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Luiza Bairros - “Não podemos ficar indiferentes ao fato de que os negros morrem mais cedo quando comparados a qualquer outro grupo social”

2011 . Ano 8 . Edição 70 - 29/12/2011

Foto: Seppir

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Jonas Valente – de Brasília

Luiza Bairros, ministra da Secretaria de Políticas para a Promoção da Igualdade Racial, fala das ações governamentais para eliminar o racismo em todas as esferas da vida nacional. Nesta entrevista ela comenta as dificuldades para a concretização de ações afirmativas, como a política de cotas, aponta as medidas necessárias para uma política de saúde justa e discorre sobre as iniciativas para outros grupos populacionais, como indígenas, ciganos e imigrantes de países do continente

Desafios do Desenvolvimento - Qual a importância da criação de um órgão específico para a promoção da igualdade racial? Como ele atua e, na sua avaliação, qual foi o impacto geral de sua existência ao longo dos últimos oito anos?

Luiza Bairros - A criação de um órgão de promoção da igualdade racial no governo federal provocou um impacto em pelo menos dois níveis. O mais evidente tem a ver com o efeito demonstração que isso causou nos governos estaduais e municipais. Há hoje quase 200 órgãos nessas duas esferas que foram criados com esse objetivo. Estamos nesse momento levando a cabo na Seppir uma das determinações do Estatuto da Igualdade Racial, de criação de um Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial, Sinapir. Por meio dele, vamos sistematizar toda essa experiência da política de promoção da igualdade racial e projetar formas de organização dela dentro do Estado brasileiro, de maneira que as competências dos governos federal, estaduais e municipais estejam bem definidas para trazer benefícios concretos para a vida das pessoas.

O exemplo maior hoje é o das ações afirmativas no ensino superior. Elas propiciaram uma entrada em maior número de pessoas negras nas universidades. Mas nós partimos de um patamar com diferenças tão agudas, que ainda se fazem necessárias medidas mais profundas para desfazer determinados gargalos na trajetória de formação das pessoas negras, especialmente hoje em relação ao ensino médio.

Desenvolvimento - Uma pesquisa da Fundação Perseu Abramo mostrou que 87% das pessoas acreditam existir discriminação racial no País, mas apenas 4% admitem a prática. Em sua avaliação, Ministra, a sociedade brasileira avançou nos últimos dez anos em relação ao racismo?

Luiza Bairros - O racismo brasileiro sempre se caracterizou por este tipo de contradição: as pessoas admitem a existência do racismo, mas não se colocam entre as que discriminam nem entre as que são discriminadas. Ao longo dos últimos anos a tendência é que a opinião pública também vá se modificando. Isso se dá pela atuação das organizações do movimento negro na sociedade e, mais recentemente, pelo fato de a agenda racial ter sido institucionalizada pelos governos. Outras pesquisas realizadas mais recentemente apontam em uma direção diferenciada – como a do IBGE, em cinco regiões brasileiras, sobre as características sociorraciais da população. As pessoas opinam se o pertencimento racial exerce impacto sobre as oportunidades que elas têm na vida. Mais de 60% das respostas apontaram que sim, mostrando que isso pode tanto implicar privilégios para as pessoas brancas quanto desvantagens para as pessoas negras.

Perfil

A gaúcha Luiza Bairros é uma militante e pesquisadora de longa trajetória na temática da igualdade racial. Formada em Administração Pública e Administração de Empresas na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), ela consolidou sua carreira política e acadêmica em Salvador, onde reside desde 1979. Lá tornou-se uma destacada liderança do Movimento Negro Unificado (MNU), principal organização do setor. Em 1991, foi escolhida a primeira coordenadora nacional do Movimento, cargo que ocupou até 1994.

Seu mestrado na Universidade Federal da Bahia (UFBA) teve como tema a inserção do negro no mercado de trabalho e seu doutorado foi concluído em 1997 na Michigan State University. Ao regressar ao Brasil, no ano seguinte, associou- -se como pesquisadora ao Centro de Recursos Humanos da UFBA. Ajudou a criar o projeto Raça e Democracia nas Américas, que promovia o intercâmbio entre estudantes negros brasileiros e estadunidenses.

Luiza Bairros também construiu carreira na gestão pública. No início dos anos 1990 trabalhou na Secretaria do Trabalho e Ação Social do Estado da Bahia. Durante a primeira gestão de Jaques Wagner (2007-2011), foi a titular da Secretaria da Promoção da Igualdade (Sepromi). A partir dessa experiência, foi indicada para assumir a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir)..

