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Drenagem - Como controlar as águas? - Especialistas recomendam inovação e abandono de soluções tradicionais

2009 . Ano 7 . Edição 56 - 10/12/2009

 

Especialistas recomendam inovação nos projetos de contenção e o abandono de soluções tradicionais, que são dispendiosas e podem causar mais problemas. Reconhecem também a tendência dos governos de concentrar as ações de saneamento em água e esgoto, esquecendo-se da drenagem

Márcio de Morais - de Brasília

Inundações como as que atingiram fortemente São Paulo e outras cidades, no fim do ano, são resultado de décadas de abandono das ações de drenagem urbana, principalmente entre o início da década de 1970 e do século XXI. Enquanto medidas de cunho regulatório e planos de investimentos de âmbito nacional aguardam a aprovação do Legislativo, iniciativas dos governos federal, estaduais e municipais vão vencendo a inércia histórica com as obras para amenizar os efeitos das enchentes e inundações. Os especialistas, no entanto, reconhecem: tudo é, ainda, muito incipiente. Vontade política, prioridade, dedicação, mais recursos e revisão tecnológica das práticas de saneamento são indispensáveis.

"Mas eu sou um otimista: temos um quadro institucional muito mais favorável, em curva ascendente. Tudo vai melhorar", diz o engenheiro Márcio Baptista, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e um dos especialistas brasileiros que enxergam na renovação e inovação - técnicas, políticas e institucionais - o melhor caminho na busca de soluções para as cidades. A inovação tecnológica representada pela adoção do modelo "não-estruturante" de ações de drenagem urbana já domina a elite brasileira do setor de saneamento ambiental e, aos poucos, vai mobilizando corações e mentes rumo a medidas mais sensatas e sustentáveis.

"Todas as soluções não-estruturantes são mais baratas que o modelo tradicional, que é mais caro e só aumenta os problemas urbanos", justifica o coordenador do Programa de Modernização do Setor de Saneamento, Ernani Miranda, da Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental (SNSA) do Ministério das Cidades. Ele relaciona quatro fundamentos do novo padrão: contenção do processo de impermeabilização; implantação de parques lineares; adoção de reservatórios (piscinões) de retenção; e disseminação de áreas de infiltração. Juntas, essas medidas diminuem o volume e o fluxo das águas pluviais, restabelecem a paisagem urbana, com mais verde, o reavivamento da diversidade biológica, humanismo e conforto visual; além de atenuar a violência com que as águas invadem o ambiente da cidade e confrontam a fragilidade humana.

Já a coordenadora de Estudos Setoriais Urbanos do Ipea, Maria da Piedade Morais, destaca a importância dos investimentos em drenagem urbana para a manutenção de condições estáveis nas áreas de ocupação pelo homem. "São fundamentais para conter os deslizamentos de terra e as enchentes provocadas pela ocupação antrópica e desordenada do solo, inclusive em áreas de proteção ambiental." Segundo ela, construções sem técnicas adequadas, especialmente em regiões de declive acentuado, colaboram para a impermeabilização do solo. "Foi o que ocorreu em Santa Catarina. Em alguns municípios, como Petrópolis, no Rio de Janeiro, esses deslizamentos de terra são recorrentes", observa. Ela aponta um grave erro de estratégia dos gestores públicos: "Habitualmente, (eles) dirigem os recursos de saneamento básico para água e esgoto, negligenciando a drenagem".

Rotina - Ano após ano, a tragédia brasileira das inundações urbanas se repete de forma cada vez mais intensa, especialmente nas grandes regiões metropolitanas, também sempre maiores a cada temporada. Mas é tudo muito previsível: apenas duas cidades brasileiras, Porto Alegre (RS) e Santo André (SP), possuem serviço formal de drenagem. Só Porto Alegre mantém controle sobre novas áreas de desenvolvimento. "Inundações são consequência do aumento das áreas impermeáveis e da canalização dos rios", informa o professor Carlos Eduardo Morelli Tucci, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), considerado o maior especialista brasileiro no assunto.

Um diagnóstico para solução do problema, que se repete a cada estação chuvosa, foi feito no início desta década, em estudo oficial do Ministério das Cidades, elaborado a partir da Oficina de Trabalho para Apresentação de Textos de Referência sobre a Atuação do Governo Federal em Drenagem Urbana. Fruto de um reservado encontro entre 16 especialistas brasileiros do setor, realizado em Goiânia, em maio de 2003, o documento aponta princípios gerais para conferir eficiência à drenagem: adoção de políticas públicas que integrem as quatro pontas das ações de saneamento ambiental (abastecimento de água, esgoto sanitário, drenagem urbana e gestão de resíduos sólidos/lixo); maior participação dos responsáveis pelos impactos no pagamento dos custos das soluções; controle social da gestão da drenagem urbana; e, adoção de inovações ambientais na definição das soluções.


