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Freio na violência contra a mulher

2015 . Ano 12 . Edição 83 - 19/06/2015

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Estudo do Ipea mostra que a Lei Maria da Penha reduziu em 10% o número de homicídios de mulheres no Brasil

Washington Sidney


Quando iniciou um relacionamento com o motorista Alberto Morgado, 38 anos, a manicure Dione Gusmão, 32, assinou, na realidade, sua sentença de morte. Recém-separada do ex-marido, ela pensou em recomeçar a vida ao lado do namorado. Mas o sonho virou pesadelo. Há dois anos, durante um almoço na casa da mãe dele, em Ceilândia, cidade-satélite de Brasília, Dione viu no celular do companheiro uma mensagem amorosa de outra mulher e o inquiriu sobre o fato. Irritado, Alberto, após uma forte discussão, deu várias facadas na manicure na frente da mãe.

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Thiago Rodrigues/Ipea

A morte de Dione impressionou a delegada titular da Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam) de Brasília, Ana Cristina Melo Santiago, pelo ineditismo. Isso porque, ao contrário do que ocorre comumente nos casos de homicídios domésticos, os quais obedecem a um ciclo de violências – verbais e morais, seguidas das físicas, até o assassinato –, o relacionamento do casal era novo. “Na época do crime, Dione e Alberto estavam juntos havia apenas quatro meses e não havia nenhum registro de violência ou de agressões do namorado contra ela”, lembra a delegada. Dione entrou para uma estatística cujos números assustam: a de mortes de mulheres em decorrência de violência de gênero no Brasil. Segundo dados do Ministério da Saúde, a cada ano cerca de 4.600 mulheres são assassinadas no país. Um número que poderia ser ainda maior se não existisse a Lei 11.340, conhecida popularmente como Lei Maria da Penha.

4.600
mulheres são

assassinadas, por ano, em
decorrência de violência de gênero

É o que indica um estudo lançado no dia 4 de março pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), durante seminário realizado na sede do órgão, em Brasília, quando foram debatidos os efeitos dessa lei, em vigor no país desde 2006. O estudo, intitulado Avaliando a efetividade da Lei Maria da Penha, foi feito pelo técnico de Planejamento e Pesquisa Daniel Cerqueira e pelos pesquisadores Mariana Vieira Martins Matos, Ana Paula Antunes Martins e Jony Pinto Junior.

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Thyago Arruda

O coordenador do trabalho, Daniel Cerqueira, diretor de Estudos e Políticas do Estado, das Instituições e da Democracia (Diest) do Instituto, observa que esse dado representa apenas a ponta do iceberg da violência contra as mulheres no país. “O que a gente conhece é menos de cinco por cento acima da linha d´água, que são os dados sobre homicídios. Então, só para se ter ideia do tamanho desse iceberg, a PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, do IBGE) de 2009 apontou que 1,2 milhão de mulheres sofrem agressões a cada ano no Brasil. Ou seja, além dos homicídios evitados a partir de 2006, a lei ainda ajudou a evitar milhares de casos de violência doméstica nesse período”, afirma Cerqueira.

MÉTODO

Os autores do estudo utilizaram o método de diferenças em diferenças, pelo qual os dados de homicídios de mulheres dentro de suas casas, obtidos por meio do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) do Sistema Único de Saúde (SUS), foram confrontados com os números de assassinatos de homens, chegando-se ao percentual de 10% de redução das mortes de mulheres desde a implantação da lei, em setembro de 2006.

Para medir a efetividade da lei, os autores usaram cenários contrafactuais. Ou seja, o que teria acontecido se o programa não existisse. Partiu-se do pressuposto de que a violência doméstica ocorre em ciclos, quando se dá um acirramento no grau de agressividade envolvida e que quase sempre redunda (muitas vezes de forma inesperada) na morte do cônjuge. “Por isso, seria razoável imaginar que a lei, ao fazer cessar ciclos de agressões intrafamiliares, gere também um efeito de segunda ordem para fazer diminuir os homicídios ocasionados por questões domésticas e de gênero”, defendem os autores do estudo.

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Dollar Photo Club - Dos atendimentos registrados no ano passado,
80% das vítimas tinham filhos, sendo que 64% deles presenciavam
a violência e 18% eram vítimas juntamente com as mães

Os canais que levaram os pesquisadores à efetividade da lei são basicamente três: o primeiro é que, antes da legislação, quando havia um caso de violência doméstica, nas raras vezes em que isso chegava ao conhecimento da Justiça, o caso era enquadrado na Lei nº 9.099, de crimes de baixo potencial ofensivo. E o assassino, nas raras vezes em que era condenado, sofria pena alternativa, como o pagamento de cestas básicas. Com a lei, aumentou o custo da pena, porque o criminoso vai para a prisão.

