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Defesa Nacional - O espírito de Heitor

2008 . Ano 5 . Edição 46 - 08/08/2008

Por Edla Lula, de Brasília

O Brasil almeja o status de grande potência e pretende se impor ao mundo com direito a voz. Tem dado demonstrações disso em diversas frentes, como na Organização Mundial do Comércio (OMC) - criou o G20 (países em desenvolvimento) e vem incomodando o G8 (países desenvolvidos mais a Rússia) na briga por mais respeito aos países emergentes; quer uma participação no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU). No campo econômico, já alcançou o grau de investimento, que dá aos credores a segurança necessária para aplicar seus recursos no país, e deseja emplacar o desenvolvimento.

Em meio a essas pretensões, surge o debate sobre o que é necessário para garantir a inserção soberana do país no mundo, e o primeiro item da pauta é repensar o modelo de defesa nacional, de modo a resguardá-lo contra possíveis ataques. "Nosso pacifismo e nossa afortunada situação de falta de inimigos não nos eximem da responsabilidade de nos defender", alerta o ministro-chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República, Roberto Mangabeira Unger, que foi encarregado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva de desenhar, junto com o ministro da Defesa, Nelson Jobim, o Plano Estratégico Nacional de Defesa.

Para elaborar o plano, o presidente Lula instituiu, em setembro do ano passado, o comitê presidido por Jobim e com coordenação de Mangabeira. "Até o mais pacifista entre os grandes países cria o seu escudo de proteção e prepara os seus filhos para dar a própria vida pela Nação, medir até onde vai a capacidade de sacrifício da Nação", diz Mangabeira, numa alusão a um fato histórico de 30 séculos, a Guerra de Tróia.

Segundo o ministro Mangabeira, a idéia, como no épico, é fazer com que cada brasileiro empunhe esse escudo, incorpore o "espírito de Heitor" para garantir a paz em sua Tróia, defendendo- se de possíveis invasores, até o extremo do sacrificar-se. "Se o Brasil quiser desbravar um caminho singular e rebelde no mundo e se quiser ter margem para construir um modelo próprio de desenvolvimento, precisa ter escudo", diz Mangabeira.

PREMISSA BÁSICA  A constituição do país como Nação depende claramente de uma estrutura de defesa. Só quem tem defesa pode dizer não. E dizer não é condição absoluta para operar com autonomia internacional", acrescenta o ministro Jobim. Ele considera a criação de uma estratégia de defesa como premissa básica para o desenvolvimento de um país.

Para Mangabeira, existe um "vínculo indissolúvel" entre o projeto de desenvolvimento e o projeto de defesa. É por esse prisma que os ministros pretendem inscrever o tema na agenda nacional, tarefa considerada difícil pela falta de tradição brasileira no trato com o assunto. "Toda discussão sobre defesa que se tinha era exclusivamente militar. Os políticos pós-regime militar tinham dificuldade de tratar o assunto porque tinham no imaginário que a defesa estava vinculada à repressão política, e acabaram abandonando. Como conseqüência, os temas de defesa saíram da agenda nacional", diz Jobim.

Também o Congresso Nacional começa a mudar de postura, tanto que criou a Frente Parlamentar de Defesa Nacional, da qual participam mais de 200 deputados e senadores de partidos diversos e conta ainda com a participação de acadêmicos e especialistas da área. A frente terá a missão de atuar, no âmbito do Congresso, no exame de um adequado sistema de defesa voltado para a preservação da soberania nacional e do Estado Democrático de Direito.

Já está na pauta a nova política de defesa nacional, bem como a criação do Conselho Sul-Americano de Defesa, proposta encaminhada pelo Brasil aos presidentes de todos os países da região, que até o final do ano deverá ser oficialmente instituído. "Tem crescido a projeção brasileira no âmbito global, e isso coloca como premente e como urgente uma revisão de toda a doutrina na área de defesa do país", afirma o deputado Raul Jungmann (PPS-PE), presidente da Frente Parlamentar

MUDANÇA DE ORDEM  O ministro Mangabeira divide o posicionamento brasileiro no mundo em duas fases. A primeira delas trata de lutar por uma representação mais equânime dos países emergentes nas organizações existentes, como é o caso do Conselho de Segurança da ONU ou da OMC. "Muito mais importante seria uma segunda fase, de lutar por uma mudança da ordem", diz, ao recordar que toda a reestruturação do mundo após a Segunda Guerra Mundial se deu de maneira muito hostil, com algumas grandes potências impondo as regras sobre as demais.

