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Sociedade - Sem toga

2007 . Ano 4 . Edição 31 - 5/2/2007

Sistemas alternativos de acesso à Justiça crescem no país com o objetivo de contornar a morosidade do sistema tradicional. Conciliação, mediação e arbitragem são os métodos cada vez mais aplicados, inclusive na tentativa de levar justiça àqueles que não têm condições de buscá-la.

Por Giedre Moura, de São Paulo

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O sistema alternativo mais conhecido e bem-sucedido na esfera privada são as câmaras de arbitragem. Pelo menos duzentas câmaras de negociação estão funcionando no país

Papéis empilhados mesmo em tempos da mais alta tecnologia. É essa a imagem que surge na nossa mente quando pensamos no que é a Justiça brasileira: lenta e complexa. Ainda que a Justiça seja um direito de todo cidadão, sua capacidade de resolver problemas de forma abrangente está cada vez mais limitada. Os órgãos públicos recebem a todos que querem reclamar por algo, mas a confiança em que uma resolução virá dentro de um tempo aceitável é rara. Diante do contexto de morosidade, que não deve mudar no curto prazo, a sociedade vem criando formas alternativas, mas não menos justas, de brigar por seus direitos.

As opções ao Judiciário formal podem ser encontradas tanto em projetos públicos como em totalmente privados. Existem câmaras formais particulares - e amparadas pela lei - autorizadas a solucionar impasses. Na esfera pública, o objetivo dos projetos alternativos é levar formas de acesso à Justiça para as camadas menos favorecidas da população, que não possuem conhecimento nem mesmo recursos para pagar um advogado.

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Arbitragem O sistema alternativo mais conhecido e bem-sucedido na esfera privada são as câmaras de arbitragem. Pelo menos duzentas câmaras de negociação estão funcionando no país amparadas pela Lei n. º 9. 307, a Lei da Arbitragem, que completou dez anos em novembro de 2006 s. "Não existe ainda um censo preciso da arbitragem no Brasil. Mas as câmaras estão crescendo à medida que aumenta o conhecimento das pessoas físicas e jurídicas a respeito dessa forma de solucionar conflitos fora do Judiciário tradicional", explica Cássio Telles Ferreira Netto, presidente do Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem (Conima).

Uma câmara de arbitragem nada mais é que um corpo de júri, e os árbitros são escolhidos e aprovados pelas duas partes. Ou seja, os envolvidos no conflito escolhem um ou mais profissionais, sempre em número ímpar, para analisar a questão e, ao final do processo, dar uma resolução ao problema. Qualquer pessoa pode se tornar um árbitro, tanto um advogado como um profissional liberal, o que vale é o grau de conhecimento sobre o assunto que será julgado. " A diferença entre o árbitro e um juiz é que o árbitro é um especialista. Se for um caso envolvendo saúde, por exemplo, as partes podem optar por ter um médico que conheça profundamente o assunto", explica Carlos Alberto Carmona, advogado e professor de direito da Universidade de São Paulo (USP), que fez parte da comissão de elaboração da Lei de Arbitragem.

sociedade3_22Fonte: Conima

Levantamento aponta que existem mais de sessenta programas alternativos no país que buscam, por meio da conciliação, levar ju stiça às populações mais pobres
 

Após a indicação dos profissionais, iniciam- se as audiências. A informalidade do processo é outra diferença em relação ao Judiciário tradicional, pois a participação do advogado, embora presente na maioria dos casos, é opcional. E os termos técnicos e os jargões do direito são dispensados. Alguns processos de arbitragem são resolvidos em apenas uma audiência; outros, no entanto, podem exigir um número maior de encontros e a resolução só chegar em dois anos. Em média, os processos arbitrais duram seis meses, e o que for decidido tem valor legal, não podendo ser questionado na Justiça comum. Quem faz a opção pela arbitragem deve saber que, se não ficar contente ao final do processo, não terá direito a recursos. A Justiça comum só trabalha no processo de arbitragem quando é necessário obrigar alguém a executar a sentença - por exemplo, fazer o pagamento de uma indenização.

Exatamente pelo fato de funcionar com a mesma legalidade de uma decisão do Judiciário é que a Lei de Arbitragem demorou alguns anos para entrar em funcionamento efetivo. Marcelo Antonio Muriel, presidente da Comissão de Arbitragem da Organização dos Advogados do Brasil Seção São Paulo (OAB-SP), lembra que no início o fato de transferir para o setor privado decisões que tramitavam no Judiciário formal causou estranheza à classe jurídica. "Mas, após estudos e maior conhecimento da lei, todos chegaram à mesma conclusão: o processo é lícito e produtivo. Praticamente toda a classe jurídica é a favor da arbitragem. A OAB dá total apoio ao sistema. "Muriel lembra também que a arbitragem não é uma novidade de dez anos, ela existe há séculos. Em culturas orientais, como a japonesa, o cidadão mais velho é chamado a arbitrar, pois é considerado capaz de analisar conflitos e dar a eles uma solução que não é questionada pelos menos experientes.