Tucci, um dos especialistas que esteve no encontro de Goiânia, estima o passivo brasileiro com drenagem urbana e danos ambientais decorrentes de inundações em R$ 21 bilhões (cerca de 0,2% do PIB). Segundo ele, 99% das inundações no Brasil são geradas por drenagem mal projetada e dão prejuízos de cerca de R$ 7,5 bilhões/ano ao País. Em 2005, Tucci preparou um programa de águas pluviais para o Ministério das Cidades, que não decolou. O horizonte de ação do plano seria de 20 anos, com resultados mais ponderáveis nos primeiros seis a sete anos e redução do prejuízo nacional para cerca de R$ 1 bilhão anuais - "já que nenhum plano elimina o prejuízo (por completo)", segundo o professor. O programa cobrava a elaboração de um Plano Nacional de Drenagem Urbana e implementação de investimentos sustentáveis, escalonados por tamanho de cidades.

Marco regulatório - "Só obras não resolvem inundações", reconhece o secretário Ernani Miranda, cuja equipe prepara um conjunto de medidas e regras para tentar tratar o problema com a dimensão e prioridade que requer. São planos nacionais de saneamento e drenagem e um projeto de lei para executar o que já está previsto na legislação há quase três anos, porém sem regulamentação. Os técnicos consideram que, com esses instrumentos e a Lei 11.445, de janeiro de 2007, se tem uma base regulatória sólida para submeter governos de todos os níveis a compromissos compulsórios com o saneamento

O diretor de investimentos do ministério, Manoel Renato Machado Filho, ressalta que a solução exige cooperação institucional entre União, estados e municípios, mobilizando simultaneamente os setores público e privado. "O saneamento é um setor conflagrado", admite o diretor. Há disputas entre empresas estaduais de água e esgoto e regiões metropolitanas, entre estado e os municípios e entre os próprios municípios. "Não se tem uma lei de saneamento básico que contemple a organização dos quatro serviços - água, esgoto, lixo e drenagem", justifica Miranda. "Há sobreposição de órgãos metropolitanos sobre municípios", apimenta Baptista, outro que também assina o documento de Goiânia.

"Já os estados entendem que a atribuição de atuar é deles, por não reconhecer a autonomia da região metropolitana, com base numa interpretação do parágrafo terceiro, artigo 25 da Constituição", informa Machado. O conflito institucional embaralha o jogo do saneamento. "O setor é totalmente desmobilizado, foi jogado às moscas durante duas, três décadas e, por isso, não capacitou especialistas. Para fazer projetos, é preciso contratar gente fora do País - na Argentina, Espanha. O saneamento é o primo pobre da área de infraestrutura", contextualiza Machado.

Pela legislação em vigor, abastecimento de água e oferta de esgoto sanitário são atribuições estaduais. Já o lixo e a drenagem são municipais. A desvantagem da drenagem é que não gera receitas com tarifa ou taxa, enquanto os outros serviços custeiam, com a cobrança ao público, sua manutenção e operação. Não há alternativa: investimentos em drenagem têm de ser via orçamento ou financiamento público. "Mas há uma tendência à cobrança de taxa", antecipa Miranda. Só Porto Alegre, por meio do Departamento de Águas Pluviais, e Santo André (via Semasa) têm modelo próprio e cobram taxas dos proprietários de lote, com bons resultados. Nos projetos do ministério, essa taxa pode vir incorporada ao IPTU.

Por outro lado, a grande maioria dos profissionais brasileiros foi formada em contexto já ultrapassado tecnologicamente - e tem o modelo 'estruturante' (nome que se dá à opção por obras caras, de resultados duvidosos) como único padrão de atuação. Sob essa ótica, a perspectiva é que o problema apenas se desloque uns quilômetros abaixo, no leito da bacia hidrográfica. "O custo do quilômetro de obra de drenagem no Tietê (São Paulo) é de US$ 50 milhões (cerca de R$ 85 milhões)", escandaliza-se o engenheiro Baptista.

"O projeto não compensa a relação custo/benefício, do ponto de vista técnico", opina. "O controle (de novas áreas de desenvolvimento) existente em São Paulo é inadequado e continua transferindo o impacto do privado para o público", acrescenta Tucci. Os estudos indicam que é preciso reverter o quadro, cobrando do privado (shoppings, hipermercados, aeroportos) compensações para financiar o público, com base no metro quadrado impermeabilizado. O modelo estruturante se baseia no tripé 'retificação' (revestimento), canalização e fechamento de canais. Isso aumenta a aclividade (queda) do leito e a capacidade de vazão. Tem um objetivo: suportar o pico das chuvas.