O segundo ponto é que a lei aumentou a proteção da mulher. Antes, quando a mulher era agredida, quais eram as condições que ela tinha para dar queixa, sabendo que nada ia acontecer e que ia voltar para casa e apanhar de novo? “Com a lei, o cônjuge é imediatamente retirado do ambiente familiar e a mulher passa a contar com medidas protetivas. Assim, a lei facilita a chance de a mulher dar queixa”, observa Cerqueira. Em terceiro lugar, a lei criou mecanismos jurisdicionais que favoreceram a celeridade e a resolutividade dos processos.

Os autores do estudo ressaltam que a efetividade não se deu de maneira uniforme no país, por causa dos “diferentes graus de institucionalização dos serviços protetivos às vítimas de violência doméstica”. Nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e nas cidades de interior, onde as políticas públicas para as mulheres e as medidas protetivas não estão consolidadas, a lei se mostrou menos efetiva. No estudo também foram consideradas variáveis como a prevalência de armas de fogo e o consumo de bebidas alcoólicas nas microrregiões brasileiras.

ESPECIFICIDADES

A secretária de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República, Aparecida Gonçalves, admitiu que a Lei Maria da Penha não vem tendo a mesma efetividade nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e nos municípios menores e mais distantes. Ela atribui o fato às especificidades de cada região. “Deve-se levar em conta os problemas geográficos que dificultam o acesso das pessoas aos serviços, principalmente no Norte do país”. Ela informou que está prevista a implantação de dez Centros de Atendimento às Mulheres nas regiões de fronteira, três dos quais já estão em pleno funcionamento: os de Pacaraima (RR), Oiapoque (AP) e Foz de Iguaçu (PR). Os demais estão em fase de licitação para os projetos executivos.

“Também temos a previsão de um centro em Brasiléia (AC). Além disso, cada estado do país recebeu dois ônibus que oferecem os serviços de informação e apoio às mulheres em situação de violência. Desde janeiro de 2014, as mulheres da mata, do campo e praias de água doce do Marajó, no Pará, são atendidas pelo programa Mulher, Viver sem Violência, por meio da agência barco da Caixa. O percurso abarca oito dos 16 municípios da Ilha: Bagre, Curralinho, Melgaço, Muaná, Ponta de Pedras, Portel, São Sebastião da Boa Vista e Soure. O programa articula ações para facilitar o acesso das mulheres em situação de violência a informações sobre direitos, Lei Maria da Penha e
campanhas preventivas”, diz.

O programa Mulher, Viver sem Violência está estruturado em seis ações: implementação da Casa da Mulher Brasileira; ampliação da Central de Atendimento à Mulher (Ligue 180); organização e humanização do atendimento às vítimas de violência sexual; implantação e manutenção dos Centros de Atendimento às Mulheres nas regiões de fronteira seca; campanhas continuadas de conscientização e as unidades móveis de atendimento a mulheres em situação de violência no campo e na floresta.

A primeira Casa da Mulher Brasileira foi inaugurada no dia 3 de fevereiro em Campo Grande (MS) e em um mês de funcionamento atendeu 582 mulheres. Brasília seria a cidade que teria a próxima Casa a ser inaugurada. Na Casa de Campo Grande, além da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher e do setor psicossocial, também há o atendimento 24 horas: alojamento de passagem, Central de Transporte e Patrulha Maria da Penha. A Secretaria da Mulher da Presidência da República informou que, em dez anos, o número de serviços especializados de atendimento à mulher teve aumento de 309%. O total de atividades especializadas cresceu de 332 para 1.027.


OS NÚMEROS DO Ligue 180

A Central de Atendimento à Mulher, criada em 2005, tornou-se, nesses últimos dez anos, um importante instrumento de denúncia de agressões físicas, morais e psicológicas, estupros, assédios, exploração sexual e cárcere privado, entre outros abusos praticados contra as mulheres. Conhecido também como Ligue 180, o serviço ganhou espaço em outros países, como Espanha, Itália, Portugal, França, Estados Unidos, Inglaterra, Noruega, Guiana Francesa, Argentina, Uruguai, Paraguai, Holanda, Suíça, Venezuela, Bélgica e Luxemburgo.

No Brasil, o Distrito Federal foi a unidade da Federação em que o serviço foi mais utilizado proporcionalmente. A taxa de registro pela população feminina por grupo de 100 mil mulheres no DF foi de 158,48 mulheres. Em seguida, Mato Grosso do Sul (91,61%), Rio de Janeiro (91,18%), Espírito Santo (85,59%) e Amapá (82,93%). Em 2014, 0 180 atendeu às 27 unidades da Federação e a 3.853 dos 5.570 municípios brasileiros (69,1%).

