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Federalismo - Um novo pacto em meio à reforma tributária

2008 . Ano 5 . Edição 41 - 16/03/2008

Por Edla Lula, de Brasília

A reforma tributária encaminhada pelo governo ao Congresso Nacional detona uma discussão que vai além de receitas e gastos - uma nova agenda federativa,mais solidária e justa. "Reformar significa rever a questão tributária,mas também o regime de transferências e o regime de financiamento das políticas sociais", defende o economista Fernando Rezende, autor do recém-lançado livro O dilema fiscal: emendar ou reformar e um dos maiores especialistas no assunto. Para ele, uma proposta de reforma tributária não passa apenas por mudanças pontuais,mas por uma ampla transformação no atual modelo de federalismo fiscal.

Rezende, que é professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) no Rio de Janeiro e foi presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) de 1996 a 1998, compara o federalismo ideal a uma plataforma de petróleo, que se apóia em quatro longas pernas. "Elas têm que ser, obviamente,do mesmo tamanho,senão o conjunto fica desnivelado, e, se ficar desnivelado como ficou a plataforma P-36, afunda", diz.

Os quatro pilares sugeridos para o caso de federalismo são um regime equilibrado de repartição das competências para tributar, no qual a distribuição da arrecadação se dê de uma maneira mais equilibrada entre o governo federal, os estados e os municípios; um regime de equalização fiscal, que são transferências que assegurem um mínimo de orçamento àquelas regiões onde a economia não permite uma boa arrecadação; um regime de cooperação financeira nos programas sociais -"esses programas que o Estado precisa garantir a todo cidadão, com um padrão mínimo de atendimento de serviços públicos"-; e uma política de desenvolvimento regional para garantir que todos os estados e regiões brasileiras convirjam para um patamar de crescimento mais equilibrado.

"Se reconstruirmos essas quatro pernas, teremos um modelo de federalismo fiscal de que o Brasil precisa agora", preconiza Rezende. O dilema é que essa reengenharia não é tarefa fácil quando se considera o tamanho do país e as suas disparidades regionais."Não se pode tratar os desiguais como iguais", recorda outro estudioso do assunto, o pesquisador do Ipea Rogério Boueri Miranda, autor do livro Política Fiscal e Finanças Públicas.

Para Boueri, o federalismo brasileiro não funciona bem porque não há regras diferenciadas que considerem a realidade de cada cidade ou estado."É muito difícil, nas federações, estabelecer regras diferentes para os mesmos entes.É muito mais fácil ter uma regra que valha para todos. No Brasil isso é um problema porque há uma diversidade muito grande em termos regionais", acrescenta o pesquisador.

URGÊNCIA Os estudiosos que se debruçam sobre o tema do federalismo defendem a urgência na consolidação de um novo pacto federativo, com mudanças não só na forma de arrecadar, mas também na forma de transferir e gerir os recursos entre as esferas de governo. "O mundo está com um processo de mudança cada vez mais rápido. Se levarmos dez anos para isso, vai ser tarde demais", diz Rezende. "Precisamos implementar esse novo modelo em cinco anos", completa, lembrando que a Índia, país que apresenta contexto semelhante ao brasileiro, estabeleceu prazo até 2010 para finalizar a sua harmonização.

O secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda,Bernard Appy, um dos responsáveis pela formulação da recente proposta de reforma tributária encaminhada ao Congresso Nacional, reconhece que ela não aprofunda a questão das responsabilidades federativas e os critérios de repartição. Por causa da complexidade do tema, Appy prefere jogar o início dessa discussão para alguns semestres adiante. "Estamos propondo repensar quais são as competências da União, dos estados e dos municípios junto à população e como financiar adequadamente estas competências. Agora, essa é uma discussão que deve ser feita em bases muito racionais. É longa, complexa, mas necessária se nós queremos melhorar o desenho federativo do Brasil", afirma.

