será possível atingir essas taxas se não houver nenhum choque externo na economia brasileira, como os que aconteceram após o Plano Real de 1994. O cenário aponta, portanto, para uma reduzida taxa de crescimento sustentado, inferior ao produto potencial. O PIB brasileiro cresceu à taxa média anual de 7%, desde 1945 até o início dos anos 80, e pode ser considerada como o nível de crescimento potencial do país. O aumento do PIB projetado pelas autoridades econômicas para os próximos anos, entre 3% e 4%, pode servir para romper o ciclo de estagnação, mas será insuficiente para reduzir o desemprego e os fatores estruturais crônicos de subdesenvolvimento do país. A adequação da atual política econômica deve ser questionada, pois existe um hiato entre o crescimento potencial da economia, determinado pelos recursos físicos e humanos disponíveis, e a taxa prevista de expansão do PIB. A supressão desse hiato é uma condição necessária para transformar a agenda de crescimento em agenda de desenvolvimento.
O grande equívoco da política econômica do governo não é a perspectiva de curto prazo em detrimento da visão de longo prazo, mas o fato de não contemplar o desenvolvimento econômico que deveria supor, entre outras coisas, a eliminação do desemprego involuntário e a redução da desigualdade. Desde os anos 90 essa questão voltou a ocupar papel de destaque na literatura econômica e o que está em jogo é a opção da política econômica do governo aferrada à visão tradicional, ao "paradigma da convergência", em contraposição ao "paradigma do grande salto".
O paradigma da convergência tem como pressuposto a lei dos retornos marginais decrescentes, segundo a qual os países pobres, com baixa dotação de capital relativa ao trabalho, garantem uma taxa mais elevada de retorno do capital e assim, no longo prazo, seus níveis de renda per capita tendem a convergir para aqueles dos países mais ricos. No entanto, a convergência pode não ocorrer se alguma variável afetar negativamente a renda per capita, a taxa de retorno do capital, por exemplo, a política macroeconômica e a corrupção, bem como a produtividade do trabalho, que sofre a influência da baixa escolaridade.
Tais variáveis possuem sérias limitações para explicar os problemas do desenvolvimento e a maioria delas encontra-se no chamado problema da "galinha e do ovo". Imagine as gangues de Nova York no século XIX, Al Capone na Chicago dos anos 20 do século passado e o sucesso econômico do "capitalismo estatal" da China contemporânea. É fácil perceber que desenvolvimento, população e instituições interagem e não são processos de causa e efeito.
A proposta da política econômica do governo é "arrumar a casa" para depois trilhar o caminho do desenvolvimento, seguindo a cartilha do paradigma da convergência. O suposto falacioso nessa teoria é que é possível eliminar os obstáculos do crescimento sem mirar diretamente nos desafios do desenvolvimento, desconhecendo que o problema do subdesenvolvimento decorre de uma ampla falha de coordenação e, portanto, de expectativas. Não existe determinismo para o funcionamento do mercado e a própria estratégia de desenvolvimento é o melhor meio de perseguir o crescimento sustentado, que exige um esforço concentrado de investimentos complementares, dentro de uma política de "um grande salto à frente". Para isso, a política econômica deve mudar na direção de uma estratégia do desenvolvimento.
Mauro Borges Lemos é professor da Universidade Federal de Minas Gerais e Secretário Executivo da Associação Nacional de Centros de Pós-Graduação em Economia (Anpec)
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