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Integração - Contra a Alca

2008 . Ano 5 . Edição 39 - 25/01/2008

Por Jorge Luiz de Souza, de São Paulo

rd39not03img01RicuperoDesafios - Mudou o conceito de regionalismo?
Ricupero - Ficou muito mais amplo devido ao avanço da globalização, em termos de comércio, de investimentos e também de fluxos financeiros. Mas permanece válida a idéia de que os acordos regionais são cada vez mais uma opção preferida por muitos países para procurar explorar suas vantagens comparativas e também as vantagens de vizinhança, proximidade e complementaridade. É importante assinalar que os Estados Unidos, o país que mais se beneficiou com a globalização comercial, até os anos 1980 se opunham como princípio a qualquer acordo que não fosse multilateral no âmbito do Gatt (o Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio - em inglês, General Agreement on Tariffs and Trade), e só tinham aberto uma exceção ao caso da Europa por razões estratégico-militares, devido a problemas como a ameaça comunista. Então, assinaram acordo de livre comércio com Israel, com o Canadá, e passaram a ter uma política deliberada de acordos regionais.

Desafios - Os acordos bilaterais atrapalham os acordos regionais?
Ricupero - A Comissão das Nações Unidas para Comércio e Desenvolvimento (Unctad) faz distinção de acordos entre parceiros que não têm entre si uma grande assimetria. A Unctad sempre promoveu acordos entre países em desenvolvimento, países que pertencem mais ou menos a um nível comparável de competitividade. Mas nunca viu com bons olhos acordos do tipo Norte-Sul, sejam bilaterais, sejam regionais. Advertiu os países em desenvolvimento de que acordos como os promovidos pelos Estados Unidos - a Área de Livre Comércio das Américas (Alca) ou o Tratado Norte-Americano de Livre Comércio (Nafta - em inglês, North American Free Trade Agreement) - com o Canadá e o México têm embutido um conteúdo muito grande de assimetrias e desigualdades. A tendência é que o parceiro mais fraco tenha menos benefícios e seja obrigado a fazer maiores concessões.Ultimamente, mesmo o Banco Mundial (BM) começa a acompanhar a Unctad e a mostrar que esses acordos Norte-Sul, seja com os Estados Unidos, seja com a União Européia, são muito duvidosos, do ponto de vista de países em desenvolvimento, uma vez que eles vão além do terreno puramente comercial. Em geral os parceiros mais desenvolvidos fazem exigências em matéria de propriedade intelectual, de investimentos e de serviços, e acabam com isso criando muitas limitações ao desenvolvimento posterior do parceiro mais fraco.Quando o acordo bilateral é entre dois países em desenvolvimento, não perturba a integração regional.

Desafios - A Alca também é um exemplo de acordo com enorme assimetria?
Ricupero - Sou totalmente contrário à Alca, que é a posição da Unctad. O Brasil fez muito bem em não ter aceitado o acordo. Não teria sido viável manter o Mercosul, teria sido engolido em pouco tempo. Quando se fala em simetrias, é preciso não imaginar uma igualdade aritmética. Como em um campeonato de futebol, em que há série A e série B. Em cada série os times têm força comparável. Todos podem aspirar a disputa, enquanto um que está numa série abaixo é tão fraco que não tem a menor chance. Países desenvolvidos, como Estados Unidos, os europeus e o Japão, têm um nível de desenvolvimento industrial e comercial incomparavelmente superior ao dos outros, e também em capacidade regulatória, serviços, propriedade intelectual, e de presença de agências governamentais que ditam regras nessas áreas.Os países da América Latina, África e Ásia se incorporaram à economia mundial no regime das colônias e não é de admirar que a relação comercial se faça no sentido Norte-Sul. O Brasil comemora agora os 200 anos da abertura dos portos. Até 1808, a metrópole, que era Portugal, tinha legalmente o monopólio do comércio e da navegação com o Brasil.O comércio entre o Brasil e Buenos Aires era considerado contrabando e foi durante séculos severamente reprimido.

Desafios - A independência não resolveu isso?
Ricupero - Quando esses países se tornaram independentes, já estava consolidada uma direção Norte-Sul tanto do comércio quando das vias de navegação e dos financiamentos.Ao se criar um acordo regional, tentamos voltar ao curso natural inibido pelo colonialismo. O Brasil tem dez vizinhos territoriais e 17 mil quilômetros de extensão de linhas fronteiriças, mas só temos ligação por terra razoável, e mesmo assim recente, com dois ou três desses vizinhos. Espanhóis, portugueses, ingleses e holandeses não tinham interesse em fazer as estradas. Nunca conseguimos integrar por estrada de rodagem o Amapá com a Guiana Francesa porque a Legião Estrangeira terminou a estrada a 50 quilômetros da nossa fronteira, em Saint-Georges.Quem usa o argumento de que Mercosul está promovendo artificialmente vantagens de comércio se esquece de que o padrão atual foi criado pelo colonialismo. Quando se faz um acordo com os Estados Unidos, apenas se reforça essa tendência. Por isso, a Unctad promove a idéia de acordos entre os africanos, os asiáticos, entre os países latino-americanos, para começar a explorar a vantagem da contigüidade.A integração regional é o primeiro passo para fazer aquilo que os europeus têm desde a Idade Média, que é uma rede de estradas, de integração, de infra-estrutura.