O Conima informa que, atualmente, a maior parte das ações que chegam para a arbitragem - cerca de 70% - trata de questões de direito do trabalho. O restante se divide em direito comercial e empresarial, envolvendo, principalmente, discussões a respeito dos contratos. "Ações societárias também aparecem nas câmaras, e uma das vantagens que o sistema privado oferece é o sigilo, algo que não é possível no Judiciário público. Já existem empresas que efetuam contratos com outras pessoas jurídicas colocando uma cláusula arbitral, ou seja, se existir alguma controvérsia, ela terá como local de discussão uma câmara arbitral, e não o Judiciário comum", conta Ferreira Netto.

É o caso da Associação Brasileira de Franchising (ABF). O escritório associado à ABF orienta, sempre que possível, os franqueadores e franqueados a inserir a cláusula arbitral como forma de garantir que, num futuro conflito, a medida alternativa possa ser utilizada. "O varejo é um negócio muito veloz, e por isso a arbitragem é mais interessante. No caso das franquias, há uma lei específica e os árbitros especialistas têm uma visão mais clara e atualizada que a Justiça padrão", opina Thais Mayumi Kurita, sócia do Novoa Prado, escritório associado à ABF.

Na rede de concessionárias Japauto, localizada na Grande São Paulo, a arbitragem é a solução recomendada para casos complexos de conflitos com o consumidor. "Tivemos um problema com uma moto que, segundo o proprietário, pegou fogo sozinha. Estamos estudando o caso para entender o que ocorreu e não bastaria apenas arrumar a moto, seria preciso ter um instrumento legal para entrar em acordo com o proprietário num caso tão incomum", conta Elisângela Oliveira, analista jurídica da empresa. O conflito foi resolvido numa única sessão arbitral, quando os árbitros definiram que, além dos reparos, a concessionária deveria pagar uma taxa por danos ao consumidor. "O cliente ficou satisfeito e em menos de quarenta dias tudo estava resolvido. Enquanto temos casos na Justiça comum que se arrastam há anos, "diz Elisângela Oliveira.

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LimitaçõesA arbitragem não pode, porém, resolver todos os problemas legais, e sua lista de limitações não é pequena. Embora seja uma alternativa que já tenha solucionado 56 mil casos ao longo da década somente entre os associados do Conima, o sistema não pode enquadrar crimes ou a definição da guarda de uma criança, por exemplo. O mecanismo alternativo vale apenas para o que é chamado de bem disponível, ou seja, dinheiro e patrimônio privado. Discussões de particulares com estatais também não podem apelar para o juízo arbitral. "O problema é que o grande cliente do Judiciário é o poder público e, nesse caso, os sistemas alternativos não podem ajudar muito. Segundo um estudo do Superior Tribunal de Justiça (STJ), 62% dos processos nesse tribunal têm a Caixa Econômica Federal (CEF), a União ou o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) como parte. Os sistemas alternativos têm vantagens na rapidez e são interessantes, mas sozinhos não vão resolver o problema da morosidade do Judiciário brasileiro", pondera Armando Castelar Pinheiro, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Custos também são diferentes quando comparados a Justiça tradicional. A princípio, a arbitragem pode parecer mais cara, pois, embora a presença de um advogado não seja obrigatória, as partes preferem estar acompanhadas de profissionais que conhecem as leis. E, tratando-se de um serviço privado, existe o pagamento de taxas. A forma de cobrar geralmente está baseada em um percentual da ação que pode chegar a até 10% do valor do processo. No Judiciário, a taxa é 1%. "Mas é preciso ver que as empresas pensam diferente. Pagar uma taxa inferior e ficar muito tempo na Justiça não é interessante. A rapidez compensa o preço em muitos casos", avalia Aparecido Scorsato, diretor do Conselho Arbitral do Estado de São Paulo (Caesp).

Hora de conversar Mediação e conciliação são outras metodologias alternativas na busca por uma solução de controvérsia. A mediação, como o próprio nome diz, emprega no processo um mediador que tenta chegar, junto com as partes, a uma solução sem que seja expedido um documento oficial, como na arbitragem. O mediador também é escolhido em comum acordo entre os beligerantes, e para que uma solução seja alcançada é preciso boa vontade de todos para conversar e ouvir a opinião dos profissionais envolvidos.

Alguns especialistas chegam a classificar a mediação como um passo anterior à arbitragem, sendo muito utilizado em questões de família e societárias. "Há uma lei em discussão e a mediação está começando a conquistar seu espaço. A área ambiental, por exemplo, está descobrindo essa ferramenta, pois são questões que precisam de agilidade para as duas partes", afirma Adolfo Braga Neto, presidente do Instituto de Mediação e Arbitragem (Imab). Recentemente, a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) aderiu ao sistema de mediação com a inauguração de sua Câmara de Mediação e Conciliação (Camfiesp).

