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Uma utopia chamada esperança - Projeto de economia solidária idealizado por Dom Ivo Lorscheiter torna-se referência

2007 . Ano 4 . Edição 37 - 10/11/2007

Por Caio Cigana, de Santa Maria (RS)

São pouco mais de 10 horas da manhã de sábado em um dos pavilhões do centro de comercialização direta do Projeto Esperança, em Santa Maria, cidade-pólo da região central do Rio Grande do Sul. A cena se repete: "Cadê o moranguinho, Alemão?", perguntam um a um os clientes, após uma rápida passada de olhos pela banca. "Já foi tudo...", diz o agricultor Cleber Cassel, 30 anos, em um lamento cheio de satisfação. Em pouco tempo Cassel vendeu para a clientela fiel todas as 150 bandejas de 250 gramas do morango que colhe em sua propriedade de dois hectares localizada em Agudo, município vizinho, de colonização alemã.

O agricultor faz parte de um dos cerca de 230 empreendimentos urbanos e rurais organizados pelo Projeto Esperança, uma utopia posta tornada realidade,que nasceu há 20 anos pelo esforço pessoal do então bispo da diocese de Santa Maria, Dom Ivo Lorscheiter,e que hoje beneficia aproximadamente 4,5 mil famílias de 30 municípios. Dom Ivo morreu em março deste ano, mas deixou consolidada e reconhecida a experiência de geração de renda baseada nos princípios da economia solidária, onde a ordem dominante é invertida e o trabalho é posto à frente do capital.

"A economia solidária é um modelo que leva em conta um novo modo de produzir, comercializar e consumir. Produzimos com respeito ao meio ambiente e aos recursos hídricos. É um novo modo de trabalhar porque o resultado é compartilhado, não fica concentrado. A comercialização é direta, sem intermediários, olho no olho entre produtor e consumidor. Com isso, a forma de consumir é um repúdio ao consumismo", ensina a irmã Lourdes Dill, coordenadora do projeto desde o seu início.

Sem os morangos,os clientes de Cleber Cassel passam a comprar outras delícias como amoras,queijos,cucas (torta de frutas), pães, biscoitos e geléias produzidos por ele e sua família. É assim todo sábado, dia reservado para o Feirão da Economia Solidária no terminal de comercialização direta, agora rebatizado de Centro de Referência de Economia Solidária Dom Ivo Lorscheiter, onde quase cem famílias vendem hortifrutigranjeiros, produtos coloniais e artesanato. "Mas, se alguém quiser só vender, avisamos que aqui não é o lugar", ressalta Claudia Medianeira Rodrigues Machado,integrante da coordenação do Projeto Esperança.

Os participantes são incentivados a se organizar em grupos para aprender a trabalhar de forma associativa, em mutirão, e a estudar temas relacionados à economia solidária para compreenderem na teoria o que colocam diariamente em prática. Os grupos organizados se articulam por meio da Cooperativa Mista de Pequenos Produtores Rurais e Urbanos (Coo-pesperança). Recebem ainda assistência técnica e certas noções de gerenciamento do seu negócio, graças ao apoio da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Associação Riograndense de Empreendimentos de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater/RS) e prefeitura.

O próprio Cleber Cassel é um exemplo da transformação proporcionada pelo Projeto Esperança, tanto no aspecto de melhoria das condições de vida quanto na consciência social. Antes de se integrar à iniciativa, ele vendia a produção batendo de porta em porta na sua cidade. "Hoje, a minha renda triplicou", comemora o agricultor, acrescentando que a comercialização no feirão abriu as portas para que os seus biscoitos, cucas e geléias hoje cheguem a supermercados, hotéis e delicatessens de Santa Maria.

Como o negócio cresceu, Cassel também teve a oportunidade de praticar os conceitos de solidariedade que aprendeu. "Acho que também estamos fazendo um trabalho de inclusão social porque temos um ex-apenado que cuida da horta para a gente. Um dia, ele apareceu lá em casa, explicou a situação e disse que precisava de serviço. Conversei com a minha mulher e decidimos dar uma chance para ele. Ele já está há três anos com a gente. Assim como nós um dia precisamos de uma oportunidade para melhorar, ele também precisava", conta.

