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Estudo produz mapa-múndi da economia das plataformas digitais

Artigo que identifica mais de 3 mil empresas em 5 continentes é premiado no Encontro de Economia Industrial e da Inovação

As transformações intensas nos sistemas econômicos e sociais causadas pelas novas tecnologias digitais têm sido abordadas recorrentemente. Conceitos como "economia de plataforma", "sociedade de plataforma", "capitalismo de plataforma" e "capitalismo de vigilância", embora apresentem diferentes nuances, destacam o importante papel desempenhado pelas grandes empresas privadas de tecnologia e chamam atenção para a “revolução” que as plataformas vêm causando.

A maioria dos trabalhos sobre o tema foca em ecossistemas de empresas controladoras, empresas terceiras associadas e usuários dependentes das chamadas GAFAM e BAT. O primeiro acrônimo se refere aos gigantes de tecnologia dos EUA – Google (Alphabet), Amazon, Facebook (Meta), Apple e Microsoft – enquanto o último, à contraparte chinesa – Baidu, Alibaba e Tencent.

Os estudos que vem sendo elaborados por Victo Silva, da Universidade Estadual de Campinas (DPCT/UNICAMP), Tulio Chiarini, do CTS/Ipea, e Leonardo da Costa Ribeiro, do Cedeplar/UFMG, trazem contribuições importantes e novas evidências em relação à geografia econômica das plataformas digitais, buscando superar a limitação dos estudos que restringem a investigação às big techs GAFAM e BAT.

No artigo intitulado “Viagens de descobrimento: mapeando a geografia da economia de plataformas” – contemplado em segundo lugar no Prêmio de Artigo em Economia Industrial e Inovação do VI Encontro Nacional de Economia Industrial e Inovação (ENEI)[1] – por meio de técnicas de linguagem de processamento natural, os autores identificaram na base Orbis 3.147 empresas em todo o mundo relacionadas às plataformas digitais. Assim, conseguiram elaborar este mapa mundial localizando em nível de países e cidades essas empresas.

Mapa das plataformas

Concentração em regiões, países e cidades

As evidências mostram uma concentração geográfica de empresas de plataforma nos EUA (27%) e na China (32%), o que corrobora a liderança desses países na corrida global da economia digital. O mapa também permite identificar uma distribuição desigual dentro desses dois países.

As empresas de plataforma da China se concentram no leste do país, onde apenas seis cidades (Hangzhou, Xangai, Shenzhen, Guangzhou, Shen Zhen e Zhuhai) concentram 38% das empresas de plataforma chinesas. Shenzhen é, em todo o globo, a cidade com mais empresas de plataforma, seguida por Pequim. Xangai apresenta-se na quinta posição mundial.

As empresas de plataforma estadunidenses estão localizadas nas costas leste e oeste, e sua densidade é muito menor na parte central do país. A aglomeração está principalmente na Califórnia, onde algumas cidades concentram 17% das empresas de plataforma (como San Francisco, Los Angeles, Irvine, Sunnyvale, Santa Clara, San Diego e Palo Alto) e no polígono Boston-Nova York-Baltimore cuja concentração chega a 12%. Nova York é a cidade dos EUA com mais empresas de plataforma e ocupa o quarto lugar no ranking global.

Embora a China e os EUA sejam os dois países com mais empresas de plataformas no mundo, o mapa também revela outros países com alta concentração: Grã-Bretanha (que possui uma distribuição geográfica relativamente mais igualitária de plataformas se comparado a outros países), Japão (sobretudo na região metropolitana de Tóquio), Coreia do Sul (região metropolitana de Seul), Austrália (principalmente em Sydney e Melbourne) e Canadá (especialmente nas áreas de Vancouver e Toronto). Em menor grau, também é possível observar a presença desse tipo empresa em outros países europeus, como Suécia, França, Holanda, Itália e Dinamarca.

O mapa também revela vazios geográficos na economia digital, principalmente no sul global. Não obstante, há nessas áreas centros relativamente dinâmicos, como Bangkok (Tailândia), São Paulo (Brasil), Teerã (Irã) e Nairóbi (Quênia), onde observa-se a presença (tímida) de empresas de plataforma. Na Índia, Mumbai e Bangalore se destacam. Mais investigações são necessárias, a partir de outras bases de dados, para construir um panorama mais completo do sul global que pode estar sub-representado.

Observando o mapa é ainda possível notar que países comumente conhecidos como “paraísos fiscais” concentram 10,2% das empresas de plataforma do mundo. As Ilhas Cayman, por exemplo, ocupam a terceira posição mundial, atrás apenas da China e dos EUA. Georgetown (capital das Ilhas Cayman) é a terceira cidade do mundo com o maior número dessas empresas.

Questões para o prosseguimento da pesquisa

Ao elaborar esse panorama, os autores dão o primeiro passo na tentativa de compreender a geografia da economia digital e da economia de plataformas. Um dos pontos importantes para investigações futuras são os determinantes locacionais das empresas de plataforma digital: que elementos explicam a existência de mais plataformas em uma cidade específica? Seriam efeitos de aglomeração comuns à economia industrial? Seriam externalidades econômicas e tecnológicas da região? Efeitos de arbitragem tributária?

Os autores também pretendem explorar as consequências dessa geografia desigual sobre as perspectivas de desenvolvimento do sul global. Quais os impactos para o sul global da concentração de plataformas digitais em cidades do hemisfério norte? É possível divisar uma nova forma de relação entre essas empresas de plataforma que transforme cadeias globais de valor? Quais os impactos sobre o desenvolvimento tecnológico nacional?

Questões de grande relevância para a compreensão dos rumos do desenvolvimento econômico e tecnológico, e também para a formulação de estratégias e políticas por parte de empresas e governos.

 

[1] O Encontro Nacional de Economia Industrial e Inovação (ENEI) é promovido pela Associação Brasileira de Economia Industrial e Inovação (ABEIN).