Já a conciliação tem mecanismos muito parecidos com a mediação, mas ocorre quando o processo já está instalado. Uma das formas de conciliação, em operação no país, pode ser vista em projetos que têm como objetivo levar a Justiça às populações mais pobres. As iniciativas nesse sentido quase sempre estão relacionadas ao poder público, que cria em centros comunitários, como os Centros de Integração da Cidadania (CIC), em São Paulo, um corpo de profissionais composto de juízes, defensoria pública, policiais civis, além de especialistas e voluntários que atuam no sentido de conciliar pessoas envolvidas nas mais diversas disputas. De uma briga de vizinhos ao pagamento de pensão, por exemplo.

Um panorama desse universo foi mapeado pela socióloga Jacqueline Sinhoretto, que atuou como consultora do estudo "Acesso à Justiça por sistemas alternativos de administração de conflitos", encomendado pelo Ministério da Justiça. Ela mapeou mais de sessenta programas alternativos em todo o país. A pesquisadora estudou ainda o tema em seus trabalhos de mestrado e doutorado e indaga:"Uma discussão que existe é se as alternativas são formas reais de acesso ou mecanismos ainda maior de exclusão por isolar as pessoas da Justiça comum". Uma questão ainda sem resposta, segundo a socióloga.

Existe a hipótese de que a falta de acesso à Justiça pode contribuir para o aumento da violência. Ao não ser atendida, a população se revolta e decide fazer justiça com as próprias mãos. Ao longo de suas pesquisas, Sinhoretto também estudou casos de linchamento que ocorreram justamente pela falta de punição na periferia de São Paulo. "Só temos de fugir de uma análise simplista, confiando que, ao dar acesso aos sistemas legais, a violência vai acabar. Esse é apenas um dos lados da violência", reflete a socióloga.

É importante lembrar que, mesmo instalando sistemas de conciliação para a população de baixa renda, há casos que não podem ser mediados por sistemas alternativos. " Não dá para chegar a um acordo entre o marido e a mulher que apanha. São crimes que precisam ir para a Justiça comum", informa Sinhoretto. Outro impasse é que muitas vezes a conciliação não ocorre mesmo que as partes cheguem a um acordo na frente do mediador. Um caso clássico é a briga por pensão alimentícia, quando o marido que não tem emprego formal assume que vai pagar uma quantia, mas no mês seguinte não arca com a dívida, e toda a conciliação anterior deixa de existir.

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Sistemas alternativos são bons, mas sozinhos não conseguem aliviar a carga do Judiciário

Alguns dos problemas enfrentados pelos projetos de conciliação, tanto os públicos como os mantidos por organizações não-governamentais (ONG), são a falta de recursos e a instabilidade. Os CICs, em São Paulo, não são mais dedicados totalmente ao atendimento judicial, algumas de suas unidades atualmente estão mais voltadas para ações como emissão de documentos, informa Sinhoretto. No Rio de Janeiro, o projeto O Balcão de Direitos, mantido pela ONG Viva Rio, foi descontinuado no ano passado.

O Balcão prestava orientação jurídica e busca de soluções pacíficas para conflitos por meio de ações de mediação em diversas favelas cariocas. Até o ano de 2004, período em que esteve mais ativo, o Balcão registrou 77 mil atendimentos. A falta de recursos e a reorientação do foco da entidade para outras áreas, como o controle de armas, levaram ao fim dessas atividades. "O projeto cumpriu seu papel", avalia Rodolfo Noronha, um dos coordenadores do Balcão de Direitos. "Foram anos muito ativos e diversas iniciativas nos mesmos moldes foram efetivadas, inclusive dentro da própria esfera judicial", lembra Noronha, citando projetos como o Justiça Comunitária, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal. A experiência de Brasília conta com agentes comunitários que vão até a população levar informações jurídicas e criar ambientes de mediação.

É bom lembrar que a conciliação é uma prática que sempre existiu no Judiciário. O juiz tenta, sempre que possível, estabelecer um acordo entre as partes. Mas o que tem sido observado ultimamente dentro dos tribunais é um maior esforço em promover acordos, criando ações itinerantes e atendimentos focados na conciliação. No Tribunal de Justiça de São Paulo, o Setor de Conciliação, coordenado pela juíza Maria Lúcia Pizzoti, tem como meta conseguir reduzir o tempo de um recurso, que pode chegar a cinco anos, para trinta dias. O sistema tem funcionado, já que o índice de acordos, em alguns meses, ultrapassa a casa dos 70%.

A conclusão dos especialistas é que os sistemas alternativos são bem-vindos, mas sozinhos, por maior que seja a popularização, nunca serão capazes de aliviar de fato a grande carga que existe no Judiciário. A reforma continua em pauta. Pinheiro, do Ipea, alerta ainda para o fato de que a situação de insegurança do Judiciário brasileiro é uma das grandes barreiras ao desenvolvimento econômico, pois desestimula a aplicação de recursos. Os passos iniciais são:"Melhorar a qualidade das leis, aprimorar a gestão e, principalmente, mudar a cultura dos operadores do direito", conclui o pesquisador.

 
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