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Os antropólogos e o desenvolvimento

2012 . Ano 9 . Edição 72 - 15/06/2012

Foto: Sidney Murrieta

Representantes da Associação Brasileira de Antropologia (ABA) debatem o papel da profissão na sede do Ipea, em Brasília

Qual o papel da antropologia diante do atual esforço nacional para o desenvolvimento? Para refletir sobre essa questão, entrevistamos sete importantes intelectuais vinculados à Associação Brasileira de Antropologia. A iniciativa faz parte de um esforço do Ipea para abrir seu leque de pesquisas e atividades, visando formular um conceito de desenvolvimento que contemple a proteção da população, o reconhecimento social e cultural de várias comunidades tradicionais e a preservação ambiental.

A Associação Brasileira de Antropologia (ABA) dirigiu, durante a II Conferência do Desenvolvimento (Code), em setembro de 2011, o eixo temático “Desenvolvimento: Desafios e perspectivas antropológicas”. A colaboração da entidade com o Ipea faz parte de um esforço mútuo para que o Instituto se abra a temas e disciplinas que não integravam seu ideário inicial, voltado à economia.

Em fevereiro último, uma reunião com a ABA foi realizada em Brasília, para detalhar a continuidade da parceria. Ao término do encontro, realizou-se uma mesa redonda, mediada por Aristides Monteiro Neto, assessor de Planejamento e Articulação Institucional do Ipea. Na pauta, o engajamento da categoria em projetos de desenvolvimento. Participaram do evento a presidenta da entidade, Bela Feldman-Bianco (Unicamp), a diretora Andrea Zhouri (UFMG) e os antropólogos Alfredo Wagner Martins Pinto (UFAM), Cornelia Eckert (UFRGS), José Sérgio Leite Lopes (UFRJ), João Pacheco (UFRJ) e Gustavo Lins Ribeiro (UnB).

Foto: Sidney Murrieta

“Não fosse a presença de uma
antropologia tão forte quanto
a brasileira, os problemas
decorrentes do avanço
econômico sobre populações
tradicionais ou minorias
étnicas seriam muito maiores
e essas questões manchariam o
nome do Brasil mundo afora.”




Gustavo Lins Ribeiro,
antropólogo

A ABA, fundada em 1955, é a mais antiga das associações científicas existentes no país, na área das ciências sociais. Ela ocupa, segundo sua página na internet, “um papel de destaque na condução de questões relacionadas às políticas públicas referentes à educação, à ação social e à defesa dos direitos humanos”.

A seguir, os principais trechos do debate:

PAPEL DOS ANTROPÓLOGOS Bela Feldman-Bianco – A ABA tem não apenas uma importância científica, mas exerce um papel mediador entre Estado e movimentos sociais. A antropologia se volta para vários temas. Especificamente sobre o desenvolvimento, estamos criando um fórum temático com o objetivo de contribuir para o debate e para a implementação de políticas públicas, que devem levar em conta diferentes lógicas e saberes culturais.

Alfredo Wagner – Estamos em uma década marcada pela emergência de novas identidades sociais e pela emergência dos problemas que envolvem as reformas de vários códigos, como o Florestal, de Mineração, Penal e de Processo Civil. Como os antropólogos se inserem nisso? O que mobiliza o Estado a procurar os antropólogos? A meu ver, as questões mais urgentes envolvem a posse de terras indígenas e de terras de comunidades tradicionais, que suscitam algumas questões. Qual o destino dessas terras, face aos grandes projetos de desenvolvimento? Como se obtêm direitos e garantia de sua posse, quando temos uma reestruturação formal do mercado fundiário e quando há o procedimento de se entregar 67 milhões de hectares de terras públicas na Amazônia em dois anos a empreendimentos privados? Há conflitos sociais emanados dessas decisões. Estamos numa quadra histórica marcada por um grande processo de transformação, apoiado num processo de reprimarização da economia. É um modelo voltado para fora, que não respeita direitos territoriais de povos e comunidades tradicionais. É preciso ver os efeitos das grandes obras – barragens, projetos de hidrovias e outros – sobre essas populações. Os antropólogos podem participar desses debates com propriedade e conhecimento.