Desenvolvimento - E no caso de outras etnias, como indígenas, ciganos ou pessoas vindas de outros países da América do Sul? Ainda há menos consciência do que no caso dos negros?

Luiza Bairros - Os quilombolas vêm se colocando como atores muito importantes no debate sobre a inserção social e política da população negra. Nos outros grupos, não se percebe ainda uma presença maior do debate na esfera pública, mas existe uma tendência que isso também se modifique, na medida em que os negros conseguem avançar nas suas reivindicações e constroem uma nova maneira de entender as relações raciais no País. Com isso, vai se tornando também mais evidente para os demais grupos o tipo de discriminação que sofrem. É o caso de uma construção das chamadas comunidades tradicionais, que envolvem ciganos, indígenas, ribeirinhos, comunidades de terreiro e vários outros grupos. Eles se percebem cada vez mais como segmentos da população com direitos que não têm sido respeitados ao longo do tempo. Agora se veem como sujeitos com direito a políticas públicas específicas. Exemplo disso é a formação, dentro do governo federal, de comitês voltados a elas. Há um decreto [6.040, de 7 de fevereiro de 2007] que disciplina a ação governamental no que se refere a esses grupos.

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Desenvolvimento - Que outras ações existem para essas etnias?

Luiza Bairros - A população indígena continua sendo responsabilidade primária da Funai [Fundação Nacional do Índio].

É o órgão que constituiu ao longo dos anos expertise para tratar com essas populações. No que se refere aos ciganos, é uma agenda recente dentro do governo brasileiro. E nós estamos trabalhando com essas populações a partir das demandas apresentadas por elas. É um segmento diverso, há diferentes grupos com demandas diferenciadas do ponto de vista cultural. É preciso que seja feito dessa forma, sob pena de o Estado, ao tentar trabalhar com populações diferenciadas, corra o risco de agredir culturalmente essas comunidades. Nós temos tido muitas demandas por meio da ouvidoria da Seppir, problemas do ponto de vista da localização em determinadas áreas. Temos tentado fazer mediação e temos sido bem sucedidos com isso.

Foi construído um Centro de Referência Cigana, na cidade de Souza, na Paraíba. Ele está agora em processo de negociação com o governo estadual para que se definam os usos daquele equipamento, de modo que vários grupos ciganos possam se beneficiar da existência desse centro. As comunidades de terreiro têm sido parte importante da preocupação da Seppir. As medidas iniciais foram de apoio no debate e na definição das políticas de segurança alimentar no governo federal, e com rebatimento nos Estados. Essas comunidades muitas vezes atuam como referência de apoio espiritual e social dentro de comunidades empobrecidas.

Desenvolvimento - 2011 foi declarado o Ano Internacional dos Afrodescendentes. De que maneira isso impacta na luta pela promoção da igualdade racial e quais iniciativas estão sendo promovidas em razão dessa questão?

Luiza Bairros - O Ano Internacional dos Afrodescendentes marca os dez anos da declaração do Programa de Ação da III Conferência Mundial Contra o Racismo, que aconteceu em 2001, na África do Sul. É uma forma de se criar uma motivação simbólica para uma tarefa prática muito importante: analisar o que tem sido feito nos últimos anos para promover a inclusão dos afrodescendentes em vários lugares do mundo. No caso brasileiro, isso ganhou uma centralidade muito grande. Vimos a oportunidade de também fazer uma proposta a partir da Seppir que mobilizasse a sociedade no sentido de mais e melhores esforços na direção da promoção da igualdade racial. Isso foi organizado em torno de uma campanha que se chama “Igualdade racial é pra valer”. Nela, a Seppir convoca vários setores da sociedade, agentes econômicos e sociais, privados especialmente. Estes têm tido uma participação menos proeminente nessa agenda e queremos que venham agora se abrir para essa possibilidade de ações concretas que promovam a inserção de negros naqueles espaços onde a nossa presença ainda é muito aquém daquilo que nós representamos na população total.

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Desenvolvimento - Uma das principais ações é o Programa Brasil Quilombola. Que balanço a senhora faz dele?