Desafios - A politização do Mercosul cria algum obstáculo adicional?
Ricupero - Nós temos alguns países que já se integraram ao espaço econômico norte-americano - México, América Central, países do Caribe.Agora,os Estados Unidos assinaram acordos também com o Peru e a Colômbia. Então,o espaço que existe para a integração genuinamente sul-americana são os países que não estão nesse grupo. Não sou contrário à integração da Venezuela.A ressalva que eu faço é sobre a necessidade de essa integração ter um componente comercial efetivo. Para entrar em qualquer acordo regional, é preciso aceitar o conjunto de regras daquele acordo e assinar um cronograma de redução de suas tarifas em relação àqueles países. No caso da Venezuela, esse processo ainda está um tanto atrasado porque se deu atenção preferencial para o lado político da discussão.Mas eu acho que, desde que eles aceitem esse cronograma de redução de tarifas e se integrem ao conjunto de acordos, eu não vejo nenhum obstáculo à entrada deles e de nenhum outro país.

Desafios - O Chile também fez acordo com os Estados Unidos...
Ricupero - O Chile negocia muito pragmaticamente e não abre mão de certas preferências. Protege muito seu mercado agrícola. Então, nada impede que o Mercosul faça o mesmo.Quando criticam o Mercosul, se esquecem de que o acervo que ele realizou é gigantesco, muito maior do que esses problemas que ainda persistem. Basta olhar os números. Os problemas que existem incidem sobre 6% ou 7% do total dos produtos. Na imensa maioria dos casos, a integração tem avançado muito.O aspecto do investimento nos últimos anos se desenvolveu muito. Começa a haver integração no nível das empresas. Antes,não havia empresas brasileiras, argentinas e mexicanas produzindo em todos esses países, só havia multinacionais. E elas influíam para que fizéssemos acordos de integração setorial, e determinavam que suas filiais no México, na Argentina e no Brasil se especializariam em determinados produtos e exportariam para os outros.Na época, não havia outro caminho. Hoje, a integração não pode ser só comercial, é também no terreno produtivo.

Desafios - E a vulnerabilidade do Mercosul?
Ricupero - O grande ponto fraco do Mercosul e em geral desses acordos entre países em desenvolvimento é que eles muitas vezes não conseguiram dar aos parceiros menores um impulso para que eles pudessem mudar sua estrutura produtiva. Há certa razão na queixa de países como o Uruguai e o Paraguai, que, apesar de estarem há muitos anos no Mercosul, não conseguem ampliar o acesso ao mercado. Isso acaba sendo um ponto fraco. Se não houver um ganho para todos, os menores acabam desenvolvendo esse sentimento de que não estão tendo os benefícios esperados. Eles têm um certo fundamento em se queixar porque não houve um esforço deliberado para ajudá-los nesse particular. É mais com o Uruguai. Isto explica muito esse problema que tem havido com as papeleras.

Desafios - O relatório da Unctad fala de uma frustração com a lentidão dos acordos multilaterais...?
Ricupero - Dos multilaterais e também desses acordos entre países em desenvolvimento, que têm um grau de eficácia menor. O próprio Mercosul até hoje pouco fez na área de serviços,que é uma área quase virgem, e no entanto é importante. São acordos pouco agressivos. Por exemplo, as últimas reuniões do Mercosul têm se perdido em discussões políticas, quando se tem um campo maravilhoso aí. Só no caso de serviços, abriria toda uma nova área de integração. Na área de mão-de-obra, comparando com a União Européia, estamos muito lentos.Uma das razões, e o Brasil tem uma certa responsabilidade, é que não se dotou o Mercosul de um secretariado permanente, como a União Européia tem desde o início. O que mais ajudou o processo europeu foi a criação de um Executivo em Bruxelas - a Comissão Européia.O Mercosul só fez isso muito tardiamente, e tem um secretariado, de tão poucos recursos, que é quase como que não existisse.

Desafios - O Uruguai tinha uma explícita candidatura a sediar o secretariado...
Ricupero - A vantagem de um Executivo forte é que ele tende a ver as coisas de um prisma mais coletivo, e não do ângulo individual de cada país.A falta dele e de um órgão efetivo para resolver controvérsias - nós temos um, mas é muito fraco - explica o avanço lento do Mercosul. Na Comissão Européia, em Bruxelas, cada país nomeia um comissário, que não tem poder acima de cada governo, recebe instruções do seu governo, mas é bastante ativo, tem muito poder de iniciativa. Nesse ponto, o Mercosul e a maioria dos acordos entre países em desenvolvimento são muito débeis como estrutura de funcionamento.

