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Nossa mente brilhante

2014 . Ano 10 . Edição 80 - 23/06/2014

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Foto: Marco Antonio

Respeitada por economistas de todo o mundo por suas formulações sobre Teoria dos Jogos, a matemática brasileira Marilda Sotomayor reúne uma constelação de laureados com o Prêmio Nobel nas celebrações por seus 70 anos

Myrian Luiz Alves, do Rio de Janeiro

Desde que os gregos clássicos conceituaram as chamadas Artes Liberais, matemática e filosofia caminham juntas. A professora Marilda Antônia de Oliveira Sotomayor, por exemplo, é uma clássica, a mais conceituada representante brasileira de uma corrente econômica fundamentada na interseção da matemática com a filosofia – a Teoria dos Jogos. Mais conhecida como área “matematizada” da economia, a Teoria dos Jogos, ou ciência da estratégia, é, em suma, o estudo da conduta humana em sociedade.

Entre nós, brasileiros, a Teoria dos Jogos pode ser observada no célebre questionamento do finado jogador de futebol Mané Garrincha ao técnico da Seleção, Vicente Feola, na Copa de 1958, durante a preparação para o jogo Brasil x União Soviética. Após ouvir a idealização dos lances do meio-campo à linha do gol, e meio desinteressado daquela futurologia, Mané soltou: “Seu Feola, mas o senhor já combinou com os russos?” O craque alertava, com sua ingênua sabedoria, que as nossas jogadas também dependem das alheias; de outros indivíduos ou de outras equipes.

Dentro da academia, a Teoria dos Jogos vem ganhando popularidade nos últimos 20 anos, principalmente depois que o matemático norte-americano John Nash ganhou o Prêmio Nobel de Economia de 1994. Nash foi retratado no filme Uma Mente Brilhante, de 2001, dirigido por Ron Howard e estrelado por Russell Crowe. O filme, que ajudou a popularizar ainda mais a teoria e levou quatro das oito indicações ao Oscar, entre elas a de melhor filme, mostra a genialidade de Nash. Aos 21 anos, ele formulou um teorema e era festejado no meio acadêmico. Mas, aos 30 anos, estava debilitado pela esquizofrenia.

CIRANDA NO OLIMPO

Marilda Sotomayor pesquisa a Teoria dos Jogos desde 1970. Fundadora da Game Theory Society, participou ativamente da evolução teórica do tema quando trabalhava com David Gale, falecido em 2008. Seu mestre Gale, por sua vez, tinha um parceiro de pesquisas, Lloyd Shapley, que dividiu o Nobel de Economia de 2012 com Alvin Roth, outro teórico dos jogos. Embora já falecido, Gale teria levado também seu crédito na premiação da Academia Real Sueca de Ciências.

E como numa ciranda dançada no Olimpo, além de discípula de Gale, Marilda é parceira de Alvin Roth, professor em Harvard, com quem dividiu a autoria do livro Two-Sided Matching: A Study in Game-Theoretic Model Lingand Analysis, de 1990, estudo que aproximou os economistas da área do matching, levando exemplos a serem aplicados em outros países, mas ainda raramente usados no Brasil. Por essa obra, Roth e Marilda receberam o Lanchester Prize de 1990, um dos mais importantes prêmios de Pesquisa Operacional, oferecido pela Operation Research Society of America. Mais tarde foram homenageados com o congresso Roth and Sotomayor: Twenty years after, da Universidade Duke, na Carolina do Norte, nos Estados Unidos, alusivo aos 20 anos de publicação do livro.

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Thiago Cavalcante (Ipea)

Uma teoria de 1001 utilidades

Dos mercados ao amor, da política aos transplantes de órgãos, entenda como aplicar os princípios do matching

Surgida na década de 1930, a teoria ganhou força na macroeconomia com o estudo The Theory of Games and Economic Behavior, de John von Neumann e Oskar Morgensterna, em 1944, mostrando o encontro de estratégias racionais em situações nas quais o resultado não depende apenas da estratégia de um agente e das condições de mercado, como também daquelas escolhidas por outros agentes com estratégias diferentes ou objetivos iguais.