Tais intervenções imprimem maior rapidez ao escoamento da água, mas promovem, elas próprias, a impermeabilização. "Cada metro quadrado de área impermeável gera 6,25 vezes mais vazão que uma área permeável. Isto é transferido na forma de prejuízos para o restante da cidade e ao longo da bacia", dimensiona Tucci. Por isso, os especialistas concordam: a solução é conjunta, sem considerar divisas entre municípios. A capital mineira, Belo Horizonte, fechou córregos, impermeabilizou canais e padece com as inundações em plena região central. Mas registra uma iniciativa positiva: "Cada metro quadrado de área impermeabilizada por um shopping, por exemplo, tem de ser compensado com retenção equivalente de água", diz Machado. Curitiba também faz a mesma exigência. "Já há muitas iniciativas sendo executadas por aí", comemora Miranda.

Convencer e sensibilizar - "Infelizmente é verdade que investir em saneamento não tem visibilidade eleitoral e não dá votos", aceita Machado Filho, referindo-se àquela parte subterrânea de canalizações de água, esgoto, galerias e efluentes sanitários. Ele relata um esforço hercúleo para convencer as instâncias decisórias, especialmente prefeitos, da importância de encontrar soluções para a drenagem urbana. "Temos de trabalhar muito para sensibilizar, em larga escala, sobre a necessidade de ações em drenagem", descreve Machado. "Não basta (às prefeituras) só elaborar os projetos de drenagem; tem de fazer um minucioso planejamento de ocupação do solo", explica.

Numa frase, Machado diagnostica todo o problema: "O setor público não tem gente qualificada: é frágil, não sabe fazer encomenda; as empresas (que prestam serviços no segmento) tem baixa qualificação técnica. O problema é geral", afirma. Soluções tópicas tendem apenas a gerar novos prejuízos e transferir o problema para adiante, concorda. Diante de tudo isso, observa Baptista, a opção mais adequada acaba sendo a mais simples. "Qual prefeito quer deixar de inaugurar um asfalto novo no bairro pobre para investir em obras que vão beneficiar o município de baixo?", pergunta o engenheiro.

O baixo apelo eleitoral do tema é um dos percalços a ser vencido. Outro: as prefeituras não têm estrutura ou condições técnicas para realizar estudos e projetos com o mínimo de fundamentação e qualidade. Nem capacidade financeira. "Muitas cidades não conseguem sequer aprovar o financiamento na Caixa, por incapacidade de endividamento, que é o passo inicial para a obra", chama a atenção o diretor de investimentos. As cidades de Canoas e Pelotas (RS) passaram por reprovação bancária recentemente. "Acredito que o gestor nacional deveria dar suporte às cidades na capacitação e no desenvolvimento de projetos sustentáveis", propõe Tucci, ao avaliar a atuação federal.

Bilhões do PAC - Manoel Machado é o responsável pela chamada pública que definiu os 186 projetos que integram o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) da Drenagem, lançado em junho passado, inicialmente ao custo de quase R$ 4,7 bilhões. Cerca da metade é dinheiro orçamentário da União; a outra, fruto de financiamentos públicos, com dinheiro do FGTS/FAT, via Caixa Econômica Federal e Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Ao todo, informa, o programa já possui 257 contratos para drenagem no valor de R$ 6,1 bilhões (do total de R$ 25 bilhões destinados ao PAC do Saneamento Urbano), consideradas obras de 2006/07. Para 2009, Machado espera alcançar R$ 34,2 bilhões em empreendimentos selecionados para contratação. Mesmo com o diagnóstico em mãos e o esforço isolado do governo Lula, os problemas permanecem e indicam um cenário de agravamento da situação nos próximos anos, segundo Tucci. "Apesar da boa vontade do atual governo em investir nisso, existe um grande desconhecimento técnico nas prefeituras e nas entidades que aprovam os projetos (do PAC). Não vejo na situação nenhuma luz no horizonte, apenas a de uma locomotiva correndo no nosso sentido", opina. Tucci é um crítico de soluções tradicionais, estruturantes. "Não basta dinheiro; é necessário inteligência e menos corrupção", ensina o professor, enveredando pela desconfiança geral segundo a qual grandes obras costumam servir a interesses pouco republicanos.

"Não conheço todos os projetos (do PAC), mas a maioria é sobre canalização, que é mais um problema que uma solução; tenho receio que esse dinheiro (os R$ 6,1 bilhões já contratados) será utilizado para aumentar as inundações", diz, com desalento, Tucci. Já Miranda e Machado identificam uma recente mudança de atitude do governo em relação ao tema, depois de incisivas intervenções do Conselho Nacional de Saúde (CNS) e do Conselho Nacional de Cidades, a partir de 2007. Eles também consideram a criação da SNSA uma vitória do governo Lula, pois recolocou o tema na pauta nacional e dá eco às cobranças dos dois conselhos, que ganharam relevância ao ampliar a participação de movimentos sociais. E há órgãos, como a Funasa, que têm iniciativas próprias - nesse caso projetos para cidades com mais de 50 mil habitantes.

 
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