ALTERNATIVA AO FUMO Outra obsessão de Dom Ivo e que até hoje é um dos principais objetivos do Projeto Esperança é a busca por alternativas ao plantio de fumo, lavoura tradicional na região."Ainda lembro de Dom Ivo dizendo: 'o fumo é uma cultura de morte'", conta o agricultor Lucas Antônio Somavilla, 40 anos. O que ele relata aconteceu em 1993, em mais uma das incursões de Dom Ivo pelos municípios da região, quando reunia as comunidades para incentivar os agricultores a abandonar a fumicultura, se organizar e aderir ao Projeto Esperança.

Produtor em Pinhal Grande, a cerca de 100 quilômetros de Santa Maria, Somavilla lembra que ouviu atento a pregação de Dom Ivo, não só sobre os malefícios do tabagismo como também das conseqüências do plantio do tabaco, pelo elevado uso de agrotóxicos. "Conheço muita gente que sofre de dores de cabeça, pressão alta e problemas no estômago e no fígado",diz o agricultor,que atribui os problemas de saúde aos produtos químicos empregados na lavoura de fumo.

Sensibilizados, Somavilla, um irmão e o pai resolveram abandonar a fumicultura. Especializaram-se em feijão."Produzimos 12 variedades de feijão. A minha renda subiu significativamente.Hoje é de quatro a cinco vezes maior. Além disso, com o fumo o ganho é anual e de repente, com uma chuva de granizo, a gente perde tudo."

"Com frutas da época, mandioca e vinho colonial, além do feijão, temos hoje uma renda semanal", observa. Somavilla relembra que, com a organização criada a partir do incentivo e apoio do Projeto Esperança, a comunidade onde vive começa a despertar para outras oportunidades, como o turismo rural.

"Para a gente, o Projeto Esperança foi uma oportunidade de socialização, de conhecer novos horizontes", diz Somavilla, acrescentando que assim se materializa um provérbio chinês que é quase um mantra para a coordenação do Projeto Esperança: "Se quiseres fazer um planejamento para um ano, plante cereais; se quiseres fazer um planejamento para 30 anos, plante árvores; se quiseres fazer um planejamento para 100 anos, organize e motive a organização do povo".

NOVOS FRUTOS A semente de esperança plantada por Dom Ivo floresceu e gerou frutos, como a Teia Esperança e o Catando Cidadania. Criada em 2003, a Teia conta hoje com 40 espaços fixos de comercialização nos municípios da região central do Rio Grande do Sul, onde grupos organizados comercializam também de forma direta seus produtos e artesanato.

Uma das coordenadoras do Projeto Esperança, Claudia Machado também está à frente da teia Arte da Inclusão, uma das quatro localizadas em Santa Maria, onde catadores de lixo, indígenas e afro-descendentes vendem artesanato de material reciclado, confecções,bijuterias e arranjos com flores. "Dessa forma esses povos começam a resgatar a sua identidade e auto-estima. Eles entendem que fazem parte da sociedade e têm direitos. Tudo isso além da geração de trabalho e renda", explica Claudia.

O Catando Cidadania, por sua vez, caminha por outra vertente. Surgiu também em 2003, após o Encontro Nacional de Catadores, realizado em São Leopoldo (RS), quando se constatou que os projetos envolvendo homens e mulheres que vivem de selecionar material reciclável nas ruas e lixões buscavam apenas geração de renda. "Essa é uma iniciativa de inclusão cultural e começou com um coral formado por catadores", diz a coordenadora do projeto, Maria de Lourdes Tieme Ide, lembrando que são oferecidas ainda outras atividades como oficina de papel reciclado, dançaterapia, aulas de línguas (inglês e espanhol) e curso de computação para os filhos de catadores.

O projeto, no entanto, ganhou fama graças ao coral. "Temos quase uma apresentação por semana, não só em Santa Maria", relata Maria de Lourdes, orgulhosa do grande número de convites que recebe para se apresentar com o grupo.

Graças ao prestígio internacional conquistado pelo Projeto Esperança, a feira anual do cooperativismo alternativo, que é realizada desde 1994, cresceu e se internacionalizou: em julho deste ano, durante três dias, Santa Maria sediou pela terceira vez a Feira de Economia Solidária do Mercosul, que atrai participantes não só dos países vizinhos, mas também de outros continentes. Este ano, registrou a presença de representantes de 1,5 mil empreendimentos de economia solidária da América Latina, Ásia e Europa e um público superior a 100 mil pessoas.

 
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