Após quase duas décadas, os pesquisadores norte-americanos David Gale (com quem Marilda Sotomayor trabalhou) e Loyd Shapley apresentaram, em artigo da revista American Mathematical Monthly, de janeiro de 1962, um algoritmo conhecido na literatura como top-trading cycles para resolver problemas de emparelhamento estável (Stable Matching Problem), aplicando-o em variados processos de combinação e parcerias. O quadro mostrava o caminho matemático para um casamento estável, escolher colegas na divisão de um quarto ou, entre outras situações, a de selecionar estagiários. Na macroeconomia, a teoria de matching é uma forma de modelar mercados, calculando melhor a distribuição de recursos disponíveis.

Em 1990, o livro Two-Sided Matching: A Study in Game-Theoretic Model Lingand Analysis, de Marilda Sotomayore Alvin Roth, trouxe uma compilação de todos os estudos até então apresentados, atraindo a atenção dos economistas. Alguns anos após a publicação dessa obra pela Cambridge University, enquanto Marilda Sotomayor continuava na vanguarda dos estudos teóricos, o norte-americano Alvin Roth liderou as aplicações de matching na organização dos mercados de escolha de escolas públicas de primeiro grau, em Boston e em Nova York, e na distribuição de médicos em hospitais de diversos lugares de seu país e do Reino Unido. Essa experiência, reforçada com a aplicação de seus próprios algoritmos na reformulação do sistema de transplante de rins, levou-o ao Prêmio Nobel de Economia de 2012, laureado em parceria com Loyd Shapley.

Naquele ano, por ocasião de sua palestra na Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP “Matching vai a Estocolmo”, baseada em sua obra com Roth, Marilda Sotomayor afirmava que, “informalmente, um matching é um pareamento entre os jogadores que não viola as regras do mercado”. E que “o Prêmio Nobel outorgado a Roth e Shapley representa uma vitória de todos os autores que contribuíram com seus trabalhos para o desenvolvimento dessa teoria”.

Atualmente utilizada nas mais variadas áreas, da informática à biologia, é bem apreciada na política, geralmente aplicada no processo de escolha de alianças eleitorais, no debate democrático e nos sistemas de votação. Como alguns entendem a Economia como o estudo dos recursos escassos, segundo o professor Samy Dana, da Fundação Getulio Vargas (FGV) e da USP, ao otimizar a distribuição desses recursos, a Teoria dos Jogos eleva a qualidade de vida de uma comunidade ou da totalidade de uma população sem prejudicar outrem.

Segundo Dana, a teoria pode ser aplicada até mesmo na paquera de rua. Para ele, uma pessoa nunca deve deixar de flertar com alguém só por achar que não tem chances. “Ninguém nunca deve ficar com uma pessoa, sendo que há outra que ela prefira, flertando com ela”, explica. Seguindo a dica do professor, o passo para o sucesso é aplicar a “fórmula do amor”– o bom e velho algoritmo Gale-Shapley.

Seguindo os passos do Nobel Alvin Roth, o economista Alexandre Marinho, técnico em Planejamento e Pesquisa do Ipea e criador da cadeira de Economia da Saúde da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), iniciou estudos sobre o sistema de transplantes de rins no Brasil. Até a publicação do trabalho, em 2010, ninguém sabia quantos transplantes renais eram realizados no Brasil. O cruzamento das informações disponíveis no levantamento concluiu que há mais homens transplantados que mulheres, e mais brancos que negros.

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Ilustração: Real Academia Sueca de Ciências

E embora o Brasil possua o maior sistema público de transplantes do mundo, atrás apenas da China, ainda não havia dados que levassem o pesquisador a alguma especificidade sobre isso, como quais problemas atingiriam uns mais que outros; quanto tempo uma pessoa vive após o transplante; quais remédios são destinados ao tratamento ou, ainda, como facilitar o acesso a eles, entre outras questões. “Com os dados, pode-se aperfeiçoar o sistema”, explica o pesquisador do Ipea. “Os dados têm de ser públicos para que a sociedade possa tomar as providências”. E conclui: “O matching pode ser uma possibilidade, apesar de ainda não ser predominante como método de abordagem. Meu esforço é para melhorar o sistema. E para evoluir é preciso melhorar a transparência”.