Paulo Ziulkoski, presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), entidade que reúne federações e associações municipalistas e costuma realizar "marchas a Brasília", tem um entendimento diferente: "Não dá para discutir reforma tributária sem discutir a máquina", diz. Ziulkoski cita as discrepâncias entre as transferências feitas para os municípios para o setor da educação, por exemplo, e o custo real pago pelas prefeituras. Enquanto o governo federal repassa R$ 100,00 por criança atendida em creche pública, o custo do serviço é de R$ 283,00. "Como é que a gente vai fechar essa conta? É hora de chegar a um entendimento para essas coisas", questiona Ziulkoski.

Boueri diz que, do ponto de vista do federalismo fiscal, caberia negociar com os entes da federação mudanças que contemplassem tanto a arrecadação quanto as transferências e as responsabilidades. "Quando não se tem uma definição clara, ou se onera demais alguns dos entes ou se desestimula os entes a participar de certos programas em virtude da perspectiva de serem onerados mais na frente. Quando se discute tudo ao mesmo tempo, não acontece um remendo, mas fica estruturado para dar certo."

Dessa forma, para ele, um novo pacto federativo só poderia ser firmado no momento em que, além do conjunto de impostos, o país repensasse formas de gerar mais autonomia para estados e municípios arrecadarem mais e, ao mesmo tempo, tornasse desnecessária a transferência de recursos da União. Além disso, Boueri acredita ser importante redefinir as responsabilidades dos entes federativos sobre a administração dos recursos.

DISPARIDADES Um dos maiores desafios a serem enfrentados na discussão do federalismo fiscal são as disparidades entre as receitas de estados e municípios. O orçamento por habitante do Maranhão, um dos mais pobres do país, é quase a metade do orçamento de Sergipe. Na região Norte, o Pará tem um terço da receita per capita comparativamente a Roraima.

No âmbito municipal, há disparidades maiores, com vários pequenos municípios tendo orçamentos per capita maiores que os das grandes cidades. Ziulkoski cita o exemplo de Paulínia (SP),município de 42 mil habitantes que arrecada o equivalente à soma de 242 municípios com a mesma população.

Em parte, essa defasagem se explica pela forma com que se distribui a arrecadação do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Atualmente, 25% do ICMS é destinado aos municípios do estado em que é recolhido, e, desses 25%, dois terços são distribuídos proporcionalmente ao valor adicionado do produto. O resultado é que municípios em que estão instaladas grandes unidades produtoras, como uma refinaria de petróleo, recebem elevado valor per capita.

Somente no Estado de São Paulo, segundo dados do Ministério da Fazenda, de 2006, a diferença entre o menor e o maior valor de repasse é de quase 140 vezes."Obviamente justifica-se, sim, com uma transição longa, porque essas coisas não se mudam do dia para a noite, enfrentar essa situação de grande iniqüidade que existe hoje", diz Appy, ao comentar o dispositivo presente na proposta de reforma tributária que prevê mudanças na partilha do ICMS.

"Temos assistido na federação brasileira a um processo acentuado de antagonismos, disputas e desconfianças. Cabe reconstruir esse complexo arranjo fiscal para promover a cooperação entre os entes e, mais do que isso, eliminar esse antagonismo que cria enormes dificuldades inclusive para a coesão da federação brasileira", avalia o professor Fernando Rezende.

CONSTITUIÇÃO Rezende explica que a raiz das discrepâncias na divisão do bolo tributário brasileiro está no processo que culminou na promulgação da Constituição, em 1988. Construída num momento em que o país fazia a transição do regime militar para a democracia, a Constituição sofreu pressão, segundo o professor, de um lado, dos estados e municípios por maior autonomia e maior poder tributário e financeiro e, do outro, dos movimentos sociais, que clamavam pela universalização dos direitos da cidadania, como previdência, saúde e educação.

"Essas duas pressões geraram uma forte descentralização,por um lado, e novas responsabilidades, por outro, para o governo federal", comenta. Como, de lá para cá, o país passou por sucessivas crises econômicas, os estados e municípios acabaram não materializando a autonomia para tributar, uma vez que não havia receita. Do seu lado, o governo federal teve que assumir todas as novas responsabilidades criadas com a ampliação dos gastos sociais.