Esta mudança só ocorrerá, segundo Mangabeira, pela dialética entre a pressão para que ela aconteça e a luta pela construção de projetos nacionais fortes. "Queremos um mundo de democracias, mas não queremos que esse mundo de democracias imponha a todos os países uma única fórmula. Estes projetos nacionais fortes exigem o escudo, não só contra as agressões, mas também contra as intimidações."

Mangabeira põe no centro do debate a indagação sobre quão grande o Brasil deseja ser e o quanto está disposto a sacrificar-se por esta causa. "Defesa tem a ver com o sacrifício. Em última instância, o sacrifício da própria vida, mas, antes disso, o sacrifício do tempo de nossa juventude e de nossos recursos. É uma questão de consciência nacional", diz.

CONFLITOS ASSIMÉTRICOS  O Plano Estratégico Nacional de Defesa pretende criar novos paradigmas, a partir de uma nova doutrina militar. "Estávamos habituados a tratar a defesa na perspectiva de uma guerra simétrica, com conflitos de Estado contra Estado. Como o Brasil não tem inimigos, as pessoas não falavam sobre isso. Hoje, há uma percepção clara de que os conflitos modernos não são os conflitos convencionais, são assimétricos, em que você tem um conflito de um Estado nacional com organizações criminosas, tem organizações não-estatais", comenta Jobim.

A primeira das três pernas que sustentam o plano refere-se à configuração, à reorientação e ao equipamento das Forças Armadas. "A reorganização das forças significa a adequação estrutural do perfil da organização das forças à nova realidade do mundo e do Brasil", explica Jobim. O comitê - composto também pelos ministros do Planejamento, Orçamento e Gestão, da Fazenda, da Ciência e Tecnologia e pelos comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica - trabalhou com diversas hipóteses de emprego das Forças Armadas em situações de paz e de guerra, nas perspectivas de um "triplo imperativo" que envolve o monitoramento, a mobilidade e a presença.

No caso do monitoramento, o objetivo é assegurar que dentro do universo das tecnologias com que as forças monitoram o território e as fronteiras terrestres e marítimas haja inteiro controle nacional. "Não é a nossa situação hoje. Não só dependemos de tecnologia estrangeira, como também dependemos da compra comercial de imagens estrangeiras de nosso próprio território e de nossas próprias fronteiras", observa Mangabeira.

SEGUNDO ELEMENTO A mobilidade, segundo elemento do trinômio, é considerada fundamental, tendo em vista a dimensão geográfica e a diversidade brasileiras. Em vez de tropas em cada ponto, o país investiria em unidades de alta mobilidade e poder de fogo que poderiam deslocar-se, com rapidez, para qualquer área do território. O último imperativo é a presença, que está interligada aos outros dois elementos. "Não podemos estar onipresentes. Por isso, a eficácia do monitoramento exercido por uma unidade de fronteira depende de ela fazer parte de um sistema integrado de monitoramento, a partir da terra, do ar e do espaço sideral", avalia Mangabeira.

A partir deste "triplo imperativo", o plano formula a proposta para a reorganização das três Forças Armadas. Mangabeira cita o exemplo do Exército, que conta hoje com uma parte relativamente mais avançada, chamada de Força de Ação Estratégica Rápida (Faer), que envolve apenas 10% do seu efetivo. A proposta é que todo ele seja reorganizado no nível da brigada modular, que é o componente básico do Exército, a partir do modelo da Faer. "Em vez de o Exército ter dentro de si uma vanguarda, todo o Exército viraria uma vanguarda", diz.