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HOMENAGEM

Nascida em 1944, hoje professora aposentada da Universidade Federal do Rio de Janeiro e da Faculdade de Economia Aplicada da Universidade de São Paulo (USP), Marilda é das raras especialistas no Brasil em mercados de matching, uma subárea da Teoria dos Jogos. Mais que isso, está inserida no primeiro time internacional dos formuladores dessa arte multidisciplinar.

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Tanto que foi homenageada por seu aniversário de 70 anos em dois eventos no Brasil: o International Workshop on Game Theory and Economic Applications of the Game Theory Society (IWGTS 2014), ocorrido entre 24 e 31 de julho, em São Paulo, e o evento satélite promovido pela FGV e pelo Ipea, em 1º de agosto, no Rio de Janeiro.

O Nobel John Nash confirmou presença. Aos 86 anos, já não demonstra a esquizofrenia retratada no filme Uma Mente Brilhante. Foram 29 convidados para ministrar palestras, conferências e minicursos. O workshop contou com 350 inscritos, número bastante expressivo comparado ao período em que Marilda iniciou sua trajetória no mundo do matching, quando “havia apenas meia-dúzia de interessados na teoria”, como lembra a homenageada.

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“Trata-se de uma demonstração do prestígio acadêmico internacional de Marilda”, destaca o economista Danilo Santa Cruz Coelho, técnico de Planejamento e Pesquisa do Ipea e membro do Comitê Organizador do evento. O professor Humberto Moreira, da FGV e também membro do Comitê Organizador, acrescenta:

“Marilda tem ajudado muito na promoção da Teoria de Jogos, ferramenta importante não só para várias áreas aplicadas em Economia, como, também, em Sociologia, Ciências Políticas e Biologia”. Marilda Sotomayor conversou com a revista Desafios do Desenvolvimento no fim de junho. Ainda se ressentia de uma pneumonia, mas estava mesmo preocupada com a organização do workshop sobre Teoria dos Jogos, quando seria homenageada. Envolvida 12 horas por dia nos preparativos do grande evento, incluindo traduzir e responder centenas de e-mails, ou escolher salgadinhos e vinho para a noite de abertura e cerimonial aos mais renomados pesquisadores do país e do exterior, Marilda comemorava a parte a ser a mais gratificante do encontro: a presença das pessoas, o carinho dos colegas.

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Andre Telles (FGV)

RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS

Já aos nove anos, estudante da quarta série, ganhou a “melhor nota de matemática” das escolas públicas do distrito de Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, na época capital da República. O critério usado era a soma das notas das provas mensais com as de julho e do fim do ano. Recebeu o prêmio e o dinheiro estava dentro de um envelope. Ao chegar em casa, entregou-o à mãe, parceira dos exercícios diários, dizendo: “A senhora guarda para quando eu ficar velhinha; é para os meus netos”. Não foi atendida. Hoje, Marilda acredita que o dinheiro foi gasto em coisas domésticas. O desejo de “resolver problemas” sempre a acompanharia.

Graduada em Matemática pela UFRJ, em 1967, mestre em Matemática pelo Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA), em 1972, Marilda Sotomayor é doutora em Matemática pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) e pelo Instituto de Matemática Pura e Aplicada. Editora associada da revista International Journal of Game Theory, ela acumula, entre outros títulos, pós-doutorados no Institut dês Hautes Études Scientifiques (França), na University of Pittsburgh (EUA) e na University of California – Berkeley (EUA). Além da livre docência em Economia na FEA/USP.

Marilda costuma dizer que, entre as muitas premiações que recebeu, a mais prestigiosa foi a de ter sido eleita fellow da Econometric Society, em 2003. A entidade contribui desde 1933 para o avanço da teoria econômica com a estatística e a matemática. Um fellow é “um igual” ou “um camarada”. O termo, mais corrente no ambiente acadêmico, é atribuído à parte de um grupo de pessoas esclarecidas que trabalham em conjunto como pares na busca do conhecimento. Com seu mestre David Gale, aprendeu a buscar descrever com tranquilidade seus argumentos e demonstrações diante dos alunos. “Era uma arte”, lembra. Com ele, “embora com exposições mais longas, a teoria e seus exemplos ficaram mais fáceis de serem compreendidos”.

 
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