A solução foi aumentar a carga tributária, através, principalmente, do aumento das contribuições sociais, que não precisam ser repartidas com estados e municípios. "As contribuições sociais representaram uma progressiva perda de qualidade porque introduziram impostos de má qualidade." Além disso, houve uma nova centralização das receitas na instância federal, com as transferências vinculadas a programas específicos.

Essa interferência do governo federal sobre as decisões de gastos na ponta significou perda de autonomia para os outros entes. Os desdobramentos dessa situação levaram aos atuais debates em torno da carga tributária, qualidade dos impostos e deficiências da gestão pública. "Precisamos eliminar essa dualidade de regimes tributários, com a existência de impostos e contribuições", sugere Rezende.

Em parte, a reforma tributária enfrenta este problema quando funde as contribuições e cria o Imposto sobre Valor Agregado Federal (IVA-F). O novo imposto também amplia as bases de transferências dos fundos de participação, o que recompõe o equilíbrio federativo, com mais autonomia para estados e municípios.

SOLIDARIEDADE O desafio colocado à repactuação entre os entes federativos é definir as competências e garantir a cooperação, de maneira que haja mais justiça fiscal."Em um país como o Brasil é muito difícil definir com precisão a quem cabe fazer cada coisa", salienta Fernando Rezende.Aos municípios cabe cuidar, por exemplo, da educação,mas é comum não haver recursos humanos qualificados."Um só figurino não atende a todas as diferentes situações, porque o Brasil é muito desigual", diz Rezende.

Ele sugere a implantação de um regime de equalização fiscal, com o governo federal transferindo recursos para diminuir as disparidades e os estados e municípios ajudando uns aos outros no financiamento das políticas sociais."É mediante uma recomposição desse regime de transferências que se podem introduzir mecanismos de cooperação. Dessa forma, aqueles municípios que têm condições de assumir na integralidade o ensino fundamental podem dispensar transferências. Mas aqueles que não podem, vão ter que contar com alguma ajuda."

Além da cooperação financeira, Rogério Boueri, do Ipea, propõe a solidariedade na gestão, com uma nova pactuação em torno do bom uso dos recursos e melhoria na eficiência dos gastos. "Eficiência é o quanto se faz em relação a quanto se gasta", diz. Para ele, aumentar eficiência é gastar menos ou fazer mais.

"Não tenho dúvida de que o crescimento da economia, a inclusão social e o fortalecimento das políticas sociais vão, ao longo do tempo, criar esses novos mecanismos de cooperação entre União, estados e municípios", opina o subchefe de Assuntos Federativos da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República, Alexandre Padilha. Para ele, o país já entrou num processo de implementação do novo pacto federativo.

O marco foi a participação, pela primeira vez, de um presidente da República na marcha dos municípios, em 2003. A partir daí, segundo Padilha, vários passos foram dados à construção de instâncias de diálogo e negociação. Um exemplo foi a criação do Comitê de Articulação Federativa (CAF), em 2003, a partir da reivindicação da marcha dos municipalistas.

O CAF já alcançou diversas vitórias para os municípios, como a aprovação da lei que ampliou a arrecadação do Imposto Sobre Serviços (ISS), a reestruturação do Sistema Unificado de Saúde (SUS) e a criação do Sistema Unificado de Assistência Social (Suas).Padilha também cita a participação dos municípios no processo de elaboração e acompanhamento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e na própria Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que trata da reforma tributária.

"A repactuação da federação se dá quando se constroem e se estabelecem competências e responsabilidades para estados e municípios,mas sobre compromissos nacionais. Porque a federação é um instrumento estratégico do fortalecimento do projeto nacional", afirma. Isso, diz ele, significa enfrentar as desigualdades regionais, promover a inclusão social, uma educação de qualidade e retomar o desenvolvimento.

 
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