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Entrevista

Maria da Penha

“As mulheres dos pequenos e médios municípios precisam ter garantias”

Desenvolvimento – Com a visibilidade que a Lei Maria da Penha ganhou, as mulheres passaram a denunciar seus agressores em grande quantidade. A que a senhora atribui o sucesso da lei?

Maria da Penha – A lei veio exatamente para atingir um ponto crucial na vida das mulheres. Veio dizer que as mulheres têm o direito de viver sem violência. E que, se querem romper um relacionamento que as maltrata, elas têm agora uma lei que lhes favorece para isso. A principal finalidade da lei não é punir os homens, mas punir os homens agressores. Aí entra naquele esquema: nas cidades onde a lei saiu do papel, as mulheres tomam coragem e denunciam. Mas nós temos ainda muitas mulheres envergonhadas e sem saber o que fazer da sua vida porque não sabem onde denunciar, não têm conhecimento de que podem ligar para o número 180 e pedir uma orientação de outra cidade mais próxima da sua onde exista essa política pública de atendimento ao funcionamento da lei. Agora, a imprensa é muito importante na divulgação da lei. Tem uma pesquisa, que foi feita, se não me engano, pela SPM (Secretaria de Políticas para as Mulheres) ou foi pelo Instituto Patrícia Galvão, que diz que 98% da população brasileira têm conhecimento de que existe a Lei Maria da Penha para as mulheres. Muitas não sabem como a lei funciona, mas sabem que essa lei existe.

Desenvolvimento – Mas houve mudança de comportamento e de cultura a partir da lei?

Maria da Penha – No início havia muita resistência e nem sempre o Estado cumpria seu papel de proteger a mulher ou de punir o homem agressor quando este era preso em flagrante. Hoje em dia já há uma conscientização maior. O Judiciário e várias outras instituições já têm seus núcleos de gênero, que estão trabalhando em conjunto. A criação da Patrulha Maria da Penha, por exemplo. São gestos que fortalecem a lei. Cada estado, cada instituição está procurando fazer o melhor para que a lei seja aplicada com segurança.

Desenvolvimento – O Ipea lançou um estudo mostrando que a Lei Maria da Penha ajudou a reduzir em 10% o número de homicídios. Como a senhora vê isso?

Maria da Penha – Vejo isso com muita alegria. É muito importante. Mas veja: se a lei conseguiu levar a uma diminuição dos homicídios, eu digo que essa redução se deu nos municípios em que ela saiu do papel. A maioria dos municípios brasileiros não tem a lei trabalhada porque não tem as políticas públicas.

Desenvolvimento – É verdade. O estudo também mostra isso: que a efetividade da lei não se deu no Brasil de forma homogênea.

Maria da Penha – Então meu raciocínio está certo.

Desenvolvimento – O que poderia ser feito para melhorar a lei e torná-la mais efetiva?

Maria da Penha – O que falta é os gestores públicos se sensibilizarem e fazerem com que as políticas públicas sejam criadas para que as mulheres dos pequenos e médios municípios tenham essas garantias. Não precisa ser exatamente em cada município. Que seja feito em municípios a partir de 70 mil habitantes ou de 100 mil. E que seja feito um trabalho em que os pequenos municípios vizinhos menores criem essas políticas públicas para dar chance à mulher de um município próximo recorrer a outro. Quer dizer, num primeiro momento, tem que se fazer alguma coisa. Num segundo momento, cada município individualiza sua política pública. As mulheres desses locais precisam de espaços que as atendam e que as encorajem a denunciar e a tomar uma decisão de sair daquela situação de violência doméstica.

Desenvolvimento – O que a senhora acha da Lei do Feminicídio, sancionada pela presidente Dilma Rousseff? Acha que a tipificação do crime e o aumento das penas vão ajudar a diminuir os homicídios de mulheres?

Maria da Penha – Acho que, se tivesse chegado algum tempo atrás, não faria muita diferença. Mas hoje ela está acoplada ao conhecimento que se tem sobre a Lei Maria da Penha. Então, é um passo a mais para que a lei atinja seu objetivo de cuidar e proteger as mulheres em situação de violência e evitar esses assassinatos. E no caso de acontecer, é importante que esse acontecimento vá para uma estatística, porque hoje, quando se fala em homicídios, estão inclusos homicídios de homens e mulheres. Mas está tipificado que aquela mulher morreu vítima da violência doméstica. E no momento em que a Lei do Feminicídio foi aprovada, essa estatística vai para o local certo. Porque aquela mulher foi assassinada por uma questão de gênero.

 
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