Luiza Bairros - O Programa Brasil Quilombola tem sete anos. Ao longo desse tempo, ele conseguiu fazer chegar a essas comunidades programas e serviços públicos inimagináveis há até pouco tempo, como o programa Luz para Todos. Algumas iniciativas de saneamento básico, mesmo naquelas intervenções mais simples, como instalação de cisternas, provocaram nesses espaços uma mudança muito grande dos estilos de vida. Também se fez um investimento significativo na área de inclusão produtiva com projetos que buscaram potencializar o tipo de atividade agrícola desenvolvida por essas comunidades. Apesar de podermos contar com números positivos para o programa, ele carece de uma revisão das suas formas de execução. Nós temos desenvolvido um esforço especial no sentido de envolver os governos estaduais na execução, para fazer com que esses serviços cheguem mais rapidamente nas comunidades, especialmente as obras de infraestrutura. Nós já temos um bom caminho percorrido na questão da construção de habitações, mas existe ainda uma carência evidente em relação a isso.

Qualquer decisão que vise diretamente
inserir os negros em vários campos da vida
social será sempre uma medida política.
O que se coloca são projetos distintos
sobre a seguinte
questão: o que queremos
para este país? Que tipo de democracia
vamos
construir? Uma democracia racial
sem os negros, como
nos anos 1930?

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Desenvolvimento - Mas a iniciativa depende agora do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade que o DEM apresentou no Supremo Tribunal Federal (STF) contra o Decreto 4887/2003. Ele regula a titulação e registro de terras quilombolas no País. Como o governo tem atuado para assegurar a validade dessa norma?

Luiza Bairros - O governo federal tem defendido, desde a gestão anterior, através da Advocacia-Geral da União (AGU), a constitucionalidade do Decreto 4887. Ele é importante do ponto de vista político e também antropológico, pois é uma legislação que incorpora as diretrizes internacionais relativas às comunidades tradicionais e como ela se aplica às comunidades quilombolas. Desde que o artigo 68 das disposições transitórias da Constituição Federal inseriu esta questão dos direitos das comunidades quilombolas à terra, nós temos no Brasil uma manifestação bastante veemente desses setores que não admitem este tipo de direito. Ainda que nem todas as comunidades quilombolas tenham uma ligação direta com o período da escravidão, elas são representativas do grau de abandono a que as populações negras foram relegadas ao longo de séculos no Brasil. São inúmeros os casos de comunidades quilombolas que nunca tinham sido beneficiadas com água e luz.

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Desenvolvimento - O STF também deve julgar ação contra as cotas raciais da Universidade de Brasília. Há diálogo com os ministros também para esta matéria?

Luiza Bairros - Qualquer decisão que vise diretamente à inserção de pessoas negras em vários campos da vida social será sempre uma medida política. O que se coloca são projetos distintos sobre a seguinte questão: o que queremos para este país? Que tipo de democracia vamos construir? Uma nos moldes dos anos 1930, uma democracia racial sem os negros? Eu acho que o STF entendeu bem a dimensão mais profunda que as ações afirmativas têm. Tanto é que a corte convocou audiências públicas para debater o tema. Nelas foram incluídos vários setores da sociedade além das universidades. O governo se manifestou, por meio da AGU, favoravelmente a esse tipo de conquista.

Desenvolvimento - Como o argumento sobre as cotas sociais inf luencia a discussão?

Luiza Bairros - O argumento das cotas sociais decorre de uma visão existente sobre a desigualdade no Brasil. Há amplos setores que ainda defendem que o fator determinante das desigualdades no País é de caráter social. Que você poderia por meio da distribuição de renda e de outros mecanismos desta natureza provocar uma mudança sensível dessas desigualdades. Há mecanismos que acabam deixando a população negra de fora dos benefícios de determinadas medidas. A nossa expectativa é que as pessoas reconheçam que ser negro na presença do racismo é uma desvantagem. Por isso, é preciso criar medidas que não apenas combatam o racismo, como principalmente sejam capazes de alterar os efeitos negativos que ele gera nas nossas vidas.

Desenvolvimento - Quanto à política de saúde da população negra, ainda há críticas das entidades que acompanham o assunto de que é preciso tirar o programa do papel, estabelecer metas, como a redução da mortalidade materna de mulheres negras. Como a Seppir vem atuando junto ao Ministério da Saúde e a esses outros entes da Federação para efetivar esta política?