Foto: Sidney Murrieta

“No Brasil, hoje, é o Estado que
ganha força novamente, pois
o neoliberalismo deu no que
deu. Há várias narrativas, que
competem entre si. É preciso
ver qual será a dominante”.

 

Bela Feldman-Bianco,
presidenta da ABA

Cornelia Eckert – Os antropólogos estão sendo demandados na definição de políticas de desenvolvimento também no meio urbano. Temos uma importante função de mediação com as populações periféricas e não privilegiadas. A antropologia aos poucos tem sido convidada a participar de fóruns interdisciplinares de projetos sociais que atuam em conflitos sociais e problemas urbanos, como no caso de remoções motivadas pelas obras da Copa, atuando em ONGs e em entidades que discutem prevenção de desastres e catástrofes. No Rio Grande do Sul, por exemplo, atuamos em grupos de defesa civil para mostrar a ausência de poder público em relação às tragédias urbanas que têm acontecido. Nossa reivindicação é de uma maior demanda de nossa especialidade na mediação de conflitos em problemas socais.

TEORIA E PRÁTICA Gustavo Lins Ribeiro – A agenda da antropologia é ampla. Uma coisa é o debate teórico e metodológico e outra são suas interfaces com problemas reais, políticos, sociais, econômicos e culturais. Não fosse a presença de uma antropologia tão forte quanto a brasileira, os problemas decorrentes do avanço econômico sobre populações tradicionais ou minorias étnicas seriam muito maiores e essas questões manchariam o nome do Brasil mundo afora. A antropologia não se preocupa apenas com o contexto local e imediato. Ela estuda o desenvolvimento num grande espectro, com heterogeneidade de perspectivas e abordagens.

Bela Feldman-Bianco – O estudo dos deslocamentos e migrações das populações, principalmente entre Estados nacionais, por exemplo, nos leva a pesquisar tanto os receptores quanto os locais de origem dessas populações. Isso abrange o exame de migrações do campo, da remoção de populações e suas causas políticas, como as orientações neoliberais na Europa. Agrega- -se a isso a questão do tráfico de pessoas. Nem toda a migração é tráfico, há uma tendência de se criminalizar imigração como sendo tráfico. É preciso para isso que se examine as características local, nacional e global.

Foto: Sidney Murrieta

“A portaria interministerial
419, de outubro de 2011,
reduz bastante os prazos para
pronunciamentos técnicos em
relação às grandes obras. Trinta
dias para um profissional emitir
um parecer sobre um grande
projeto, com equipes exíguas
na Funai, no Incra e no Ibama
torna muito difícil a realização
de um trabalho sério”.

Andrea Zhouri,
diretora da ABA

AGENDA AMPLIADA José Sergio Leite Lopes – A ABA tinha uma agenda inicial de defesa das comunidades indígenas, que se estendeu a povos tradicionais. Isso se ampliou. Hoje estudamos operários metalúrgicos, têxteis, químicos, trabalhadores da cana etc. Também se trata de estudar a proletarização de grupos tradicionais, uma consequência do capitalismo. O folclore e a cultura tradicional se transformaram em defesa da cultura e proteção desse patrimônio imaterial. Envolver a defesa desses grupos demanda termos uma concepção ampliada de desenvolvimento. Houve uma ideia inicial baseada apenas no desenvolvimento tecnológico e no fortalecimento nacional. Essas formulações tiveram um ponto de apoio importante na Comissão Econômica para a América Latina (Cepal), da ONU, na década de 1950. O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) dessa época eram os 50 anos em 5, de Juscelino Kubitschek. Chega-se a 1963-1964 com o desenvolvimento voltado à expansão do mercado interno, pela extensão universal dos direitos do trabalho, pela reforma agrária etc. Por isso houve [o golpe de] 1964, porque se ampliou a ideia de desenvolvimento. Celso Furtado, o grande teórico dessa matriz, foi cassado por causa disso. Na hora em que há uma retomada do desenvolvimento é preciso aprender com os erros do passado. É preciso ampliar o sentido do desenvolvimento desde o econômico ao cultural, ao social e a outras áreas, para que os novos direitos que estão surgindo venham a ser incorporados.