Desafios - E quanto à relação de integração com países não contíguos?
Ricupero - O comércio Sul-Sul passou a ser uma realidade muito importante. O relatório da Unctad mostra que o comércio entre países em desenvolvimento já atingiu um volume respeitável, sobretudo graças ao enorme desenvolvimento do comércio da China e dos países asiáticos em geral. O que está faltando, inclusive para nós do Mercosul, é estabelecer pontes com os processos de integração de outros continentes. Por exemplo, estabelecer ligações entre o Mercosul e a Associação de Nações do Sudeste Asiático (Asean), acordos entre o Mercosul e a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), que inclui a África do Sul e Moçambique, entre outros países. Eles têm seus acordos regionais,mas não tem havido pontes entre os continentes. Esse vai ser o desafio a partir de agora, de estabelecer mecanismos entre países em desenvolvimento, mas de continente a continente, de preferência de acordos a acordos, como é o caso de Mercosul-Asean,Mercosul-SADC, etc.

Desafios - E o viés do desenvolvimento?
Ricupero - Através do comércio é que se amplia a escala do mercado. Por exemplo, o Uruguai é um país de 3 milhões de habitantes. Reduzido ao seu próprio mercado, a possibilidade de alavancar investimentos para a produção é muito pequena.Ele nunca terá uma escala de produção suficiente. Mas, se ele tiver acesso a um mercado de 200 milhões de consumidores, aumenta muito. Com a ampliação das fronteiras vai haver um impulso ao desenvolvimento industrial. E tem que ser na base, é claro, de certas vantagens comparativas. Alguns países vão se tornar melhores do que outros em determinados produtos.

Desafios - E se esses países não têm como um alavancar investimento no outro?
Ricupero - Era o sistema que nós tínhamos antes, de um mercado puramente nacional. Mas hoje em dia, mesmo um país como o Brasil, ele sozinho não tem escala para muitos produtos, sobretudo produtos mais sofisticados, que exigem uma envergadura muito maior. Só a integração é que pode dar essa escala. Uma das vantagens de o acordo de integração ser entre países similares é que é uma maneira de fazer o aprendizado para depois competir em termos globais. A competição é um jogo que tem regras, tem árbitros, mas precisa ter treinamento. E é melhor treinar com países do seu tamanho do que tentar competir diretamente com o Japão, de saída. É muito difícil. Como se ganha na escala e no aprendizado, daí a vantagem de dar certos benefícios àqueles que são do seu tamanho.

Desafios - Quais são as perspectivas para os próximos anos?
Ricupero - Apesar de todo o ceticismo que há aqui no Mercosul, ele é uma realidade irreversível. O que ele precisa é ganhar em eficácia e profundidade: entrar com decisão em áreas como a de serviços e de investimentos, tratar melhor os parceiros pequenos. Em segundo lugar, o futuro do comércio Sul-Sul, tanto com os países asiáticos quanto com os africanos, é muito promissor, e nós vamos ter que criar esses acordos entre os continentes. E, terceiro, eu sou cético com relação aos acordos com os países do Norte. Com o tempo, vai-se ver que esses acordos são limitados. Já se vê isso no caso do México, que tem esse acordo do Nafta, com os Estados Unidos, há muitos anos. É claro que foi benéfico em certo sentido, porque atraiu as indústrias ?maquiladoras?, ampliou a exportação, mas não mudou a situação de inferioridade.

Desafios - A União Européia é um exemplo melhor?
Ricupero - A União Européia nesse sentido foi muito eficaz,porque um país como a Espanha, que era muito atrasado, está hoje cada vez mais parecido aos mais altos. Nem todos, é claro, têm o mesmo desempenho. Por exemplo, dentro da União Européia, a Espanha e a Irlanda tiveram um desempenho muito bom. Já Grécia e Portugal, não. Mas a tendência daqueles que entram é de melhorar sua produção, renda per capita, etc. No caso do México com os Estados Unidos, o México tem crescido a metade do que crescem os Estados Unidos, quando ele deveria ter crescido duas ou três vezes mais, para poder reduzir a diferença. Então, verifica-se com o tempo que esses acordos assimétricos não são satisfatórios. A não ser como é o caso da Europa, que é diferente. A grande diferença entre a União Européia e o Nafta ou a Alca é que a União Européia aceitou fazer transferências financeiras maciças. Espanha, Irlanda, Portugal e Grécia receberam bilhões e bilhões de dólares, que é o que alavancou a infra-estrutura e o crescimento deles. Os americanos nunca aceitaram nada parecido.Os acordos americanos são exclusivamente em comércio. O tempo vai mostrar que eles são de um potencial limitado. Eles não vão servir como instrumento de desenvolvimento, ao contrário dos outros.

 
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