Essa nova cultura militar exige mudanças no relacionamento entre as três forças, que terão que ter a capacidade de atuar em rede "com os outros elementos da própria força e com as outras forças no monitoramento da superfície da terra e do mar". O aspecto mais complexo, no entender do ministro Mangabeira, é a capacidade que os indivíduos terão que assumir para aceitar a própria mudança de paradigmas. "A força regular, sem perder as suas características de hierarquia e de disciplina, tem que ganhar os atributos historicamente associados a uma força irregular, inclusive a sua extrema flexibilidade no teatro de operações: o guerreiro vira também um guerrilheiro", explica.

O OUTRO PÉ  A segunda parte do tripé é a reconstrução da indústria nacional de defesa. O plano vislumbra a elaboração de um modelo legal regulatório, com tributação especial para as empresas privadas de defesa, que assegure a continuidade nas compras públicas e que até mesmo exima as empresas privadas de defesa das regras gerais de licitação. O Estado, por sua vez, passaria a exercer um poder estratégico sobre as empresas, podendo, inclusive, impor uma lista de equipamentos a partir dos interesses nacionais.

Outra prerrogativa fortemente defendida por Jobim é o compartilhamento do conhecimento nas parcerias internacionais. "Não se pode ter uma força dissuasória, que é necessidade brasileira, com base em insumos exclusivamente estrangeiros. O Brasil não vai ser um comprador de prateleira. Queremos fazer negócio para desenvolvermos a capacitação nacional", diz Jobim.

"Vamos insistir para que em nossas parcerias com países estrangeiros, em matéria de tecnologias de defesa, não sacrifiquemos o futuro ao presente. Que toda parceria seja pautada pelo critério de colaborar para o fortalecimento de nossas capacitações tecnológicas independentes", acrescenta Mangabeira.

A COMPOSIÇÃO DAS FORÇAS  Armadas é a terceira perna de sustentação do plano e inclui a discussão sobre o serviço militar obrigatório. A idéia central é resgatar um pressuposto republicano de que as Forças Armadas sejam "a própria nação em armas".

Entra aí a exigência de que as três Forças contem com soldados profissionais e preparados intelectualmente. "É bom que nas academias militares haja um número cada vez maior de jovens pobres, da classe trabalhadora. Mas não seria bom para o país que o oficialato fosse recrutado apenas nessa classe", ressalta Mangabeira. Sobre o serviço militar obrigatório, o programa apresenta, segundo Mangabeira, um espectro que vai de "soluções minimalistas", como manter a situação como está hoje, até as "maximalistas", com a efetiva obrigatoriedade do serviço atingindo as várias classes sociais.

"Como está hoje, é apenas formalmente um serviço obrigatório e, na realidade, é um serviço voluntário", diz. A intenção não é aumentar o efetivo das Forças Armadas, mas qualificar o efetivo. O que ocorre agora, na prática, é que serve quem quer, pondera o ministro. Mangabeira defende que a Nação precisa decidir se ela prefere Forças Armadas formadas só pela juventude pobre. Caso seja essa a solução, o caminho é oferecer a esses jovens, normalmente com baixo nível de escolaridade, educação regular, além da militar.

SOLUÇÃO MAXIMALISTA  A solução maximalista, defendida por Mangabeira, tem duas partes. Uma propõe fazer o serviço militar obrigatório ser realmente obrigatório. Para isto, é preciso que as Forças Armadas escolham quem elas querem que prestem o serviço militar. Neste caso, os critérios propostos são a conjugação do rigor físico com a capacidade analítica e a representação de todas as classes e regiões do país.

A segunda parte sugere que quem não prestar o serviço militar obrigatório prestará o serviço social obrigatório, de preferência numa região do país diferente de onde ele se origina, de acordo com a sua direção profissional, como o estudante de arquitetura que ajudaria a desenhar casas populares ou o estudante de medicina cuidando da saúde pública. Esses prestadores de serviço social receberiam um treinamento militar rudimentar para poder compor uma força de reserva mobilizável, em caso de necessidade.

"Não é ou tudo ou nada. O que é importante em primeiro lugar é que a Nação compreenda que há diferentes rumos. Alguns muito mais ambiciosos e muito mais exigentes em termos de sacrifício do que outros. Por mim, como cidadão, eu vou advogar pelo mais ambicioso e que exige mais sacrifícios", diz Mangabeira, ao defender a solução maximalista. que as Forças Armadas escolham quem elas querem que prestem o serviço militar.

 
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