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Ferramenta de Inteligência Artificial aprimora vacina de mRNA contra a Covid-19

Novo método desenvolvido pela multinacional chinesa de tecnologia Baidu produziu imunizante mais estável e capaz de estimular maior resposta imunológica em animais

Rodrigo Andrade

Pesquisadores da divisão na Califórnia da multinacional chinesa de tecnologia Baidu desenvolveram uma ferramenta de Inteligência Artificial (IA) capaz de dar mais estabilidade às vacinas de RNA mensageiro (mRNA) contra a Covid-19, melhorando sua eficácia.

O novo software usa técnicas da linguística computacional para projetar sequências de mRNA com formas e estruturas mais intrincadas, fazendo com que o material genético dure mais — quanto mais estável o mRNA entregue às células de uma pessoa, mais antígenos serão produzidos pelo seu sistema imunológico.

As vacinas de mRNA carregam uma parte do código genético do agente infeccioso com instruções para que as células do corpo humano produzam proteínas específicas. Uma vez que essas proteínas são produzidas dentro das células, elas são expostas ao sistema imunológico, que reconhece essas estruturas como estranhas e ativa os anticorpos para agirem contra elas, eliminando-as. Algumas, no entanto, permanecem no corpo guardando a informação: as células de memória. Assim, quando a pessoa é realmente infectada pelo patógeno, elas rapidamente se lembram das instruções e montam o sistema de defesa para combatê-lo.

No caso das vacinas de mRNA contra a Covid-19, essa estratégia fazia com que as células produzissem a proteína spike (S), usada pelo novo coronavírus (Sars-CoV-2) para invadi-las, desencadeando uma resposta imunológica do organismo e a produção de anticorpos. O problema é que, ao contrário do DNA, o mRNA é incrivelmente frágil e se desintegra rapidamente em temperatura ambiente. Não por acaso, durante a pandemia, as vacinas de mRNA contra o Sars-CoV-2 tinham de ser transportadas e mantidas a temperaturas abaixo de -20 °C, de modo a preservar sua estabilidade. Isso limitou sua distribuição em regiões com poucos recursos e sem instalações adequadas para armazená-las.

A instabilidade e a tendência de degradação do mRNA também podem afetar a eficácia das vacinas — é preciso uma quantidade suficiente de mRNA estável para entrar nas células e desencadear a produção de proteínas que ativará a resposta imune do organismo. Os pesquisadores conseguiram mitigar esse problema e conferir maior estabilidade às formulações de imunizantes com mRNA ao descobrirem que era possível retardar sua degradação revestindo a molécula com uma capa de lipídios, um tipo de gordura.

Mas ainda havia espaço para avançar. Aumentar a estabilidade do mRNA entregue às células de uma pessoa significaria ampliar a capacidade de produção de anticorpos pelo seu organismo — e quanto maior o número de anticorpos protetores, teoricamente, mais bem preparado o organismo de uma pessoa estará para combater doenças infecciosas.

Da mesma forma que é possível usar frases diferentes para dizer a mesma coisa, muitas sequências distintas de mRNA podem orientar as células a produzir a mesma proteína de interesse. Algumas dessas sequências, no entanto, têm formas e estruturas que as tornam mais estáveis do que outras, mas analisar todas as inúmeras opções e identificar a mais estável seria um desafio computacional praticamente intransponível.

Os cientistas da Baidu desenvolveram uma ferramenta de IA chamada “LinearDesign”, capaz de projetar uma sequência ultra-estável de mRNA para a produção da proteína S do novo coronavírus em apenas 11 minutos em um computador comum. O algoritmo também conseguiu estabilizar o mRNA em experimentos em tubo de ensaio em temperatura corporal. Quando comparada às vacinas de mRNA existentes — em testes com camundongos —, a sequência de mRNA com estabilidade otimizada fez com que as células expressassem três vezes mais proteínas S, gerando até 128 vezes mais anticorpos, segundo estudo publicado na revista científica Nature.

“A nova metodologia é ‘notável’”, disse Dave Mauger, biólogo computacional e ex-funcionário da empresa Moderna, que não participou do desenvolvimento da nova ferramenta de IA. “A eficiência computacional é realmente impressionante e mais sofisticada do que qualquer coisa que já existiu.”

Os pesquisadores, até agora, testaram as vacinas aprimoradas pelo LinearDesign apenas contra a Covid-19 e herpes-zóster em camundongos, mas a técnica deverá ser útil no desenvolvimento de vacinas de mRNA contra qualquer doença, segundo Liang Huang, ex-cientista do Baidu que liderou a criação da ferramenta.