Economia Mundial

Carta de Conjuntura Nº 30

Por Paulo Mansur Levy

A economia mundial apresentou elevada instabilidade nos primeiros meses de 2016. O aumento das incertezas em relação ao crescimento chinês; a forte queda dos preços do petróleo entre o início do ano e meados de fevereiro; dados contraditórios em relação ao desempenho da economia norte-americana e uma percepção de perda de fôlego na recuperação da Europa foram alguns dos fatores que contribuíram para o aumento da volatilidade nos mercados financeiros. As bolsas de valores ao redor do mundo sofreram fortes quedas, o preço do ouro subiu e os preços de commodities passaram por nova rodada de correções para baixo.

Como pano de fundo para essa situação, duas visões em relação ao atual momento e ao futuro da economia mundial têm se destacado e influenciado o comportamento dos mercados. A primeira, conhecida como “estagnação secular”, argumenta que a crise de 2007/08 teria produzido uma queda “permanente” nas taxas de crescimento de longo prazo da economia mundial. Há duas hipóteses para essa redução da taxa de crescimento de longo prazo: (i) uma forte desaceleração da taxa de crescimento da produtividade – visão que privilegia problemas pelo lado da evolução da oferta, associada a um ritmo mais lento de progresso técnico e a mudanças demográficas; e, (ii) uma insuficiência crônica de demanda, associada ao aumento permanente da propensão a poupar, após o forte aumento do endividamento de empresas e famílias nos anos anteriores à crise. Esse “excesso” de poupança, para um dado nível de investimento, tornaria negativa a taxa real de juros de equilíbrio, colocando as economias numa espécie de “armadilha da liquidez” diante das pressões deflacionárias com as quais se deparam atualmente.

A segunda visão, relacionada ao ponto anterior, refere-se à forte redução do espaço para que a política econômica nos países desenvolvidos possa ser mobilizada para se contrapor a eventuais choques negativos que interrompessem o processo de recuperação econômica. Com os níveis de dívida pública ainda bastante elevados após as políticas anticíclicas adotadas em resposta à crise de 2007/08, a política fiscal, segundo esta visão, enfrentaria limites estreitos no sentido de gerar déficits maiores que os atuais para estimular a atividade econômica. Do lado da política monetária, taxas de juros próximas de zero – na verdade, já negativas na Europa e no Japão para reservas excedentes dos bancos mantidas nos respectivos bancos centrais – e uma forte ampliação dos balanços através de medidas de expansão monetária também limitariam a capacidade de reação a eventuais choques. Há ainda quem veja na atual instabilidade apenas um movimento de correção dos excessos produzidos pelas próprias políticas monetárias super-expansionistas de anos anteriores, as quais teriam inflado artificialmente os preços de ativos. Nesse caso, as quedas das bolsas ao redor do mundo apenas refletiriam o processo de normalização da política monetária nos EUA, iniciado com a primeira elevação da taxa de juros em dezembro do ano passado.

Independentemente dessas visões pessimistas de longo prazo, após o início de ano turbulento, a partir de meados de fevereiro houve uma ligeira melhora do panorama internacional – até mesmo como consequência das notícias negativas que haviam inicialmente deprimido os mercados. Assim, por exemplo, os dados mais fracos da atividade econômica nos Estados Unidos levaram a uma revisão da perspectiva de elevação dos juros naquele país: hoje, predomina a aposta de que a taxa de juros Federal Funds ficará estável nos próximos meses, ante uma sinalização de que poderia subir até um ponto percentual ao longo de 2016. Isso, por seu turno, parece ter aberto espaço para que o dólar se desvalorizasse e para algum retorno dos fluxos de capital para países emergentes, revertendo parcialmente a aversão ao risco que havia dominado os mercados na segunda metade de 2015 e primeiras semanas de 2016. No mesmo sentido, a recente decisão do Banco Central Europeu, no início de março, de cortar ainda mais suas taxas de juros (algumas, como comentado, já em terreno negativo); expandir o volume, o prazo e os ativos elegíveis de seu programa de aquisições de ativos; e de retomar o programa de refinanciamento de empréstimos bancários (LTROs) também tem contribuído para aumentar a confiança dos investidores e reduzir a aversão ao risco.

Esse comportamento um pouco mais positivo dos mercados financeiros parece também ter alcançado os mercados de commodities, cujos preços apresentaram alguma reação nas últimas semanas, embora existam dúvidas quanto à sustentabilidade desse movimento. Além da ligeira desvalorização do dólar no mercado internacional, parte da alta pode ser atribuída à expectativa de uma intensificação dos esforços da política econômica na China no sentido de evitar uma queda mais acentuada do crescimento, conforme propostas e metas apresentadas no Congresso do Povo, realizado em março.

Em resumo, apesar de uma ligeira melhora nas últimas semanas relativamente ao início de ano tenebroso nos mercados financeiros internacionais, ainda há considerável incerteza quanto ao comportamento da economia mundial tanto no curto quanto no longo prazo. Essa perspectiva é ainda mais crítica para os países emergentes, cujo desempenho tende a ser mais diretamente afetado pelos preços de commodities e pelos fluxos de capital.

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