João Pacheco de Oliveira – Se nosso país tem alguma consciência sobre sua diversidade, certamente isso se deve aos antropólogos, a pessoas como Gilberto Freire e Darcy Ribeiro, que mostraram que o Brasil não é branco, não é europeu, tem raízes indígenas e negras. Tem raízes na escravidão e na colonização. O reconhecimento das terras indígenas mostra que esses indivíduos não são isolados. Eles só existem em comunidade e só terão sua cultura reconhecida quando tiverem terra e recursos assinalados na Constituição de 1988. Os últimos anos têm consagrado o Brasil como um país plural, diversificado, a partir da base do interior. Isso se refletiu também na atribuição de direitos. Mas esses direitos, ao mesmo tempo em que são reconhecidos, não se traduzem em práticas concretas.

Foto: Sidney Murrieta

“Embora haja avanços no
terreno dos direitos e da
política internacional, o país
real continua sendo escrito
por velhas forças e imaginado
segundo outros interesses”.

 

Alfredo Wagner,
antropólogo

O MEIO AMBIENTE Andrea Zhouri – Nosso trabalho revela a existência de múltiplos caminhos do desenvolvimento. Há uma preocupação com as condições de trabalho dos antropólogos nas áreas de políticas públicas, especialmente nas áreas de licenciamento ambiental. A portaria interministerial 419, de outubro de 2011, reduz bastante os prazos para pronunciamentos técnicos em relação às grandes obras. São prazos que não condizem com um trabalho antropológico mais sério. Trinta dias para um profissional emitir um parecer sobre um grande projeto, com equipes exíguas na Funai, no Incra e no Ibama torna muito difícil a realização de um trabalho sério. Há muitos projetos sendo realizados ao mesmo tempo. Só na Amazônia temos definidas sessenta barragens hidrelétricas! Gostaríamos, nesse quadro de mudanças nos marcos regulatórios dos códigos, de pensar em alternativas para um diálogo para que esses esforços governamentais tenham efeito prático.

AS NARRATIVAS DO DESENVOLVIMENTO Bela Feldman-Bianco – Existe o perigo de um nacionalismo metodológico, a partir do Estado. No final dos anos 1980, começo da década seguinte, falava-se muito no colapso do Estado-nação. O Estado não acabou, mas houve uma reformulação. Há um aumento de transnacionalismo e, ao mesmo tempo, um aumento de localismo. No Brasil, hoje, é o Estado que ganha força novamente, pois o neoliberalismo deu no que deu. Há várias narrativas, que competem entre si. É preciso ver qual será a dominante.

Alfredo Wagner – Nosso problema é a relação entre crenças, comportamentos e práticas e essa conexão entre as narrativas e as práticas do Brasil real, onde as coisas não acontecem segundo as normas e convenções internacionais. Não somos mais o Brasil dependente, de Celso Furtado, somos muito diferentes. Embora haja avanços no terreno dos direitos e da política internacional, o país real continua sendo escrito por velhas forças e imaginado segundo outros interesses. Ideias novas, como desenvolvimento sustentado e formas de participação são muitas vezes revertidas, manipuladas e transformadas em dominação de determinados grupos.

Foto: Sidney Murrieta

“Um dos papéis da
antropologia é desnaturalizar
essas metanarrativas, que
tendem a construir uma
cultura generalizante do medo,
do risco, do milagre econômico
atual, sem estar atento aos
perigos que isso pode provocar.
nas relações sociais, como a
discriminação e o preconceito”.

Cornelia Eckert,
antropóloga

GLOBALIZAÇÃO E BARREIRAS Andrea Zhouri – Trabalhamos muitas vezes com processos transnacionais. A globalização também é a disjunção. Mostramos os fluxos, os contrafluxos, a criação de barreiras que contestam o mito da globalização inclusiva. Ela muitas vezes engloba diferenciando e não trata a todos igualmente.