Os quilombolas vêm
se colocando como
atores muito importantes
no debate sobre a inserção
social e política
da população negra

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Luiza Bairros - A saúde é uma área central nas políticas públicas para a comunidade negra. Nós não podemos ficar indiferentes ao fato de que os negros morrem mais cedo quando comparados a qualquer outro grupo social. E nem sempre essa condição está relacionada a uma situação socioeconômica desvantajosa.

Você encontra esse padrão em brancos e negros de faixas de renda mais altas. Isso significa que existem determinadas condições que fazem com que doenças tenham entre nós um curso diferenciado, agravado por determinadas condições que, no limite, podem ser atribuídas ao racismo. Ainda não temos no Brasil uma formação de profissionais de saúde que priorize este debate. Existem pesquisas que falam quais seriam os medicamentos mais apropriados para tratar da hipertensão, por exemplo, entre negros. Outra doença com prevalência entre a população negra é o diabetes, que leva com muito mais frequência à amputação de membros inferiores. Há ainda a incidência de miomas em mulheres negras. Isso sem falar na anemia falciforme, que é uma doença de base genética, predominante entre nós. Esses exemplos são fortes o suficiente para fazer com que o Sistema Único de Saúde (SUS) encare como fundamental a melhoria do atendimento da população brasileira como um todo, especialmente considerando que entre nós, negros, está a maior proporção de usuários do próprio Sistema. A Seppir vem mantendo diálogo com o Ministério da Saúde (MS), que já instituiu uma Política de Atenção à Saúde da População Negra.

Desenvolvimento - Uma pesquisa da Fundação Ethos e da Fundação Getúlio Vargas mostrou que dentro das quinhentas maiores empresas do País apenas 23,4% dos funcionários são negros, enquanto eles já passaram a ser a maioria da população. Nos cargos de chefia o índice baixa para 13,5%. O Plano Nacional de Promoção da Igualdade Racial estabelece como objetivos combater a discriminação e assegurar a equidade no ambiente de trabalho. Que ações o governo federal tem feito nesse sentido?

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Luiza Bairros
- A Secretaria de Políticas para as Mulheres já está na quarta edição do programa Selo Pró-Equidade de Gênero. Ele passou a incluir o recorte de raça. Essa ação é muito importante para mobilizar empresas para a criação de mecanismos internos nos seus processos de recrutamento e seleção de pessoal, e principalmente os mecanismos de promoção interna que levem em conta as mulheres, as mulheres negras e os homens negros. Esse é um exemplo de medidas concretas. Já há 90 empresas que aderiram ao selo. Boa parte é estatal, mas é possível perceber uma presença cada vez maior de organizações privadas que buscam inserir uma maior diversidade racial e de gênero nos seus quadros. Além disso, eu acho que conseguimos algo bastante importante no Plano Plurianual 2012-2015, ao inserir o objetivo de enfrentamento do racismo institucional.

Desenvolvimento - O Mapa da Violência 2011, do pesquisador Júlio Jacobo Weiselfiz, do Instituto Sangari, revelou que a diferença entre negros e brancos, quando se fala em homicídios, vem aumentando. Em 2002, ela era de 45,8%. Em 2008 ela chega a 103,4%, ou seja, o dobro. Como a senhora explica esse fenômeno? E que iniciativas vêm sendo tomadas para reverter esse quadro?

Luiza Bairros - Esse fenômeno já atingiu taxas tão elevadas ao ponto de gerar uma mudança do perfil demográfico da sociedade brasileira. Uma das evidências que o Censo de 2010 trouxe é a diminuição da população masculina suplantada pelas mulheres. Na população negra essa diferença é maior ainda do que na população branca. A morte precoce entre jovens homens negros tem um papel fundamental nisso. É mais uma mostra de como a cor da sua pele determina as suas oportunidades de vida. Os dados dos homicídios evidenciam isso. O que nós temos feito em relação a esse tema é a atuação no Fórum de Direitos e Cidadania – que reúne órgãos como a Secretaria-Geral da Presidência da República, a Secretaria Especial de Direitos Humanos, o Ministério da Cultura etc. Quando a Seppir trata da mortalidade da juventude negra, estamos falando na verdade do acirramento de um processo mais amplo de criminalização da população negra que não arrefeceu mesmo diante deste período de avanços dos últimos anos. Isso revela para nós a profundidade que o racismo tem, de se tornar mais complexo e de aparecer com novas faces e disfarces mesmo quando você consegue promover a inclusão de uma parcela significativa da população.

 
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