Cornelia Eckert – Há um processo de ideologização das metanarrativas. Há uma discursividade da imprensa sobre, por exemplo, segurança. Um dos papéis da antropologia é desnaturalizar essas metanarrativas, que tendem a construir uma cultura generalizante do medo, do risco, do milagre econômico atual, sem estar atento aos perigos que isso pode provocar nas relações sociais, como a discriminação e o preconceito.

José Sérgio Leite Lopes – É complicado pensar na formação do Estado-nação em grande dimensão, quando percebemos que segue- -se classificando as pessoas tal como no primeiro Censo, de 1872. Aplicavam-se critérios cromáticos: as pessoas são brancas, amarelas, pardas etc. Precisamos chamar a atenção da questão classificatória e formal. Do mesmo modo a ideia de território e meio ambiente, que não são estáticos. A antropologia se contrapõe a essa glaciação e a esse congelamento de conceitos.

 

Foto: Sidney Murrieta

“A antropologia é uma
profissão extremamente
arriscada. Os profissionais, ao
fazerem seus trabalhos, são
constantemente ameaçados
pela ação de vários poderes.
Isso porque encontramos
sempre as dissonâncias entre as
leis e as práticas”.

 

João Pacheco de Oliveira,
antropólogo

HISTORICIDADE E TRABALHO João Pacheco de Oliveira – Há várias camadas históricas. Em determinados momentos, a tecnologia expulsa os trabalhadores industriais do emprego. É o caso, por exemplo, da mineração, uma atividade altamente insalubre, agravada pela urgência da produção. No entanto, quando essa atividade cessa, as pessoas que nela trabalharam, que formaram uma certa cultura, lamentam. Os operários passam a ser um grupo condenado, e são vistos como parte de uma tecnologia do passado, com gestos repetitivos, que em certa época eram a esperança de um futuro e uma utopia. É preciso estudar isso.

Bela Feldman-Bianco – Hoje temos antropólogos fazendo pesquisas de cooperação internacional, na China, em Timor Leste e em outras partes, estudando deslocamentos, migrações e uma infinidade de temáticas. A antropologia brasileira está muito consolidada. Recebemos cada vez mais alunos do exterior, dos EUA, da América Latina e África. Há uma circulação de ideias através da globalização do conhecimento.

Alfredo Wagner – A antropologia permite entender a globalização como uma política e não como um processo natural. Trata-se de um mecanismo de poder do Estado. A figura do Estado aparece muitas vezes como redentora. A antropologia pode estabelecer diálogos com os instrumentos de poder e com a vida social. É preciso atentar para o fato de que a dimensão econômica não pode ser separada da dimensão identitária, colocada em nossa vida social.

Foto: Sidney Murrieta

 

“É complicado pensar na
formação do Estado nação
em grande dimensão, quando
percebemos que segue-se
classificando as pessoas tal
como no primeiro Censo, de
1872. Aplicavam-se critérios
cromáticos: as pessoas são
brancas, amarelas, pardas etc.
Precisamos chamar a atenção da
questão classificatória e formal”.

José Sérgio Leite Lopes,
antropólogo

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RISCOS DA PROFISSÃO João Pacheco de Oliveira – A antropologia é uma profissão extremamente arriscada. Os profissionais, ao fazerem seus trabalhos, são constantemente ameaçados pela ação de vários poderes. Isso porque encontramos sempre as dissonâncias entre as leis e as práticas. Muitas vezes somos vítimas de campanhas de difamação. É fundamental que os planejadores não pensem que este país, na Amazônia, por exemplo, é feito de vazios. Há populações com cálculos, estratégias e planos de ocupação. Elas precisam ser incorporadas nos processos de desenvolvimento. Temos de ter em conta que as ações dos órgãos governamentais são desmobilizadoras. Essas populações são frequentemente vítimas de violência e interesses de madeireiros, mineradores, contrabandistas e de narcotraficantes. Elas querem alternativas de construção de país.

 
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